Confira Manifesto dos petroleiros da P-48

Petroleiros da P-48 aprovaram no sábado, em assembleia a bordo, um manifesto que denuncia as condições de trabalho na unidade. Confira a íntegra do documento enviado ao Sindipetro-NF:


Gente que massacra a gente

Nós, trabalhadores da plataforma P-48, viemos através deste documento denunciar a forma como estamos sendo tratados pela companhia nos últimos tempos.
Há uma tentativa de cerceamento de direitos inalienáveis dos trabalhadores: do direito a comunicação, da isonomia, do direito a segurança, do direito a saúde, etc., do que nós trabalhadores não podemos e não iremos compactuar.
Vejamos as mudanças “inspiradoras” a que os operários estão sendo submetidos:

– Ataque a nossa vida

Os gerentes da empresa cortaram uma serie de exames periódicos que anteriormente fazíamos, desconsiderando a necessidade dos exames, visando apenas à redução de custos. Apenas para que se tenha uma idéia, um funcionário de nossa plataforma, por conta de um exame periódico, percebeu que estava com um grave problema do coração e foi submetido a uma cirurgia de emergência, o que lhe poupou a vida. Fosse hoje com a nova prática que os gerentes da Petrobrás impuseram, nosso companheiro estaria morto. Há uma serie de exemplos similares a este que poderíamos aqui citar.

É um atentado contra a vida dos trabalhadores economizar em exames que poderiam impedir que doenças atingissem um grau avançado de evolução, e/ou mesmo salvá-los. 
Esta diminuição de exames periódicos, mesmo economicamente é uma conta burra, pois o afastamento de profissionais por problemas de saúde implica na convocação de outros profissionais que estão de folga para fazer hora extra, ou seja, é o barato que sai caro.

Afora este absurdo, também enfrentamos um problema grave com nosso PPRA, que não contempla os riscos reais a que os trabalhadores estão submetidos. Nós lidamos com produtos químicos, riscos biológicos (sistema de sewage), choque elétrico, vibração, temperatura, riscos ergonômicos, etc., e todos estes riscos são desconsiderados no PPRA.

Apenas para que se tenha noção de quão risível é a avaliação de riscos de nossas atividades, de acordo com a medição feita a bordo, o profissional que esteve exposto ao mais alto nível de ruído foi o coordenador de produção (que trabalha num escritório). Também não há nesta avaliação uma consideração a respeito do rodízio dos profissionais (que trabalham na sala de controle e depois na área).

Outro problema de saúde grave que enfrentamos é o atendimento médico que recebemos na plataforma. Há diversos casos de profissionais que passam por situações delicadas de saúde e não são desembarcados (para citarmos exemplos recentes, houve diversos casos de trabalhadores com conjuntivite que não foram desembarcados, afora outros inúmeras barbaridades similares). Parece que há todo o interesse do setor médico em não desembarcar ninguém.

Ademais, o atendimento médico como um todo (precariedade que é correlacionada a subnotificação) é terrível para um profissional que venha a ter um problema de saúde a bordo. Recentemente na P-48, um profissional teve um problema de saúde e, depois de vários dias passando mal, não foi desembarcado (de fato, pra ser desembarcado hoje, só se já estivermos com um pé na cova) e, depois desta negligência por parte do setor médico da empresa, ele veio a ser encontrado desacordado em seu camarote. Como ele estava na cama superior do beliche, não se sabia de qual altura ele havia caído, o proletário foi encontrado desorientado e não se lembrava do que acontecera.

Ele foi desembarcado e, ao chegar ao hospital em Macaé, a informação de sua queda foi omitida por parte da Petrobrás para o hospital; desta maneira, ele só foi tratado da doença que apresentava anteriormente. Por conta disto, veio a receber alta, porém, por uma incrível sorte, sua esposa é médica, e ela, ciente da possibilidade de sua queda ter sido grave, solicitou que ele não recebesse alta, mas sim que fosse transferido via ambulância para um hospital no Rio de Janeiro. Lá chegando, por conta de exame que sua esposa solicitou, foi detectado que o mesmo estava com traumatismo craniano e ele foi internado imediatamente na UTI.

A depender do cuidado que a Petrobrás despendeu com nosso companheiro, fatalmente ele haveria falecido por pura negligência do setor médico da empresa, pois ele já havia recebido alta e depois disto, veio a ser internado na UTI, de tão grave que foi seu caso. 

Também destacamos que os enfermos que estão a bordo não podem sequer dialogar com os médicos (verdadeiros deuses) que estão em terra. O doente passa sua situação para o técnico de enfermagem, para que este então fale com o médico. Ou seja, o enfermo não pode sequer dialogar com o médico que o esta atendendo!

Existe também uma absurda orientação de que até para o enfermo ficar na enfermaria, ele necessita de anuência do médico, ou seja, o técnico de enfermagem não tem liberdade profissional nenhuma para exercer sua função.

É o médico (vidente e telepata) que precisa decidir se o enfermo esta suficientemente bem, ou não, para desembarcar ou até mesmo ficar na enfermaria.

– Ausência de isonomia.

É um ultraje a manobra jurídica que a Petrobrás vem utilizando para obstar o direito líquido e certo dos trabalhadores de ganharem o Repouso Semanal Remunerado (RSR). Como é possível que um trabalhador, que é submetido a um determinado turno de trabalho, ter um ganho por conta deste regime, e outro profissional que trabalha ao lado dele, possui o mesmo regime, faz a mesma coisa, não ganhar?

É um desrespeito, uma discriminação, e um atentado contra o próprio código de ética da empresa. Esta decisão horrível esta gerando enorme desmotivação com a força de trabalho de toda a bacia de Campos.

– Restrição do direito a comunicação

Os trabalhadores estão sendo submetidos a uma restrição absurda na utilização da internet. É um direito nosso termos acesso a internet, termos acesso a comunicação, ao contato com nossos familiares, de fazermos faculdade à distância, de fazermos cursos de idiomas estrangeiros à distância, etc.

Diferentemente dos gerentes que tomaram esta decisão e trabalham em terra (e que parecem nutrir ódio e desprezo pelos trabalhadores embarcados), nós não temos condições de termos acesso a telefone, internet, celular, ao nosso dispor. Nas plataformas nós dependemos que a companhia disponibilize estrutura para nós utilizarmos.

Para que se tenha uma ideia, na plataforma de P-48, com capacidade para 194 pessoas, há tão somente 4 computadores na internet recreativa – sendo esta, de péssima velocidade e com horário restringido. É evidente que esta conta não bate, chega a ser um escárnio com nós que trabalhamos embarcados e cumprimos nosso papel durante nosso turno de trabalho.  

Como se não bastasse, os gerentes da empresa não só cercearam o tempo de utilização, como, INTENCIONALMENTE, reduziram a velocidade da banda da internet. Conjuntamente a inserção do temporizador houve uma redução drástica da velocidade/qualidade da conexão. Hoje, para acessarmos o site mais simples que seja, mesmo o de e-mail por exemplo, demoramos uma eternidade, a velocidade se assemelha a de uma conexão discada. Foi mais uma forma “brilhante” que os gerentes da empresa conseguiram para prejudicar o direito a comunicação do trabalhador. Diversas mudanças negativas como esta começaram depois que a gerência do ativo de Barracuda/Caratinga foi assumida pelo gerente Cláudio Oliveira da Costa.

A Petrobrás bem poderia praticar como outras empresas petrolíferas do mundo, que permitem acesso via wi-fi à internet. Desta maneira, os trabalhadores possuem meios de acessarem a internet fora dos terminais da companhia. Porém, infelizmente, para dar qualquer sorte de benefício aos proletários, surge toda a sorte de desculpas e sofismas para encobrir a realidade: a de que querem apenas se apropriar da nossa força de trabalho e que, ademais a gente que esta a bordo que se exploda.

Outra restrição que possuímos é a utilização de telefone: somente podemos telefonar dentro de cabines, com tempo curto e em local desconfortável. A empresa economizar dinheiro cerceando os telefonemas de trabalhadores para seus familiares que estão a centenas de quilômetros de seus familiares é um escândalo. 

– Ataque a nossa segurança familiar

A Petrobrás começou a desembarcar profissionais para trabalhar em terra – desconsiderando até mesmo a opinião das próprias plataformas, se queriam realmente que estes profissionais desembarcassem, ou não. Mas o pior é que estes profissionais que desembarcaram foram OBRIGADOS a irem participar do planejamento em terra, mesmo sendo de um regime de trabalho diferente. E na maior cara de pau os gerentes ainda afirmaram que estes desembarques estão sendo voluntários, uma mentira deslavada!

Os gerentes da companhia, mesmo cientes de que a maioria dos funcionários mora longe de Macaé, os colocou lá por 6 meses, em uma condição absolutamente inadequada, longe de casa, sem direito a diária (só hotel), e em escala de 5 X 2, enfim, um desastre e, como se não bastasse, diz que esta começando com três profissionais de manutenção (um de cada área), mas que haverá um rodízio, ou seja, ainda deixa todos os outros que ainda não estão submetidos a esta condição terrível e permaneceram a bordo numa condição de tensão e nervosismo enormes, pois a maioria não tem condição de mudar a família de lugar, vários moram longe (inclusive em outros estados), suas esposas trabalham, seus filhos estão matriculados em escolas, possuem outras atividades em terra, etc.

Com que condições psicológicas um trabalhador pode executar o seu labor sem nem saber onde ele vai poder morar, se vai poder morar perto ou longe de sua família?
É um absurdo e um atentado contra os proletários.

– Ataque a nossa segurança

Pelo que nos consta, o tal do Procop pretende reduzir a quantidade de profissionais à bordo pela metade. Antes de seguirmos com nosso desabafo, abrimos um parêntese sobre este absurdo: a Petrobrás possui cerca de uma centena de plataformas, e, portanto, entre gerentes, coordenadores e supervisores, são milhares de cargos de chefia. E todas estas pessoas que possuem cargo de chefia, ao lidarem com as mais diversas plataformas, mantiveram um POB mais ou menos coerente com o tamanho da unidade, às vezes menor, às vezes maior, a depender da complexidade da unidade. Aí vem a “ideia brilhante” de terra, alguns sobrenaturais dizem que será possível operar com cerca da metade do POB que vinha sendo aplicado até hoje. Ou seja, não há pior crítica, não há pior declaração de incompetência para os supervisores, coordenadores e gerentes que estão ocupando ou já ocuparam cargos de confiança nas plataformas do que esta decisão oriunda de um gerente (que sequer conhece a unidade): os milhares de supervisores/coordenadores/gerentes não perceberam, mas podem operar com metade do POB atual! Uma dúvida: será que algum destes milhares já não teria tomado esta decisão se ela fosse possível?

Quando extrapolamos a decisão, aí vemos a realidade. Para que seja possível esta redução, estão reduzindo drasticamente os planos de manutenção (preocupados somente com sua quantidade, e não com sua qualidade – o que acarretará futuramente problemas operacionais e de segurança irreparáveis, ainda mais com a dificuldade que a Petrobrás possui de comprar sobressalentes); pretendem embarcar uma serie de profissionais “sob demanda” (expressão mágica que há de resolver todos os problemas da plataforma), e até mesmo, pasmem, desembarcar a sala de controle.

Sobre este fato, precisamos falar mais detidamente.

Já existem algumas plataformas, de baixa complexidade, que possuem salas de controle em terra. Porém, em plataformas que possuem um nível de complexidade/automação muito mais elevado, correremos um risco completamente desnecessário com esta decisão, que pode mesmo vir a ter um fim trágico – é claro que, quem tomou esta decisão de desembarcar a sala de controle não estará submetido a estes riscos. Somos nós os bois de piranha que arriscaremos nossos pescoços para que um çábio qualquer fique “bem na fita” para seu superior.

Acreditamos que se um único acidente puder vir a acontecer por conta do desembarque do pessoal da sala de controle, esta idéia já deve ser abortada. Só para constar, nós da manutenção estivemos sem a quantidade devida de rádios aqui na P-48 por anos (uma das pendências “sumidas” da CIPA), agora, depois de muito tempo reclamando, finalmente conseguimos este item essencial a nossa segurança. Agora a Petrobrás inventa de se comunicar somente por rádio com quem esta a centenas de quilômetros em terra? Por um aparelho que ela mesma não consegue garantir continuamente à bordo? Isto é um absurdo, é incoerente com a própria estrutura que a empresa consegue fornecer.
Este atentado contra os trabalhadores e contra a sua segurança deve ser totalmente obstado por nós.

– Trabalhador não tem qualidade de vida a bordo.

    Nós estamos vivenciando um descaso absoluto com a qualidade de vida de nós que trabalhamos embarcados. Não bastasse a restrição da internet e telefone, as quadras estão deterioradas – na P-48 ela esta interditada há anos. Agora, para fazerem a instalação de telas desta quadra, a gerência exige da força de trabalho que, se ela quiser a quadra, que os próprios profissionais façam o serviço de caldeiraria, no horário de folga – e de graça!

As televisões mais parecem caixas de ratos de tão pequenas (não é possível sequer assistir a um jogo de futebol no camarote, pois não é possível enxergar a bola; os filmes legendados, a legenda corta nas pontas, não sendo possível lê-las). Então, em vários camarotes, os trabalhadores cotizaram e gastaram de seus próprios recursos para comprar um bem – e deixá-lo numa plataforma da empresa! É tragicômico que necessitemos comprar para a Petrobrás bens desse tipo, mais parece que estamos numa plataforma que produz farinha, e não petróleo. 

Outra coisa, não há respeito ao sono dos trabalhadores, serviços barulhentos são realizados durante o horário de descanso do pessoal de turno.

Por fim, as novas plataformas serão ainda piores, a gerência esta desconsiderando completamente a forma como os trabalhadores permanecerão no seu período de folga, não haverá nada para eles, estarão num verdadeiro presídio.   
 
– Treinamento inadequado.

Os treinamentos realizados a bordo são de mentirinha, apenas para tirar foto. O bote de resgate não navega mesmo quando o mar esta em calmaria.
Não ocorrem testes do sistema de dilúvio.

Afora isto, os gerentes constrangem os trabalhadores a participarem de fainas para os quais os mesmos não possuem nenhuma aptidão. 

– O lucro é menor que o esperado e o trabalhador vai pra forca

O sistema Petrobrás teve lucro de mais de 20 bilhões de reais ano passado, fato digno de comemoração. E este lucro é ainda mais impressionante quando se verifica que o prejuízo dado pelo Abast foi de 40 bilhões de reais. Foi este o valor do subsídio do Abast (setor da companhia que deveria ter dado lucro, é bom lembrar). Destarte, somente se o Abast não tivesse dado o subsídio (ou seja, desconsiderando o lucro que ele deveria ter), o lucro do sistema Petrobrás deveria ter sido de mais de 60 bilhões de reais. É isto que seus trabalhadores geraram e geram.

Alguns gerentes resolveram desconsiderar estes dados, apropriaram-se de uma tal de uma crise na companhia que o mercado financeiro inventou e que parece que a atual diretoria da empresa prontamente assimilou, e por conta disto, chegaram ao tal Procop, e agora querem passar a conta pra quem não tem culpa nenhuma na história. Nossa parte nós fizemos, não há porque tentarem tirar nosso sangue!

Vemos uma onerosa campanha de marketing dizendo que “gente é o que inspira a gente”. De nossa parte, o que podemos sentir na pele é que “gente é o que massacra a gente”.

Pudemos observar uma serie de protestos em nosso país visando maior justiça social. Viemos deixar claro para a companhia que os trabalhadores não se furtarão em lutar contra todos estes atentados a que temos sido submetidos.

Parece mesmo que hoje, a diferença entre nós e os presidiários é que os presidiários têm acesso a telefone, a visita íntima, e – claro, – não trabalham. Não nos furtaremos em obstar estes ataques e, diferentemente do que ocorrem em alguns lugares, em nossas formas de mobilização nós não necessitamos depredar nada para que atinjamos nossos objetivos. Basta a greve.

Portanto, nós trabalhadores de P-48 requeremos que:

1)    Os exames periódicos retornem a como eram anteriormente, visando de fato à saúde do trabalhador, e não a economia de divisas.
2)    A saúde do trabalhador não seja tratada com o descaso que vem ocorrendo ultimamente – especificamente, somos CONTRA A POLÍTICA CLARA de subnotificação da empresa.
3)    O PPRA reconheça os riscos reais a que os trabalhadores sejam submetidos.
4)    A RSR seja paga a todos os trabalhadores, conforme decisão já proferida em última instância.
5)    Tenhamos uma internet de qualidade e irrestrita.
6)    Sejam disponibilizados meios para termos atividades de lazer durante nosso período de folga.
7)    Os gerentes da companhia respeitem nosso regime de trabalho off-shore. Caso sejamos convocados para trabalhar em terra, que se cumpram os 14 dias de trabalho e depois folguemos.
8)    Não sejamos expostos a riscos desnecessários com este tal Procop – como o desembarque de profissionais essenciais ao funcionamento da unidade.
9)    Que não sejamos expostos a um suplício porque o lucro da empresa foi menor do que os que os deuses do mercado financeiro queriam. 

Petroleiros de P-48 – 06/07/13