Vitor Menezes / Da Imprensa do NF – Quando, em fevereiro deste ano e em meio a uma greve petroleira contra a privatização da Petrobrás, o Sindipetro-NF desenvolveu as ações comunitárias de venda de gás e de gasolina com preços subsidiados não era possível imaginar que a solidariedade se tornaria ainda mais urgente com a chegada de uma pandemia e o agravamento da miséria: depois de março, as ações se voltaram para o combate à fome.
Durante o ano, a entidade distribuiu cestas básicas de alimentos em comunidades em situação de vulnerabilidade social de Campos dos Goytacazes, Macaé e do Rio de Janeiro, em parcerias com associações locais, movimentos sociais e iniciativas solidárias da categoria petroleira.
O Sindipetro-NF, que tem longa atuação nas lutas por políticas públicas permanentes e em defesa de um modelo econômico que priorize a justiça social, também se viu na necessidade de contribuir de modo mais emergencial. “Como nos ensinou o Betinho, quem tem fome tem pressa”, disse à época o coordenador geral do sindicato, Tezeu Bezerra, lembrando o criador da Ação Solidária da Cidadania, o sociólogo Herbert de Souza.
Para a assistente social da entidade, Maria das Graças Alcântara, a ajuda imediata é necessária e não exclui as lutas mais permanentes. “O momento e a situação que chegamos exige uma nova postura. A busca por políticas públicas permanentes e universais requer perseverança e diante dos retrocessos não se dará sem luta e resistência. As ações mais assistenciais têm um caráter emergencial. Isso é empatia, é sentir a necessidade e a dor do outro e não é incompatível. O NF não atua só nessa frente e não é uma ação isolada e desarticulada das lutas mais amplas”, explica.
A profissional lembra ainda que “a pandemia e a crise política e econômica que a acompanha nos mostrou muitas coisas, entre elas que, apesar da separação que o momento exige, continuamos pertencendo a um mesmo segmento. Somos a classe trabalhadora cada vez mais precarizada. Independente do ramo, pertencemos a um mesmo segmento”.
Gás e gasolina
Nas ações do gás e da gasolina, o sindicato buscou conciliar a denúncia política sobre as consequências do processo de privatização da Petrobrás com a necessidade da população, que estava comprando combustível cada vez mais caro. A entidade mostrou que não precisava ser assim, que havia outra maneira da Petrobrás fixar preços tendo como prioridade o seu papel social e estratégico para o país.
Em Campos dos Goytacazes, a entidade disponibilizou para venda, na Praça do bairro do IPS, 250 botijões de gás ao preço de R$ 40,00 cada. Na época, o preço cobrado pelas distribuidoras variava entre R$ 70,00 e R$ 80,00. Em Macaé, a ação foi de doação de um voucher de R$ 20,00 para motorista ou motociclista para abastecer seu veículo, em um posto BR no bairro da Aroeira. A entidade demonstrou que, de acordo com estudo do Dieese, cada pessoa que colocasse R$ 50,00 de combustível deveria pagar apenas R$30,00 se a Petrobrás mudasse sua política de preços. No município, o preço médio de gasolina na época estava em R$ 5,19 o litro.
Matéria no site do Sindipetro-NF mostrou que a adoção de uma política de vinculação dos preços dos combustíveis ao mercado internacional e a subutilização das refinarias estava penalizando a população brasileira.
“Os preços desses produtos variam de acordo com o mercado internacional e o câmbio do dólar. Para piorar ainda mais, a gestão atual da Petrobrás está subutilizando as refinarias. No ano passado operaram com 67% da sua capacidade. O movimento sindical critica essa postura que não leva em conta a situação econômica de grande parte da população brasileira, obrigada a pagar por altos preços do botijão de gás e dos combustíveis”, denunciou o sindicato.
Um dos diretores sindicais que atuaram na ação do gás, Sérgio Borges explicou durante uma fala aos moradores o modo como o preço do produto, o desemprego, a queda dos royalties do petróleo, têm relação com opções equivocadas para a economia do País e para o setor petróleo. “Ele lembrou que a Petrobrás está reduzindo os seus investimentos, vendendo ativos, diminuindo a produção nas refinarias, e que isso gera impactos no dia a dia das pessoas, chamando a comunidade a estar atenta a estes temas”, registrou a entidade.
Alimentos
Neste ano de pandemia, o sindicato fez doações de 1.850 cestas básicas de 17 kg de alimentos em comunidades em situação de vulnerabilidade social. Foram aproximadamente 31,4 toneladas transportadas em carros da entidade ou particulares, e entregues por dezenas de braços e mãos solidárias em Campos, Macaé e Rio.
As famílias que recebiam as doações eram identificadas por associações locais, lideranças, movimentos sociais ou religiosos como sendo aquelas que passavam por dificuldades sérias em razão da crise econômica e sanitária.
Kit higiene
Outra frente de ação solidária do Sindipetro-NF foi a parceria firmada com o Instituto Federal Fluminense (IFF) para produção de sabonete líquido também para população em vulnerabilidade social. Identificada, já no início da pandemia, como principal forma de evitar a contaminação, o simples ato de lavar as mãos de forma adequada não é acessível a milhares de pessoas na região.
O Instituto produziu 3 mil frascos de 500ml em um laboratório montado ao ar livre, numa quadra do Campus Centro de Campos dos Goytacazes da instituição. O sindicato entrou na parceria fornecendo os insumos e se responsabilizando pela distribuição — incluindo o sabonete em kits com outros produtos de higiene.
Diretores avaliam a experiência
Vários diretores e diretoras do sindicato vivenciaram os momentos de distribuição de alimentos e outras ações solidárias junto às comunidades. Um deles, Guilherme Cordeiro, afirmou que a distribuição de cestas básicas pelo Sindipetro-NF mostrava “a nossa preocupação com o agravamento do quadro social, com a acentuação da pobreza e da desigualdade pela crise gerada pela covid-19”.
Para ele, foi “uma oportunidade de o sindicato se conectar com os mais pobres, que são aqueles que mais sofrem com a atual crise e também com o desemprego e a paralisia da economia”, avaliando que foi “importante atuar solidariamente neste momento em que o governo e a elite ignora a parte mais necessitada do nosso povo”.
Outro diretor que viveu essa experiência comunitária foi Alessandro Trindade, que denuncia que “os líderes do poder Executivo, tanto na esfera Federal como na esfera Estadual, são negligentes no que se diz respeito a vida humana. O governo do Rio segue a linha do Presidente negligente da República Jair Bolsonaro, que além de ignorar a Pandemia que assola o Brasil , ainda coloca a parte mais pobre da sociedade à beira do caos com o fim do auxílio emergencial”.
Petroleiro que também integra a direção do sindicato, Marcelo Nunes identifica que há um “notório aumento da pobreza”. Ele lembra que “milhões de brasileiros não têm o que comer por conta de políticas implementadas por Temer e aprofundadas por Bolsonaro” e se disse “feliz em ajudar a diminuir a fome de tantas pessoas”.
Olhar da fome
A diretora do Sindipetro-NF, Conceição de Maria, também integra o grupo de sindicalistas que passaram por experiências fortes durante a distribuição de cestas básicas. Na comunidade do Botafogo, em Macaé, uma senhora que recebia a doação perguntou se não havia mais duas disponíveis, para dois vizinhos que passavam por muita dificuldade. As duas cestas adicionais foram doadas, os vizinhos vieram receber e agradeceram muito, mas foi de uma senhora o agradecimento mais comovente:
“Ela disse que estava com muita fome, e chorava muito. Era uma sinceridade da fome. Um olhar da fome, olhar de quem chora e agradece. Nestes tempos em que temos que ficar de máscara, o olhar diz ainda mais. Receber o olhar daquela senhora foi mais forte do que levar um tapa na cara”, contou Conceição.