A economia em câmera lenta

* Clemente Ganz Lucio

Os indicadores de emprego (fevereiro) e inflação (março) mostram que a economia anda de lado. Se parou de cair no fundo do poço da recessão, a recuperação está longe de acontecer.

A recessão é profunda e grave e, para piorar, a estratégia do governo está focada nas reformas que entregam a economia para o mercado e os interesses internacionais e de multinacionais. Nesta estratégia, a natureza da retomada será definida pelo mercado e a sustentação do crescimento será promovida por ele, cabendo ao governo a articulação. A história econômica atesta que a economia crescerá, o País será mais rico, resultando, porém, no aumento da desigualdade – os ricos ficarão muito mais ricos – na expansão da precarização do trabalho e no aprofundamento da pobreza.

Os indicadores de inflação apontam para uma taxa muito baixa para os padrões estruturais da economia brasileira. O IPCA (IBGE) variou 0,09% em março, acumulando taxa de 2,68%, em 12 meses, lembrando que o piso da meta de inflação é de 3%. Há nove meses, a taxa de inflação anual é inferior à meta. Segundo o ICV-Dieese, a taxa de março variou 0,03%. A pesquisa da cesta básica, também feita pelo Dieese, mostrou que os preços dos alimentos caíram em 12 capitais. O comportamento dos preços da alimentação são um dos componentes que explicam as baixas taxas.

Se a economia estivesse bombando, essa baixa inflação poderia ser comemorada pelos trabalhadores, porque representaria maior salário real e maior poder de compra. Porém, os resultados são predominantemente decorrentes de uma dinâmica perversa, que combina recessão e reformas que reorganizam profundamente a economia brasileira.

O desemprego continua elevado, com cerca de 13 milhões de desocupados e outro número equivalente de pessoas trabalhando aquém do necessário para sustentar o orçamento familiar. Estruturalmente, o desemprego parou de aumentar. Mas isso só aconteceu devido ao crescimento da informalidade e precarização. Há mais de duas milhões de ocupações informais – trabalhadores autônomos, por conta própria e assalariados sem Carteira, enquanto foram fechados quase um milhão de postos formais. Queda da renda dos ocupados e precarização aumentam a insegurança, em um ambiente de extrema instabilidade, com crédito extorsivo, o que afasta ainda mais o trabalhador do consumo.

Os governos cortam gastos e investimentos. As empresas bloqueiam seus investimentos porque se defrontam com grande capacidade ociosa. Quem puxa o crescimento? O front externo? Sozinho, ele não é capaz. Dois terços da nossa dinâmica econômica são dados pelo mercado interno ou pelo consumo das famílias. Do outro terço que dá tração à economia, mais da metade deve-se aos investimentos. O mercado externo ajuda com pouco mais de 10% e não é capaz de dar a força necessária à retomada ampliada do crescimento econômico.

Irrompem outra base e outra estrutura econômica para a dinâmica produtiva. Haverá geração de renda e riqueza, mas não a promoção do desenvolvimento econômico e social esperado por grande parte da sociedade. Por quê? Porque essas reformas visam reduzir o papel do Estado na economia, dando a ele o papel de garantir as transferências, que estão em curso, de ativos naturais e produtivos, asseverar o pagamento do escandaloso custo da dívida pública, promover a concorrência e favorecer a competição. Tudo isso para que, no livre mercado, pobres e trabalhadores, coagidos pela necessidade e falta de alternativas, e submetidos às novas regras promovidas pelas reformas, aceitem a desigualdade e a pobreza como destino ou como a própria incapacidade de “vencer na vida”.

*Sociólogo e Diretor Técnico do Dieese