Os petroleiros das plataformas da Bacia de Campos têm indicativo do Sindipetro-NF de realização, na manhã desta terça, dia 10, das 7h às 9h, de assembleias simultâneas para discutir a conjuntura brasileira e as condições de trabalho a bordo. Texto do Sindipetro-NF (íntegra abaixo ou aqui em pdf) e o relatório final do Grupo de Trabalho da Pauta Pelo Brasil (aqui) subsidiam o debate.
O sindicato orienta que os petroleiros comecem, ainda hoje, a organizarem a assembleia de amanhã.
A atividade faz parte da mobilização nacional que denuncia a iminência de mais um passo na concretização do golpe que levará a um cenário de corte de direitos trabalhistas e sociais, privatizações e implementação de uma agenda neoliberal na economia e conservadora nos costumes.
Nestas duas horas, a categoria discutirá a conjuntura atual e as condições de segurança e efetivo da unidade. A proposta é a de que os trabalhadores façam um manifesto sobre o momento brasileiro, além de elaborarem outro documento que informe problemas de segurança e de falta de pessoal a bordo.
Confira abaixo a análise do Sindipetro-NF sobre a conjuntura política brasileira:
Aos Companheiros da Bacia de Campos
Muito além do golpe: uma análise da conjuntura política brasileira
Está cada vez mais evidente que o impeachment da presidenta Dilma Rousseff envolve também o aproveitamento, pelos mais reacionários setores da política brasileira, de uma janela de oportunidade para banir as formas populares de representação nos poderes públicos e criminalizar os movimentos sociais.
A Direita brasileira utiliza-se de um contexto para o qual confluíram as manifestações difusas de 2013 (um “contra tudo isso que está aí” que acabou por se tornar apenas um “contra Dilma, Lula e o PT”); a ação deliberada da TV Globo pela desestabilização do governo e potencialização do clima de crise (que quanto mais se alimenta pior fica, ao gerar desânimo e desconfiança no futuro); a atuação seletiva do Ministério Público, da Polícia Federal e do Poder Judiciário; e, sobretudo, o crescimento pós-eleições de 2014 do número de parlamentares da chamada bancada BBB (Boi, Bala e Bíblia), que identifica no PT e no governo da presidenta Dilma ameaças a valores como “propriedade”, “segurança” e “família”.
Os erros do governo — e eles são muitos, fartamente apontados pelo movimento sindical petroleiro e que levaram à greve em defesa da Petrobrás em novembro de 2015 — serviram de pretexto para toda sorte de generalizações, exageros, pré-julgamentos, ações midiáticas da polícia, campanhas difamatórias, em proporção jamais vista em governos da Direita no Brasil, ainda quando diante de escândalos muito semelhantes.
Uma das maiores atingidas por essa campanha sistemática foi a própria Petrobrás, que além de ter sido alvo da ação deletéria dos esquemas que envolvem políticos, partidos e empreiteiras — mal do qual ela se ressente há décadas e décadas —, teve sua imagem esmagada diariamente como se fosse uma empresa inimiga do País, em condição que chegou, em momentos agudos, a gerar preconceito popular até mesmo contra os petroleiros, que passaram a ser apontados como malfeitores. Todo um cenário internacional de crise do petróleo, que tem feito despencar resultados de todas as grandes empresas petroleiras do mundo, foi ignorado ou minimizado pela imprensa brasileira, que credita apenas na conta do governo e da sua “república sindical” na empresa o mau momento vivido pela companhia.
Essa bem engendrada máquina de desmonte do estado social estruturado no pós-2003 está baseada nos mesmos fundamentos que, de modo cíclico, se insurge para atacar o nacionalismo que deu origem à Petrobrás, o conjunto de direitos previstos na CLT, as conquistas sociais previstas na Constituição de 1988 — até hoje não regulamentadas em sua plenitude e não cumpridas efetivamente em vários campos —, as organizações dos trabalhadores, a luta pela terra, os direitos das minorias, entre tantos outros que procuram universalizar o acesso a bens, ao conhecimento e à liberdade. É sempre uma luta de fluxo e contra-fluxo, onde não cabe a ilusão de que os avanços estão necessariamente garantidos em uma trajetória evolutiva. A história não é linear.
Numa interpretação culturalista, não se pode perder de vista a perspectiva de que o Brasil é extremamente conservador e escravocrata, e qualquer momento de democracia estável e de avanço social pode ser tratado mais como exceção do que como regra. A visão reacionária do mundo está impregnada nos meios jurídico, empresarial, religioso, político e econômico. E numa interpretação estruturalista, vê-se que os aparatos de estado são mantidos para defender esse status de dominação do capital sobre o trabalho.
Assim como Getúlio Vargas em algumas das suas políticas, João Goulart em outras, Leonel Brizola em muitas no âmbito estadual, ou como Miguel Arraes, entre tantos outros que buscaram na política institucional abrir janelas para a ascensão popular a patamares mais dignos de vida, o ex-presidente Lula conseguiu feitos incríveis para uma realidade histórica tão adversa. Qualquer um que tenha assistido à sessão da Câmara Federal que votou pela admissibilidade do impeachment da presidente Dilma pôde perceber o tamanho monumental do desafio que é mudar um País com esse tipo de elite política. Foi com essa gente que a esquerda, no poder, teve que se relacionar para, por exemplo, retirar da condição de miseráveis mais de 30 milhões de brasileiros, voltar a contratar diretamente na Petrobrás, recuperar a indústria naval, construir institutos federais e universidades, ampliar direitos e elevar o acesso ao consumo.
A verdade é que os que realmente defendem os trabalhadores, que têm visões progressistas da história, que querem mudanças emancipatórias para os mais pobres, nunca deixaram de ser minoria no Brasil. Circunstancialmente estiveram e ainda estão no poder central, mas em um equilíbrio crítico que, agora, se revela inviável. Nem mesmo a vitória dentro das regras do jogo político, nas eleições, garantiu que essa sustentação se desse, como mostra nestes dias o golpe em curso.
Muitos acreditaram, talvez até de boa fé, ser verdade que a articulação de diferentes setores, da Fiesp à Força Sindical, tivesse realmente a ver com o combate à corrupção. O monopólio da comunicação não permitiu que o debate franco e aberto se desse entre as diferentes forças, e essa farsa do combate à corrupção se constituiu como narrativa única sobre os acontecimentos. Também estão pouco se importando com as chamadas “pedaladas fiscais”, que de resto também foram praticadas por presidentes anteriores, por governadores e até mesmo pelo vice Michel Temer, sem que inspirassem qualquer comoção zelosa por formalismos orçamentários. Esconderam o quanto puderam que o que realmente querem é eliminar qualquer barreira que se coloque entre eles e a viabilização da sonhada agenda neoliberal dos anos 1990, de arrocho sobre o trabalhador, corte de direitos, privatizações, enxugamento do estado, terceirização, pejotização, entre outras mazelas.
O movimento de conspiração contra a presidenta Dilma, contra a qual nada se provou, se fez justamente tendo estes fundamentos, explicitados na plataforma do PMDB para o momento brasileiro, divulgada pelo partido em outubro de 2015 no documento “Uma ponte para o futuro” (Íntegra disponível no site da sigla, em http://bit.ly/1jKTsD9), e tomadas pelo vice-presidente Michel Temer como programa de campanha em uma espécie de eleição indireta para a Presidência da República, que é o que se tornou na prática a questão do impeachment no Congresso Nacional.
Apenas para ficarmos em trechos deste documento que tratam da visão que terão em relação ao papel do estado na economia, diz o PMDB, com toda a clareza, que pretende “executar uma política de desenvolvimento centrada na iniciativa privada, por meio de transferências de ativos que se fizerem necessárias, concessões amplas em todas as áreas de logística e infraestrutura, parcerias para complementar a oferta de serviços públicos e retorno a regime anterior de concessões na área de petróleo, dando-se a Petrobras o direito de preferência”. Em uma palavra: privatização. Também pretende o partido “na área trabalhista, permitir que as convenções coletivas prevaleçam sobre as normas legais, salvo quanto aos direitos básicos”. Em uma palavra: precarização.
Estas ideias não surgem do nada. Elas estão na agenda da Direita desde sempre, e agora, depois de mais de uma década de governos que resistem a este ideário, encontraram condições políticas para se viabilizarem. Estão todas em um conjunto ainda mais assustador de medidas, mapeadas em levantamento recente do Diap (Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar), que mostra que, neste momento, tramitam 55 projetos de lei na Câmara Federal e no Senado que buscam cortar direitos trabalhistas e sociais. Abaixo, a título de exemplo, apenas alguns deles (íntegra no site do Diap, acesso em http://bit.ly/228r6nM):
– Regulamentação da terceirização sem limite permitindo a precarização das relações de trabalho (PL 4302/1998 – Câmara, PLC 30/2015 – Senado, PLS 87/2010 – Senado);
– Instituição do Acordo extrajudicial de trabalho permitindo a negociação direta entre empregado e empregador (PL 427/2015 – Câmara);
– Impedimento do empregado demitido de reclamar na Justiça do Trabalho (PL 948/2011 – Câmara e PL 7549/2014 – Câmara);
– Suspensão de contrato de trabalho (PL 1875/2015 – Câmara);
– Prevalência do negociado sobre o legislado (PL 4193/2012 – Câmara);
– Prevalência das Convenções Coletivas do Trabalho sobre as Instruções Normativas do Ministério do Trabalho e Emprego – MTE (PL 7341/2014 – Câmara);
– Livre estimulação das relações trabalhistas entre trabalhador e empregador sem a participação do sindicato (PL 8294/2014 – Câmara);
– Redução da jornada com redução de salários (PL 5019/2009 – Câmara);
– Criação de consórcio de empregadores urbanos para contratação de trabalhadores (PL 6906/2013 – Câmara);
– Regulamentação da EC 81/2014, do trabalho escravo, com supressão da jornada exaustiva e trabalho degradante das penalidades previstas no Código Penal (PL 3842/2012 – Câmara, PL 5016/2005 – Câmara e PLS 432/2013 – Senado);
– Estabelecimento do Simples Trabalhista criando outra categoria de trabalhador com menos direitos (PL 450/2015 – Câmara);
– Susta a Norma Regulamenta (NR) 12 sobre Segurança no Trabalho em Máquinas e Equipamentos (PDC 1408/2013 – Câmara e PDS 43/2015 – Senado);
– Deslocamento do empregado até o local de trabalho e o seu retorno não integra a jornada de trabalho (PL 2409/2011 – Câmara);
– Susta Norma Regulamentadora 15, do Ministério do Trabalho Emprego, que regula as atividades de trabalhadores sob céu aberto (PDC 1358/2013 – Câmara);
– Susta as Instruções Normativas 114/2014 e 18/2014, do Ministério do Trabalho, que disciplinam a fiscalização do trabalho temporário (PDC 1615/2014 – Câmara);
– Estabelecimento da jornada flexível de trabalho (PL 2820/2015 – Câmara e PL 726/2015 – Câmara);
– Estabelecimento do trabalho de curta duração (PL 3342/2015 – Câmara);
– Transferência da competência para julgar acidente de trabalho nas autarquias e empresas públicas para a Justiça Federal (PEC 127/2015 – Senado);
– Criação do Estatuto das Fundações Estatais (PLP 92/2007 – Câmara);
– Regulamentação e retirada do direito de greve dos servidores (PLS 710/2011 – Senado; PLS 327/2014– Senado; e PL 4497/2001 – Câmara);
– Fim da exclusividade da Petrobras na exploração do pré-sal (PL 6726/2013 – Câmara);
– Estabelecimento de que a exploração do pré-sal seja feita sob o regime de concessão (PL 6726/2013);
– Privatização de todas as empresas públicas (PLS 555/2015 – Senado);
O trabalhador em geral, e o petroleiro em particular, especialmente depois de tudo o que se viu de assombroso na política brasileira nos últimos dias, quando um bandido que viria a ser afastado do mandato pela Justiça ousou comandar um golpe, não pode fazer de conta de que todas essas ameaças não são reais, com altíssimo potencial de concretização em um eventual governo Temer, com apoio da mídia e da mesma maioria do Congresso que chancela a trágica farsa do impeachment.
Está provado, portanto, que não se trata de defender Dilma, Lula ou o PT. Se trata de defender o emprego, a segurança do contrato de trabalho, a proteção a direitos fundamentais, conquistados e mantidos à custa de muita luta, e sobretudo defender a Petrobrás e o pré-sal. Se trata ainda de defender a democracia, o respeito ao voto popular, aos movimentos sociais, às lutas dos trabalhadores do campo e da cidade que buscam historicamente romper os grilhões da exploração, do trabalho escravo, da concentração da terra, do autoritarismo das gestões empresariais, da insegurança no trabalho, da transformação da mão de obra em mercadoria barata e de fácil reposição.
É por tudo isso que o Sindipetro-NF indica este momento de reflexão sobre o momento brasileiro, quando em atraso de duas horas na entrada do turno da manhã do dia 10 de maio, nas plataformas da Bacia de Campos, e também por meio de atividades nas bases de terra em Macaé, os petroleiros manifestam a adesão da categoria ao movimento nacional que denuncia o golpe contra a presidenta e contra os direitos dos trabalhadores.
O sindicato sugere que esta assembleia, indicada para acontecer de modo simultâneo nas plataformas, aprove manifesto dos petroleiros da unidade com a visão do grupo sobre a conjuntura nacional, e que também aproveite este esforço de debate e organização para formalizar, para a entidade, uma relação de pendências de segurança e problemas com o baixo efetivo na plataforma, que são elementos que tendem a ganhar realidades ainda mais dramáticas se for confirmada a provável posse de Temer em lugar de Dilma.
A história nos chama a um momento de grande resistência e de luta. E novamente a categoria petroleira não se omitirá. Sigamos firmes e fortes.
Saudações sindicais,
Diretoria do Sindipetro-NF
Macaé, 09 de Maio de 2016
Relatório GT Pauta Pelo Brasil
Análise de Conjuntura do Sindipetro-NF