Alex Mirkhan / Do Brasil de Fato – Tema que deve dominar a pauta do Congresso Nacional nas próximas semanas, a redução de preços dos combustíveis é vista como indispensável para reduzir os impactos da inflação recorde, que inicia o ano acima de 10%. O governo aposta na PEC dos Combustíveis para reduzir ou até zerar os impostos estaduais. Já a oposição tem outras soluções para o problema.
No momento, são quatro propostas, sendo três delas com abordagens semelhantes ao problema e que envolvem a alteração do cálculo do ICMS, o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviço. Assim, essas três propostas entram em acordo com o discurso do presidente Jair Bolsonaro (PL-RJ), que, desde a agudização da crise dos preços de combustíveis, joga a responsabilidade aos governadores.
Já a quarta proposta, idealizada pela oposição, tenta viabilizar o projeto de lei de autoria do senador Rogério Carvalho (PT-SE), que cria uma faixa de preços de combustíveis e um fundo de subsídios, com o objetivo de conter o impacto da volatilidade do preço do barril de petróleo e do câmbio do dólar. Embora reconheça não se tratar da solução ideal, Carvalho afirma que é um passo importante para o país retomar a busca por sua autossuficiência na produção e no refino de petróleo.
Redução do valor de ICMS
Nesta terça-feira (8), o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), disse em entrevista ao jornal Folha de S.Paulo que seu objetivo era viabilizar a aprovação do PLP11, que foi aprovado em outubro de 2021 pela Câmara e avançou ao Senado, para reduzir o valor de ICMS no primeiro momento e depois entrar em outros méritos discutidos pelas PECs governistas. Se aprovado, os Estados serão instados a estabelecer um valor fixo anual do imposto, que não pode ser maior que a alíquota de ICMS aplicada sobre a média do preço do combustível nos últimos anos, tendo vigência por 12 meses.
O economista Edson Silva, da consultoria ES Petro, considera esses tipos de medidas “improdutivas”, porque trariam um grande rebote inflacionário e seriam defasadas na primeira alta do dólar ou da cotação internacional do barril de petróleo. Segundo ele, tratam-se de soluções “oportunistas e eleitoreiras”, e não técnicas, por não atacarem a raiz do problema.
“Não há consenso nem na base do governo. Contudo, tudo indica que a proposta do senador Carlos Fávaro (PEC dos Combustíveis), que é a pior, vai tramitar mais rápido, apesar de fazer um estrago geral. Subsídio ao caminhoneiro, aumentar o vale gás… é uma gandaia. Será um desastre se ela for aprovada”, afirma.
Resistência no Senado
Os parlamentares do PT avaliam que a PEC deve enfrentar grande resistência, especialmente no Senado, onde precisa de 47 dos 81 votos possíveis para avançar. Eles também acreditam que a proximidade das eleições, somada à queda de popularidade do presidente Bolsonaro, pode desidratar a base de apoio governista, o que terá efeito também em outros temas caros ao governo, como as reformas tributária e administrativa.
O deputado federal Helder Salomão (PT-ES) acredita que o governo ainda dispõe de um apoio razoável no Congresso, mas cada vez mais fragilizado em decorrência da “deterioração da imagem de Bolsonaro” e da “incompetência do seu governo”. “O que segura hoje o apoio ao Bolsonaro no Congresso Nacional: cargos e emendas públicas e secretas. Mais nada”, avalia.
Para o senador Jean Paul Prates (PT-RN), que é relator do PL apresentado por seu colega Rogério Carvalho, a proposta governista para os combustíveis não é séria. “O projeto já veio na forma de provocação. Eles falam ‘governador, abaixe o seu imposto’. Como se fosse simples para um governador ou uma governadora abrir mão de 20, 25, 30 por cento da receita do seu Estado”, ressalta Prates, que também traça um panorama: “Subsidiar combustível fóssil com o dinheiro da escola, do hospital, da segurança pública é completamente contrário a qualquer lógica progressista, ambientalista e até nacionalista.”
Alternativa momentânea
Prates defende que o projeto petista é bem melhor que as PECs apresentadas pelo senador Carlos Fávaro (PSD-MT) e pelo deputado Christino Áureo (PP-RJ), embora dependam da celeridade do governo mesmo se forem aprovadas, porque cabe ao governo calibrar as seis fontes de receitas apresentadas no projeto e colocar uma nova política de preços de prática.
Ele também afirma que sua intenção não é ajudar o governo Bolsonaro, “mas evitar que isso vire uma bomba relógio para o próximo presidente, que pode ser o Lula”, menciona o senador petista. “O segundo papel é criar uma solução para amenizar o problema que o povo já está sentindo agora, com a inflação nas alturas, enquanto o governo passava o tempo apenas contemplando o problema”.
Segundo Rogério Carvalho, os preços preços dos combustíveis causam um efeito bola de neve que poderia ter impacto de 4% na taxa de inflação de 10,59%, “além de gerar o aumento do juros real, porque você precisa controlar a inflação, reduzir o consumo, e isso sem contar nos impactos para a cadeia produtiva e para a indústria petroquímica”.
“A nossa proposta é que, quando o barril de petróleo passa de 40 dólares já é muito lucrativo, então tem que haver uma taxação do petróleo para desestimular a exportação do petróleo cru e estimular o refino de parte dele aqui. E cria-se um fundo para cobrir o custo de importação do diesel e do gás natural, sem dar prejuízo à Petrobras, garantindo um lucro de aproximadamente 50% em reais. Qual negócio que dá 50% de lucro?”, questiona.
Carvalho também projeta que os efeitos da medida poderiam ser quase imediatos, caso fossem adotados integralmente pelo governo, o que ele lamenta ser algo improvável. “Em dois ou três meses de aplicação, você já pode ter uma redução de 2 reais na gasolina, de 30% no preço do botijão, de 30% no preço do óleo diesel. Já seria uma redução em escala extraordinária”, vislumbra.
Buraco mais embaixo
“Eu acho inadmissível uma empresa que consegue extrair petróleo do pré-sal a 8 dólares, segundo informações de uma diretora da Petrobrás, e fora do pré-sal a 11 dólares o barril, queira colocar o mesmo preço do petróleo vendido na China, que não produz nada”, reclama o consultor Edson Silva, ao introduzir o que considera a grande vilã desse tema, que é a política de Preço de Paridade Internacional (PPI), criada no governo Temer e aprofundada no governo Bolsonaro.
Jean Paul Prates relembra que à época da adoção dessa política, feito inédito na história do país, a justificativa utilizada era de que o investidor estrangeiro seria atraído para uma empresa mais previsível. “O fato de você penalizar todos os brasileiros com preço em dólar, ajustado em tempo real, (…) não é o único quesito importante para que alguém de fora esteja passando, olhe o Brasil e fale: ‘vou fazer uma refinaria de 7 bilhões no Nordeste’. Não é”, contesta.
Segundo ele, o país passou a acreditar que atrairia investimentos na instalação de novas refinarias, sem considerar a magnitude dessas operações, cujos retornos são de longo prazo, em um mundo cada vez mais preocupado em fazer a transição energética. Em nome de apresentar-se palatável ao mercado, o Brasil teria abandonado sua meta histórica de ser autossuficiente em petróleo: “A origem da Petrobras é ajudar o brasileiro e servir ao Brasil, não ao acionista”.
Desmonte da Petrobras
O desmonte do modelo que perdurou por longos anos na estatal petrolífera, inclusive durante a ditadura militar (1964-1986), só foi possível graças à grande campanha midiática que veio à reboque da operação Lava Jato. Prates afirma que a companhia inteira, incluindo fornecedores e parceiros que não tinham qualquer relação com as investigações, ficou desacredita em um processo que, acredita, poderia ter sido resolvido com operações cirúrgicas e punições aos autores dos eventuais delitos.
“Não podemos levar pra casa o rótulo de que tudo está acontecendo porque o PT quebrou a Petrobrás. Isso não existe. Em qualquer parte do mundo seria tratada com acordos de leniência em que a estrutura não seria prejudicada”, defende o senador, que ainda vê a necessidade de o tema ser enfrentado com mais veemência pela esquerda.
Sobre o destino da companhia em uma eventual vitória de Lula nas eleições deste ano, o deputado Salomão lembra que o ex-presidente já manifestou interesse em pôr fim à dolarização dos combustíveis. “Essa é a única saída para controlar os preços. Qualquer governo que entrar e disser que vai reduzir os preços sem acabar com essa metodologia estará mentindo. E o Lula disse que vai mudar”, encerra.
[Foto: Pedro Ventura/ Agencia Brasilia]