Da Imprensa da CUT Brasília – O processo de impeachment contra a presidenta, que anda a passos largos e sem muita expectativa de ser interrompido, traz para parte considerável da sociedade brasileira a sensação de ausência total de justiça e, principalmente, de novo golpe de Estado, uma vez que não há crime de responsabilidade algum por parte de Dilma Rousseff. Para o advogado da presidenta e ex-ministro da Advocacia Geral da União (AGU), Eduardo Cardozo, embora legítimo, esse sentimento não pode afetar a resistência e a luta em defesa dos direitos e da democracia. A avaliação do jurista foi feita durante o Seminário Jurídico da CUT Brasília: Resistir ao golpe e reconstruir o Estado Democrático de Direito, realizado nesta quinta-feira (14), no Clube dos Comerciários (DF).
“Utilizemos esse processo para convencer os que nos julgarão; se não conseguirmos convencê-los, vamos fazer com que a sociedade os convença; e se não conseguirmos fazer com que a sociedade os convença, façamos com que a história registre a injustiça e a improcedência, pois, de pelo menos de uma coisa temos certeza: nós estamos do lado certo da história”, disse Cardozo.
Ele entende que os golpes militares tradicionais foram substituídos por formas “constitucionais” de substituição de governos, mas gerando os mesmos resultados devastadores. “Para se manter a aparência de que a democracia não foi violentada, se invoca a Constituição para rasgá-la”, explica.
O ex-ministro contextualiza que, nos últimos tempos, houve um boom de destituições de governos progressistas na América Latina, processo patrocinado por uma direita inconformada com a distribuição de renda, com a promoção de programas sociais, com a construção de um panorama social mais justo. “Nós poderíamos chamar de diversas maneiras esse tipo de ação, mas não se pode retirar a ideia de que, quando se faz isso, o que se está fazendo é uma violência, uma ruptura constitucional. Não é uma violência com armas, mas a violência contra o voto popular, contra a soberania. E essa situação na Ciência Política tem um nome: golpe de Estado”, avalia Cardozo.
O jurista foi novamente categórico ao dizer que não há qualquer crime que justifique o pedido e a tramitação do processo de impeachment contra a primeira mulher eleita para ocupar a principal cadeira do Executivo Federal do Brasil. Segundo o ex-ministro da AGU, o pedido é pautado em critérios meramente políticos e individualistas de setores da direita, capitaneados principalmente pelo deputado Eduardo Cunha, réu em processos de corrupção e cassação.
“Um golpe na democracia é um golpe que não tem restauração possível, a não ser com a volta dos mecanismos democráticos. Um governo que nasce ilegítimo é um governo que nunca deixará de ser ilegítimo. Quem pode virar esse jogo são vocês (trabalhadores)!”, alerta Eduardo Cardozo.
Os mitos dos supostos crimes de Dilma
O processo de impeachment contra Dilma tem dois argumentos principais: as chamadas pedaladas fiscais, relativas ao atraso de pagamento da União ao Banco do Brasil quanto ao Plano Safra, e os decretos de crédito suplementar. Os argumentos, repercutidos com forca pela direita brasileira, amplificada pelos meios de comunicação golpistas, não são válidos. A afirmação e da ex-secretária do Orçamento Federal, Esther Dweck.
As ações que são apontadas como crime para impeachmar a presidenta são tipificadas pela técnica como “atos corriqueiros da Administração Pública”.
Ela explica que os decretos de crédito suplementar têm previsão na lei desde 1964, que sempre previu a possibilidade de alterações infralegais da Lei Orçamentária. “Eu posso fazer uma alteração, desde que eu não comprometa a obtenção da meta. E, no nosso entendimento, a obtenção da meta é atingida desde que eu não aumente os gastos. E a gente conseguiu provar, a partir de pericia, que esses decretos não aumentaram em nada o gasto previsto. Eles foram apenas um remanejamento interno dos órgãos para facilitar o dia a dia deles, a gestão orçamentária e melhorar, inclusive, a qualidade do gasto”, explica Dweck.
Ela ainda lembra que o Orçamento é descentralizado e, antes de os decretos serem assinados por Dilma, eles passaram pela avaliação de vários técnicos. “Todos esses atos foram assinados pela presidenta com pareceres técnicos e jurídicos, e todos dizendo que era legal. Então, era impossível ela fazer isso com qualquer dúvida sobre sua legalidade. O que houve foi uma mudança de interpretação da lei, posterior aos fatos: a mudança do entendimento do TCU aconteceu em outubro e esses seis decretos, que viraram três, foram editados em julho e agosto. E é muito claro no Direito que não se pode retroagir o entendimento da lei”, explica.
Quanto às chamadas pedaladas fiscais, a ex-secretária do Orçamento Federal afirma que “atraso de pagamento feito pelo governo federal é algo que acontece, principalmente, em um momento de queda de arrecadação”. “O que se tentou fazer contra a presidenta, neste caso, foi mudar a natureza do atraso, passando a ser uma operação de crédito,ou seja, tentam fazer parecer como se os bancos públicos estivessem emprestando dinheiro ao governo federal”, diz.
Segundo ela, o mais importante a ser destacado neste caso é que, para ser crime de responsabilidade fiscal, deve haver ato da presidenta, o que não conseguiu ser comprovado. “Ainda há a decisão recente do Ministério Público do DF dizendo que não só não há ato da presidenta, como isso não configura crime”, sustenta Esther Dweck.