Congrenf: Boff, Rosangela e Delúbio promovem reflexão profunda sobre cenário ambiental, energético e político do Brasil

Uma manhã que serviu como um curso intensivo, a nivel de pós-graduação, sobre emergência climática, transição energética e o cenário político recente do Brasil. Assim pode ser resumida a mesa “Caminhos para o mundo que queremos – Fortalecer os petroleiros para fortalecer o Brasil”, realizada na manhã de hoje durante o 20° Congrenf (Congresso dos Petroleiros do Norte Fluminense).

Com exposições do teólogo, filósofo e escritor Leonardo Boff; da representante dos trabalhadores no Conselho de Administração da Petrobrás, Rosangela Buzanelli; e do sindicalista e ex-tesoureiro do PT e da CUT, Delúbio Soares; e moderação do diretor do Sindipetro-NF, Johnny Souza, e da também diretora do sindicato, Giovana Almeida; a mesa trouxe grande qualificação para os debates do Congresso e para a luta petroleira.

Frei Leonardo Boff: defesa de uma mudança imediata nas formas de produção e consumo para defender a “Mãe Terra”

Questão ambiental

Boff concentrou a sua exposição na defesa do meio ambiente, da “mãe Terra”, como elemento essencial para a sobreviência da espécie humana. Baseado em farta citação de estudos científicos em em sua contribuição para os debates da ONU em torno da discussão do tema, ele advertiu que o planeta está muito próximo de um colapso.

Aos 85 anos, relembrou parte da sua trajetória de militante de esquerda com prioridade nos debates ambientais, destacando que atualmente a humanidade vive três grandes ameaças: um “cataclisma nuclear”, que ainda não pode ser afastado em um cenário de disputa por hegemonia dentro de uma lógica unipolar, onde uma grande potência quer dominar o mundo, ao contrário de harmonizar pólos distintos de potências; a “sobrecarga da Terra”, dado que hoje a humanidade consome 1,5 vez o que o planeta pode produzir, especialmente os países ricos; e o extremos climáticos, que tem dado exemplos no Brasil com as enchentes recentes no Rio Grande do Sul e os incêncios atuais no Pantanal.

“Aquilo que a Terra produz é insuciente face ao consumo humano, especialmente entre as elites. Entramos no sinal vermelho, no cheque especial. Todo ano os cientistas da ONU dizem não podemos chegar em novembro [no calendário da vida da Terra traduzido em meses], será o colapso da civilização”, afirma o teólogo.

Em relação ao aquecimento global, Boff afirma que a humanidade “não está indo, está dentro”. “O ser humano é culpado, nós não cuidamos da Terra. São três séculos de exploração sistemática. A estrutura de toda a Modernidade é a vontade de poder e o poder como dominação”, adverte.

Boff, que no início da sua fala havia classificada como “complicada” a questão da exploração do petróleo na margem equatorial, ponderou que a Petrobrás e os petroleiros têm um papel importante na transição energética.

“É importante a gente fazer o que vocês [petroleiros] fazem, tem que levar avante, garantir o leite das nossas crianças, fazer funcionar o capital, esse sistema, mas o problema é a cultura do capital, e todos nós aqui somos reféns dela. Temos que trocar tudo porque tudo virou mercadoria. Uma sociedade que tinha mercado virou ela mesma o mercado”, afirma.

Buzanelli: petróleo ainda será importante por muitos anos e necessário para permitir uma transição energética segura

Transição energética

O modo como a Petrobrás deve se comportar nos próximos anos na questão da transição energética foi justamente o foco da exposição de Buzanelli, que encarou de frente o tema espinhoso da exploração de petróleo na margem equatorial, a cerca de 500 KM da foz do Rio Amazonas.

A representante dos trabalhadores no Conselho de Administração da Petrobrás deixou claro que promover os estudos para conhecer o potencial da área é uma decisão consolidade. E a razão é simples: o Brasil (e o mundo) ainda precisa do petróleo e é preciso encontrar formar de repor as reservas atuais. Será justamente esta garantia que poderá promover uma transição segura para o uso cada vez maior de outras matrizes (que também têm seus impactos).

Ela afirma que a discussão sobre a exploração de petróleo na margem equatorial “foi capturada politicamente” para atingir o governo Lula, mas precisa ser tratada com a seriedade que merece. Atualmente, a maior parte do petróleo produzido no Brasil vem das regiões do pré-sal, como as Bacias de Santos e de Campos, mas a previsão é a de que essa produção entre em declínio por volta de 2030.

O que a gente está procurando não é na foz do rio Amazonas. Temos que mostrar isso. Estamos a mais de 500 km da foz do amazonas. A imprensa capturou essa questão politicamente para diezer que é um constrasenso [do governo Lula]. Colocam foto da selva, e nós produzimos na selva [na base de Urucu], e é uma vitrine para o mundo, o cuidado da Petrobras com a questão ambiental remonta lá atrás”, defende.

Buzanelli explica que “a margem equatorial é uma das fronteiras mais promissoras para repor as reservas, porque vamos precisar de petróleo por muito tempo ainda, nem em 2050, como preveem, conseguiremos abrir mão do petróleo”, afirma.

Ela apresentou dados para mostrar a eficiência energética do Brasil, que tem a matriz mais diversa do mundo, com muito potencial em fontes renováveis, e que, no país, a geração de energia está longe de ser a maior causa de emissão de gases de efeito estufa, na casa dos 18% (somente a agroindústria é responsável por 27%, e somando todas formas de uso do solo, de 48%, ultrapassa os 70%).

“O futuro descabornizado não é sem hidrocarbonetos. Até 2050 não vamos conseguir sair do mundo do petróleo, mesmo no cenário mais ambicioso em termos de emissões mostra a presença dos combustiveis fosseis até esse horizonte”, explica, destacando como agentes causadores o crescimento populacional e econômico e a continuidade da necessidade do petróleo em em setores energo-intensivos, como a petroquímica, a aviação e a navegação.

Ela defende uma transição gradual, onde a indústria de óleo e gás ainda desempenhará um papel importante. “a solução para os problemas climáticos inclui a indústria de óleo e do gás”, afirmou.

Para manter esse papel, é necessário continuar a buscar petróleo, defende a conselheira. Ela adverte que se o Brasil decidisse parar de procurar novas rervas, a consequência seria a produção entrar em declínio a partir de 2031 e, com a manutenção da demanda, passar a ter que importar o produto.

O plano estratégico da Petrobrár para 2024-2028 deixa clara essa necessidade, prevendo muitos investimentos na área de exploração e produção (73% do previsto), com US$ 3,1 bilhões para as bacias da região Sudeste e este mesmo montante para a Marquem Equatorial.

Delúbio: ataques como as denúncias do Mensalão e a Lava Jato foram formas de tentar desmobilizar sindicatos e movimentos sociais

Cenário político

Em sua exposição, Delúbio Soares rememorou a própria trajetória e as construções do Partido dos Trabalhadores, da Central Única dos Trabalhadores e de diversos movimentos sociais importantes, como o MST. O sindicalista demonstrou que casos rumorosos como o do Mensalão e da Lava Jato foram forjados para tentar destruir esses movimentos e tirar os trabalhadores do protagonismo da política no Brasil.

Essa série de ataques às organizações populares vem de longe. Ele dá como exemplo a própria Ditadura Civil-Militar brasileira. “Muitos não sabem o que aconteceu na época da Ditadura, muita gente só lembra dos progressos, das mentiras do Delfin [Neto, ministro da Economia], mas conseguimos fazer o movimento social e recuperar os sindicatos, os sindicatos começaram a ser um agente, e devemos isso a uma liderança que surgiu no ABC chamada Lula, que teve depois a ideia de criar um partido. O ressurgimento e o vigor do movimento sindical, e os petroleiros foram os primeiros, naquela época com as refinarias, com professores e trabalhadores rurais, essas caegorias deram origem à CUT”, relembra.

Ele destacou que os trabalhadores voltam a ter um papel importante, nas eleições municipais de 2024. “Nós temos a oportunidade desse momento de ter uma eleição municipal, como se fosse um treino, um ensaio para 2026, temos que apoiar alguém ou ser candidato. Aqueles que forem candidatos têm que fazer uma boa campanha, quem não for tem que arrumar um candidato do nosso campo e apoiar, a eleger vereador, prefeito, para chegarmos fortes em 2026”, defendeu.

Assista a íntegra

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[Fotos: Roberto Martins / Para Imprensa do NF]