Paulo Donizetti de Souza / Da RBA – O Gabinete da Transição concluiu neste domingo (11) o relatório com diagnóstico da situação em que se encontra a administração pública, a três semanas do fim do governo de Jair Bolsonaro. Ao longo da semana que passou, informações preliminares estavam chegando ao presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva. Depois de anunciar cinco ministros na sexta (9), Lula prepara o anúncio de novos nomes a partir desta segunda (12) após sua diplomação – “talvez um pouco mais que o dobro” dos indicados, como disse.
A semana começa com a formalização, pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), da legitimidade da vitória da coligação Brasil da Esperança com mais de 60 milhões de votos, em 30 de outubro. Depois de aprovar por unanimidade e sem ressalvas as contas da campanha, o TSE fará diplomação de Lula e seu vice Geraldo Alckmin nesta segunda, às 14h, tornando aptos para a posse em 1º de janeiro.
O termo “diplomação” de Lula chegou a estar entre os mais citados no Twitter durante o dia. Em parte com apoiadores do presidente eleito, em parte por bolsonaristas apostando em clima de tumulto. O vice Alckmin, por sua vez, já postou nota convocando para a posse, em 1º de janeiro.
Chama do golpe ou chantagem por anistia
O bolsonarismo tenta manter viva a expectativa de um golpe, com apoio militar. O presidente Jair, a três semanas de ir embora, estimula o confronto. Para muitos analistas, usar a disposição de alguns seguidores para produzir ambiente de tensão e terror interessa a Bolsonaro. Isso porque seria uma forma de chantagear a transição, e desencorajar investigações que podem levá-lo – e a seus filhos – à cadeia.
Por sua vez, o recém-anunciado ministro da Defesa, José Múcio, afirmou em entrevista que as Forças Armadas, embora não tenham posição unânime – há os que preferem Bolsonaro e os que preferem Lula, admitiu –, respeitarão a Constituição e a orientação do novo comando de governo.
“As Forças Armadas têm demonstrado que não apoiam qualquer movimento golpista. Evidentemente, precisamos colocar as coisas no seu devido lugar. As Forças Armadas são uma instituição do Estado brasileiro, e não de quem está comandando o Estado brasileiro”, disse.
Mas a recusa de Bolsonaro em admitir a derrota e em recriminar os atos golpistas sustenta o delírio do golpe. Pelas redes e grupos de conversas, golpistas são convocados para tumultuar Brasília tanto na diplomação de Lula quanto no dia da posse. Alguns, como de costume, postam imagens de outros atos ocorridos na Esplanada em anos anteriores dizendo que “é assim que está Brasilia hoje”.
Garantir a festa e a paz
A rede institucional de segurança do Lula acompanha as informações. Assim como os movimentos sociais que apoiam Lula são habituados a lidar com infiltrados em manifestações. Por exemplo, os chamados P2 (policiais disfarçados entre ativistas que provocam confusão para que a polícia reprima e dissolva protestos com violência). Por isso, por um lado, as organizações populares – de sindicatos, estudantes, movimentos de moradia e sem-terra – também prometem reforço em sua estrutura de segurança.
Além disso, a inteligência dos setores da Polícia Federal que acompanham o governo eleito monitora as redes, recebe denúncias e organiza informações. Agentes atuarão não só ao redor das festividades quanto disfarçados no interior delas – e dos atos golpistas. Atiradores de elite também estarão posicionados, como em todas as cerimônias de posse.
O objetivo é assegurar a paz na posse, seu valor institucional e seu significado festivo. De um lado, o encontro institucional em que chefes de governo e de Estado do mundo todo celebrarão a vitória da democracia brasileira. De outro, está sendo montada estrutura para receber de 250 mil a 300 mil pessoas na Esplanada, com dois palcos em que dezenas de artistas se apresentarão até o final da noite do dia 1º de janeiro.
A orientação de Lula é prosseguir os preparativos e confiar, e cobrar, que o governo do Distrito Federal cumpra seu papel de garantir a paz na Esplanada antes e depois da posse. Após o que a vigilância do novo governo e da sociedade contra aventuras deverão prosseguir.
Transição e votação na Câmara
Ao receber os relatórios completos do Gabinete da Transição neste domingo, Lula já terá na cabeça praticamente toda a estrutura de seu futuro governo. Os diagnósticos apontam para um conjunto de problemas armado pelo atual governo para sabotar o início do sucessor. “Estamos descobrindo coisas terríveis”, disse a ex-ministra Tereza Campello. Segundo ela, o papel da transição é, além dos diagnósticos e planos para o futuro, desarmar essas bombas. Foi essa a expressão que o próprio Lula utilizou recentemente para descrever o momento.
“Querem deixar o país a zero, pra gente começar do zero. Mas podem fazer a desgraceira que quiserem, que nós vamos consertar este país. Nós somos especialistas em desarmar bomba, não vamos deixar explodir. É importante que a gente atenda quem realmente necessita”, disse Lula
Pesquisa Ipec feita esta semana apurou que 50% acreditam que Lula fará um terceiro mandato bom ou ótimo. E que 45% dos brasileiros acreditam que o terceiro mandato de Lula será melhor do que os outros dois; 22% dizem que será igual e 26% acham que será pior. Em outra pesquisa da semana, na Quaest, 95% disseram que torcerão pelo sucesso do novo governo.
É com o relatório de transição nas mãos e os nomes dos futuros ministros e ministras na cabeça que Lula se apresentará para a solenidade de sua diplomação nesta segunda.
Para o senador Humberto Costa (PT-PE), a diplomação de Lula é uma etapa fundamental para consolidar o processo de alternância de poder vivido pelo Brasil. “A diplomação enfraquece ainda mais essa resistência terrorista por parte de grupos bolsonaristas. E a posse será uma grande celebração democrática e também uma grande festa popular”, disse o senador.
Humores
Outro desafio imediato de Lula, concomitante à sua diplomação e à consolidação de sua equipe ministerial, é acompanhar a chegada da PEC da Transição, PEC 32, ou PEC do Bolsa Família, na Câmara dos Deputados. A proposta de emenda à Constituição precisa de 308 votos na Casa. E o governo eleito espera um processo um pouco mais espinhoso do que o da aprovação pelo Senado, na semana passada.
Até porque um possível desfecho contrário ao chamado orçamento secreto no Supremo Tribunal Federal (STF) pode afetar, em muito, os humores. No Centrão de Arthur Lira, o presidente da Câmara, a PEC passará de quase certa a imprevisível. Desse modo, não é improvável que o STF deixe esse julgamento para o ano que vem.