Do Boletim Nascente 934
“Contra todos e contra ninguém / O vento quase sempre nunca tanto diz / Estou só esperando o que vai acontecer”. Os primeiros versos de “Música Urbana”, uma antiga canção do Capital Inicial, evidentemente não foram feitos para o momento atual, mas bem que poderiam ilustrar um tipo de posicionamento que uma parcela das forças políticas começou a adotar recentemente: a de não reconhecer que um golpe esteja em curso, fazer discurso contra tudo e contra todos, e esperar para ver para onde vai soprar o vento.
A fala genérica “contra tudo isso que está aí” pode ser confortável, arregimenta pequenos exércitos, mas não está à altura de quem tem responsabilidades maiores com o País e com a história. O caso Jango não poderia ser esquecido: acusado de ser comunista pela direita, e de ser reformista por parcela da esquerda, acabou por avaliar que não contava com apoio suficiente para resistir — que de forma mais intensa veio apenas de Brizola e seu movimento pela legalidade.
Pouco antes do golpe de 1964, lembra o professor Emir Sader, em artigo na Agência Carta Maior (http://bit.ly/204XJRN), os “grupos radicais consideravam o golpe praticamente inevitável (devido às “ilusões do reformismo na via pacífica e na existência de uma burguesia nacional e democrática”), o viram como uma confirmação das suas previsões. Mas tampouco defenderam a legalidade existente, não se dando conta no brutal retrocesso para todos – a começar pelos movimentos populares – que o golpe representava”.
Claro que, agora, o cenário não é exatamente o mesmo, mas é muito semelhante.
Entre os críticos à esquerda do governo Dilma — e não há poucos, inclusive entre os que militaram desde o primeiro turno pela sua eleição —, posição historicamente mais responsável tem sido a daqueles que preservam claramente o apontamento dos aspectos que condenam, mas sabem ter a grandeza de marchar junto quando a questão crucial da ameaça do golpe se coloca.
Ser contra todos pode ter o mesmo efeito de ser contra ninguém.
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