Vitor Menezes*
Muitos dos colegas e das colegas jornalistas que atuam em entidades sindicais, no Brasil, devem ter percebido uma tendência, na última década, de identificar qualquer conteúdo produzido pelos seus departamentos ou secretarias como sendo “Da Comunicação”, inclusive matérias jornalísticas, publicadas em portais e demais veículos, como boletins sindicais.
Esta tendência incorpora, de modo irrefletido e aparentemente sem maiores consequências, um entendimento mais amplo e integrado dos processos de comunicação, assimilado da comunicação organizacional, governamental ou empresarial.
É compreensível que assim seja, dada a crescente complexidade da produção de conteúdos para diferentes plataformas, muitas vezes feitos por novas agências que não têm lastro no movimento operário — trazendo a boa contribuição de formas mais arejadas, contemporâneas e competitivas de comunicação, mas com déficit de entendimento profundo acerca do papel histórico dos sindicatos e, particularmente, da comunicação sindical.
Pode ser oportuno, portanto, que se resgate o conceito de “Imprensa Sindical”, para identificar especificamente aqueles conteúdos produzidos e veiculados com linguagem e pretensão jornalística, diferenciando-os de quaisquer outros que podem ser produzidos com linguagem e pretensão de marketing, por exemplo.
Ao assinar uma matéria da Imprensa Sindical como sendo “Da Comunicação Sindical”, renuncia-se ao pertencimento discursivo a uma antiga e ainda necessária tradição da luta operária, que é a de reivindicar e manter um jeito próprio de fazer imprensa — em distinção à imprensa burguesa de viés liberal.
A construção da Imprensa Sindical, descendente das imprensas Anarquistas, Socialistas e Comunistas desde o século XIX, foi essencial para que a classe operária encontrasse uma voz própria, com linguagem jornalística, que conferisse um status de verdade narrativa às suas lutas, ignoradas pela imprensa comercial tradicional.
Na atualidade, quando até mesmo a imprensa hegemônica busca assegurar o seu lugar de credibilidade e legitimidade, desenvolvendo campanhas de marketing que buscam valorizar o “jornalismo profissional” para se diferenciar da algaravia das redes sociais digitais e das fake news, não faz sentido que o movimento sindical abra mão de afirmar, inclusive com orgulho, que mantém uma imprensa sindical.
Muito mais do que mera identificação das matérias, esse resgate exige dos profissionais e dirigentes sindicais a própria retomada da consciência em torno da criação de projetos autônomos e consistentes de imprensa sindical, com veículos e produtos jornalísticos próprios, que disputem a agenda informativa com a imprensa comercial.
Isso não significa negar ou reduzir a utilização de toda a potencialidade de comunicação em todas as suas frentes — o que, ao contrário, é a cada dia mais necessário —, mas garantir um dos elementos essenciais desse guarda-chuva maior da comunicação, que é a imprensa sindical. Por mais jornalistas sindicais, por mais imprensa sindical e por mais informação jornalística para a população produzida sob o ponto de vista dos trabalhadores e das trabalhadoras.
* Jornalista há 27 anos do Departamento de Comunicação do Sindicato dos Petroleiros do Norte Fluminense (Sindipetro-NF). Professor no Curso de Jornalismo do Centro Universitário Fluminense (Uniflu). Doutor em Cognição e Linguagem pela Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro (Uenf). Autor de “Os jornalistas heróis no cinema” (E-papers).