Painel unificou temas das duas mesas que estavam previstas para o segundo dia da plenária: Geopolítica e Nova Ordem Mundial e Indústria Nacional e Transição Energética Justa
[Por Davi Macedo, Juce Lopes e Thiago Freire, da comunicação dos Sindipetros PR/SC e BA]
Os debates da 12ª Plenária Nacional da FUP ficaram ainda mais intensos nesta terça-feira (05), segundo dia do evento, com a realização da mesa temática que abordou os temas de geopolítica internacional e transição energética.
Participaram como palestrantes Graciela Rodriguez, do Instituto Equit (Gênero, Economia e Cidadania Global) e da Rebrip (Rede Brasileira Pela Integração dos Povos); José Sérgio Gabrielli, professor titular aposentado da UFBA e pesquisador do INEEP, e Lala Peñarada, coordenadora da TUED (Trade Unions for Energy Democracy) na América Latina.
“Os Brics são uma alternativa contra-hegemônica aos EUA”
Durante sua palestra na atividade promovida pela FUP, a pesquisadora Graciela Rodriguez, do Instituto Equit (Gênero, Economia e Cidadania Global) e da Rebrip (Rede Brasileira Pela Integração dos Povos), traçou uma análise crítica da conjuntura internacional, destacando os impactos da crise estrutural do capitalismo, o papel das grandes potências e a importância da articulação dos países do Sul Global. “Estamos em um momento político internacional e nacional muito complexo. A crise do capitalismo está se aprofundando. Esse modelo econômico vem gerando crises cada vez mais curtas, profundas e que se repetem rapidamente”, afirmou.
A pesquisadora explicou que a situação mundial mudou significativamente desde as crises anteriores do capitalismo. “Após a Segunda Guerra Mundial, os países do Sul Global passaram a se mobilizar, a se reconhecer mutuamente e a identificar problemas comuns, especialmente o fato de serem majoritariamente exportadores de produtos primários. Essa condição nos impôs um modelo de capitalismo de sacrifício”.
Graciela enfatizou que o processo de desindustrialização dos Estados Unidos agravou sua crise interna. “Hoje, os EUA tentam se recuperar via taxação e domínio das tecnologias – já que as big techs têm a capacidade de criar uma renda de monopólio, mas o motivo da crise não é só o déficit comercial, é sobretudo essa situação de desindustrialização, com a realocação de suas empresas para outros países. O que Trump está fazendo é aumentar as taxas para outros países com o objetivo de encarecer as importações e recuperar a sua produção interna”. Ainda segundo a pesquisadora, outro ponto de destaque é o esforço dos EUA em manter o dólar como moeda universal, o que é fundamental para manterem a sua hegemonia.
De acordo com ela, apesar das contradições internas entre seus membros, os BRICS têm se consolidado como uma alternativa contra-hegemônica frente ao domínio dos Estados Unidos. No entanto, destaca que, no caso brasileiro, os entraves ao desenvolvimento passam também pelo poder concentrado do setor agrário e do sistema financeiro rentista, elites que controlam a terra, a exportação e as políticas econômicas. Para a pesquisadora, é fundamental conhecer melhor o modelo chinês, que enfrentou seus setores rentistas e apostou no fortalecimento das empresas estatais como motor de desenvolvimento e investimento em infraestrutura.
Graciela defendeu que a categoria petroleira tem papel estratégico na articulação internacional, especialmente pelo protagonismo das estatais, como ocorre em países como China, Rússia e Índia. Ela também alertou para os desafios impostos pelas big techs, que atuam não apenas no controle social, mas também na manipulação da subjetividade das pessoas. “Estamos diante de um inimigo poderoso”, afirmou, defendendo a necessidade de construir formas inovadoras de luta, como paralisações e greves transnacionais, para enfrentar as crises climática, social e econômica que atravessam o mundo.
“A Petrobrás não está se preparando para daqui a 10 anos, ela está pensando em 10 meses”
O economista do INEEP e ex-presidente da Petrobrás, José Sérgio Gabrielli, analisou o futuro do setor de óleo e gás no Brasil, destacando como a Petrobrás está se preparando para a transição energética que se aproxima. “A posição do Brasil é absurdamente relevante no mercado mundial de petróleo”, definiu, apontando no entanto para um plano pouco sólido no longo prazo, que deve exigir uma maior diversidade de matrizes energéticas.
Gabrielli explicou como a produção de biocombustíveis baseados em biomassa possui um limite de seu uso sustentável como fonte de energia, já que sua produção em larga escala exige grandes extensões de terra. O hidrogênio, apontado pelo economista como o futuro dos combustíveis limpos, não está nos planos da Petrobrás. “O que de fato vai substituir os combustíveis fósseis é o hidrogênio. E qual é a posição da Petrobrás em relação a isso? Nada está sendo feito”, critica o ex-presidente da companhia.
Ele também traçou um histórico da produção de petróleo no Brasil, destacando a mudança radical ocorrida por volta de 2007, quando a exploração do pré-sal alçou o país ao rol de principais exportadores mundiais da commodity, ocupando hoje a terceira posição. “Mudou o papel do petróleo na economia brasileira, ele hoje é o principal produto da balança comercial tanto em exportações quanto em importações”, ressaltando porém o risco em ser um país exportador de petróleo cru e importador de derivados. “Nossa capacidade de refino não vai aumentar no médio prazo”, disse, em contraponto ao aumento da produção de petróleo prevista com a exploração da Margem Equatorial.
O ex-presidente da Petrobrás chamou atenção da categoria petroleira para o conflito que vem escalando entre os setores de energia e do agronegócio, que se encontram na cadeia produtiva de biomassa e na produção de fertilizantes a partir do gás natural. “A política energética brasileira não pode ficar sob controle do agronegócio”, defendeu, apontando para os desafios na construção do próximo ACT dos petroleiros e das petroleiras. “O acordo coletivo dos próximos três anos vai existir em um período de transição muito importante no setor de óleo e gás”, preconiza.
“Quanto mais forte está a luta dos povos, mais fortes estão os nossos sindicatos”
O painel foi encerrado com a apresentação de Lala Peñarada, pesquisadora e coordenadora da TUED (Trade Unions for Energy Democracy) na América Latina, que compartilhou sua perspectiva sobre a geopolítica internacional e os impactos das relações de poder nas lutas socioambientais e de classe.
Em sua exposição, a pesquisadora apresentou a trajetória da União Sindical Operária (USO), criada em 1945 para representar os trabalhadores da indústria de gás natural e petróleo na Colômbia, destacando suas principais estratégias para uma transição energética justa. Lala ressaltou como a USO se consolidou como um dos sindicatos mais combativos do país, mesmo em um contexto em que a Colômbia lidera o ranking mundial de assassinatos de sindicalistas. Atualmente, a entidade está conectada a uma ampla rede internacional, com presença em 40 países e mais de 130 sindicatos, todos em defesa da energia como bem público e direito popular.
Lala também apresentou o plano estratégico da USO, elaborado pelos próprios trabalhadores, que propõe uma transição energética justa e soberana. O plano inclui o fortalecimento dos direitos trabalhistas, a diversificação da matriz produtiva para além do setor de hidrocarbonetos, a industrialização ecológica e o uso da contratação pública como instrumento de desenvolvimento nacional. A proposta visa transformar a Ecopetrol, estatal colombiana de petróleo e gás, em uma empresa de energia voltada à descarbonização do setor elétrico, com a criação de uma nova estatal de energias renováveis. “Temos uma visão radical, porque os recursos naturais da Colômbia são do povo colombiano”, afirmou.
A pesquisadora encerrou sua fala com uma reflexão sobre a desmercantilização da energia e ressaltou a importância das estatais energéticas para o desenvolvimento socioeconômico dos países. “Estamos reduzindo a pobreza energética no Brasil? Estamos servindo à população? Está sendo criada eficiência energética de conservação? Estamos reduzindo as desigualdades? Se não estamos cumprindo isso, para que serve uma Petrobrás 100% estatal?”, indagou.
As informações apresentadas pelos oradores serviram para qualificar ainda mais o debate entre os cerca de 280 petroleiros e petroleiras presentes na plenária, que terão na quarta-feira, 06, a última mesa temática e, em seguida, se dividem em grupos de trabalho para elaborarem propostas para um Acordo Coletivo de Trabalho forte e uma transição energética justa.
Veja a íntegra do painel: