João Antonio de Moraes e José Maria Rangel falam sobre a insegurança na indústria do petróleo

Mesmo com todas as denúncias da FUP e de seus sindicatos sobre a insegurança no Sistema Petrobrás, a precarização das condições de trabalho continua fazendo vítimas na empresa. No último dia 04, mais um trabalhador terceirizado perdeu a vida em um acidente durante as obras de construção da Refinaria Abreu e Lima, no Complexo Industrial de Suape, em Pernambuco. Este é o quarto acidente fatal este ano na Petrobrás, dos quais três foram com trabalhadores terceirizados. Desde 1995, ocorreram 284 mortes por acidentes de trabalho na empresa, sendo que 229 com prestadores de serviço. Nas plataformas, a insegurança é constante, principalmente, em conseqüência das condições precárias de manutenção, que expõem constantemente seus trabalhadores a riscos. A P-33 chegou a ser interditada e outras plataformas da Bacia de Campos estão sendo autuadas pelos órgãos fiscalizadores do governo. Nesta entrevista, o coordenador geral da Federação Única dos Petroleiros (FUP), João Antônio de Moraes, e o coordenador do Sindicato dos Petroleiros do Norte Fluminense, José Maria Rangel, falam sobre a resistência da Petrobrás e das empresas privadas do setor em atenderem as reivindicações dos trabalhadores sobre saúde e segurança.

As denúncias da FUP e do Sindipetro-NF sobre a insegurança nas plataformas da Bacia de Campos e os riscos cada vez maiores de um grande acidente na região tiveram respaldo dos órgãos fiscalizadores. Já os gestores da Petrobrás continuaram inertes em relação às denúncias e cobranças dos trabalhadores. Por que há tanta resistência da empresa em rever e alterar suas práticas de SMS?
Porque para os gestores da Petrobrás o que mais interessa é produzir sem se importar com vidas, mutilações e adoecimentos. Para mudarmos a gestão de SMS na Petrobrás, tem que haver vontade política da empresa para colocar em prática as diretrizes de saúde e segurança, os itens do ACT que tratam do tema, desburocratizar as CIPAs, fazendo com que ela deixe de ser apenas o cumprimento da NR-5 e do anexo II da NR-30, acabar com as subnotificações de acidentes e, acima de tudo, pensar no ser humano. Passados sete anos de gestões da Petrobrás sob o governo Lula, infelizmente o movimento sindical não conseguiu fazer mudanças estruturantes na área de SMS da empresa. Tanto é verdade que os acidentes continuam a acontecer em grandes números e as unidades da Petrobrás, sobretudo as plataformas, estão em situação de penúria. Isto é fruto de uma gestão equivocada e autoritária.
 
Em junho deste ano, a FUP reuniu-se com órgãos fiscalizadores do governo e cobrou maior atuação em relação às condições de trabalho e segurança nas unidades da Petrobrás. Logo em seguida, após denúncias do Sindipetro-NF e da FUP sobre as condições precárias das plataformas da Bacia de Campos, a agência do governo interditou a P-33. Foi a primeira vez que uma plataforma foi interditada por questões de segurança. Essa decisão abre uma nova frente de luta para os trabalhadores?
Uma vez o presidente Lula disse que a Petrobrás não é maior do que o Brasil. No entanto, muitos gerentes da empresa agem como tal, chegando ao ponto de ridicularizar os órgãos de fiscalização do governo. A ação da DRT, da ANP e da Marinha, que interditou a P-33, baseada em denúncias dos trabalhadores, dá certeza a todos nós de que podemos mudar a realidade de insegurança na Petrobrás e nas empresas do setor petróleo. A interdição da P-33 diz claramente que as condições da plataforma colocam em risco a vida dos trabalhadores. Quando o gerente geral da Petrobrás na Bacia de Campos e a juíza da 2ª Vara do Trabalho afirmaram de maneira irresponsável que a plataforma estava segura para operar, imediatamente 110 trabalhadores, próprios e terceirizados, os desautorizaram. Foi a primeira assembléia realizada em plataforma da Bacia de Campos onde os trabalhadores terceirizados disseram não à insegurança. Foi um dia histórico! O que a Petrobrás fez ao recorrer ao judiciário para contestar a decisão da fiscalização marítima e portuária é um mau exemplo, tanto para os petroleiros, quanto para a sociedade, que sempre enxergaram na Petrobrás um motivo de orgulho nacional e o exemplo do Brasil que dá certo.
 
As reivindicações da FUP em relação à saúde e segurança dos petroleiros não se restringem à Petrobrás e sim a todas as empresas do setor petróleo. Essa é uma questão que ganhou um impacto ainda maior após o acidente com a plataforma da BP no Golfo do México, que resultou na morte de 11 trabalhadores e no maior acidente ambiental de todos os tempos, provocado por uma petrolífera. Como as empresas privadas de petróleo no Brasil tratam o SMS?
Elas fazem pior do que a Petrobrás, pois aprofundam a precarização das condições de trabalho e a insegurança e, para piorar, os trabalhadores destas empresas não têm um sindicato forte para lutar e conscientizá-los da importância do trabalho seguro. A OGX, do empresário Eike Batista, nem começou a produzir petróleo e já causou a morte de dois trabalhadores em um acidente ocorrido este ano durante um teste com uma baleeira. Uma situação rotineira em uma plataforma e que há décadas não temos ocorrências no Brasil de acidentes envolvendo baleeiras. A Shell, que é a segunda maior operadora de petróleo do país, até hoje não reconhece a FUP e seus sindicatos como representantes legítimos dos trabalhadores que atuam na indústria de petróleo. Só após muita ação política da Federação, conseguimos uma reunião com a empresa para discutir a situação dos trabalhadores. Para isso, foi preciso que a comissão de fábrica da sede da Shell na Holanda agisse a nosso favor, junto com o Sindicato dos Petroleiros da Noruega. Só após essa pressão internacional, a FUP teve acesso a uma reunião com a petrolífera, que se comprometeu a realizar um seminário conjunto com as empresas terceirizadas que operam suas plataformas no Brasil para nos apresentar seus projetos e políticas de SMS.
 
O pré-sal deve envolver um milhão de trabalhadores em toda a sua cadeia de exploração e produção. Tomando como base a realidade atual do setor, quais são as perspectivas em relação às condições de trabalho e segurança nas plataformas do pré-sal?
A FUP e os sindicatos filiados fazem um trabalho de resistência muito grande para representar os trabalhadores terceirizados e, em muitos casos, mesmo não conseguindo representá-los, lutamos por eles ao negociarmos o Acordo Coletivo do Sistema Petrobrás e sempre que discutimos com a empresa condições de trabalho e segurança. Em 90 % dos acidentes ocorridos hoje na Petrobrás, as vitimas são trabalhadores terceirizados. Por isso, exigimos direitos iguais para trabalhos iguais e vamos continuar lutar para isso. Precisamos ampliar os debates com a Petrobrás sobre o pré-sal, principalmente no que diz respeito às condições de trabalho e segurança. Cabe ressaltar que no Mar do Norte, no lado norueguês, as empresas de petróleo atuam em conjunto com os sindicatos na aérea de saúde e segurança e o resultado é uma morte a cada dois anos. Eles estão há cinco anos sem registros de acidentes fatais. Já no lado do Mar do Norte explorado pela Grã-Bretanha, os sindicatos não são ouvidos pelas empresas do setor e o resultado são seis mortes, em média, por acidentes de trabalho a cada ano. Qualquer semelhança com o que acontece hoje no Brasil não é mera coincidência.