Do Portal Vermelho
A saída para recessão no país passa pelo Estado. A afirmativa é do economista Marcio Pochmann, professor da Unicamp e presidente da Fundação Perseu Abramo, que esteve nesta terça-feira (5) em Natal (RN) participando da 3ª edição do projeto Na Trilha da Democracia. Uma realização do Adurn-Sindicato, Sindipetro-RN e Frente Brasil Popular.
Com o auditório da reitoria da Universidade Federal do Rio Grande do Norte absolutamente lotado, o economista desconstruiu o argumento da oposição de diminuir consideravelmente o tamanho do Estado a partir da centralidade do gasto público.
Saída para recessão
Para Pochmann, a solução está na reorganização das políticas públicas buscando fazer valer plenamente a Constituição Federal de 1988, especialmente no que toca incluir todos os brasileiros nas oportunidades geradas pela economia nacional desde o início dos anos 2000 e que “se revelou fundamental para abrir um inédito caminho para tornar o país menos desigual”.
Sem minimizar o problema da corrupção no país, Pochmann apontou a desigualdade e a recessão como os maiores entraves para a retomada do crescimento econômico no Brasil.
Ao falar sobre o impacto da crise enfrentada pela Petrobras na economia brasileira, Pochmann aponta para a necessidade de se separar os crimes cometidos por dirigentes de empresas de suas atividades. “Se você entender que o problema da corrupção é das empresas e não de seus dirigentes pode, na verdade, liquidar uma parte significativa da engenharia nacional”, acredita.
O ex-presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) afirmou que a única saída para crise econômica é a adoção de “medidas antidepressão ousadas” por parte do governo, e defendeu aumentar os gastos e os investimentos públicos, para tentar estimular a atividade econômica e reverter as expectativas dos agentes econômicos.
Só o Estado, diz Pochmann, “tem capacidade de gasto autônomo”. Em outras palavras, o setor público consegue funcionar planejadamente tendo prejuízo por um tempo, ao contrário das famílias e das empresas. A transformação do deficit público em superavit pode ficar para adiante, quando a economia tiver se normalizado.
“Não estamos num estado normal do capitalismo”, diz Pochmann, ao ver semelhanças com a maior depressão mundial já conhecida, a dos anos 1930 – superada, aliás, com um plano de investimento público adotado nos EUA, o epicentro da depressão. “Nos EUA hoje, o pré-candidato a presidente que é socialista cresceu nas pesquisas fazendo críticas ao sistema financeiro e capitalista.”
Limites do “Estado privatizado”
Ao afirmar que não há saída para o Brasil fora da democracia, o economista defendeu a ampliação da capacidade de produção interna no país. Para Pochmann, não é possível encontrar soluções para a crise enquanto se estiver preso ao problema do ajuste fiscal. “Temos que pensar nos setores que chegam. Para onde vão os jovens que estão chegando agora, o que nós estamos propondo? Quais as novas reformas que vamos fazer? E este é um problema que temos, porque nunca tivemos maioria para fazermos tais reformas”.
Para Pochmann, os limites impostos por um “Estado privatizado” são claros. Uma herança, segundo o economista, do regime militar. “Saímos da Ditadura sem fazer nenhuma reforma”, afirmou.
Frente ao esgotamento das políticas anticíclicas, o economista defende que o país precisa pensar em reformas estruturais, mas que essas esbarram nos ricos e no Congresso dominado pelo capital.
“Os que mandam no país não aceitam pagar mais impostos”, disse, destacando que o esgotamento de políticas anticíclicas, como as desonerações da indústria para motivar o consumo, exige que o país adote reformas mais profundas para continuar combatendo a pobreza.
Para Pochmann, é o modelo do sistema tributário que aprofunda a desigualdade no país. “A economia mundial continua extremamente frágil e o Brasil foi resistindo por mais tempo possível nessa tentativa das políticas anticíclicas. Só que isso acabou levando a uma incapacidade de o país continuar nesse rumo sem que fizesse reformas mais profundas, como é o caso de angariar recursos para o Estado através de uma reforma tributária que onerasse mais os ricos, os poderosos”, afirmou.
O economista avalia que o mundo inteiro enfrenta agora um quadro de crise, com países de grande peso na economia mundial crescendo bem menos do que cresciam, o que impõe maiores dificuldades. Uma saída pelos países ricos, então, parece improvável. A solução poderia vir de outros como o Brasil, por intermédio de medidas adotadas no âmbito do BRICS, por exemplo. “A criação desse banco e do fundo de reserva revela o fato mais importante ocorrido, ao meu modo de ver, desde o acordo de Bretton Woods de 1944. Mas ainda é um processo lento.”
Nova agenda
Pochmann falou ainda sobre o problema do crescimento do sentimento e ações de intolerância e da inabilidade do diálogo no país, e atribuiu esse comportamento de uma parcela significativa da população à mudança demográfica e de estrutura da sociedade brasileira.
Para o professor, diante da necessidade em se reconstruir a sociabilidade no espaço da educação e do esgotamento do capitalismo industrial, é necessário se pensar uma agenda nova.
O economista e professor vê um mundo a ser descoberto, mas que tem sido comprometido por uma pauta que nos leva a ser prisioneiro do passado.
Como professor, Pochmann ressaltou o papel nas Universidades em construir uma agenda nova, da convergência, da coesão na sociedade e não da coação, apenas da Lei. “Esse é o nosso papel, que nos anima e nos faz tirar do medo de assumirmos tarefas que são absolutamente fundamentais e que ninguém fará por nós”, enfatizou.
O palestrante finalizou sua exposição ressaltando o papel do debate. “Eventos como este, nos ajudam a pensar no novo, abandonarmos o medo e construirmos um Brasil diferente”, encerrou.
Ao final, Pochmann respondeu a perguntas feitas por estudantes, professores, juristas, trabalhadores petroleiros e de outras categorias profissionais, parlamentares e lideranças dos movimentos sociais e sindicais.