Nascente 1109

EDITORIAL

Vamos construir a virada

Estamos todos os que ainda conservamos o mínimo de dignidade, de senso humanitário e de recusa à barbárie, indignados com o assassinato da menina Ágatha, no Complexo do Alemão, no último final de semana, nas circunstâncias que seguramente o leitor e a leitura conhecem.

Não se trata aqui, portanto, de discutir o caso especifico de mais uma criança que acabamos de perder. Ele é por demais evidente em sua crueza e brutalidade. E por mais que seja ensaiada uma cambaleante retórica contra usuários de drogas ou quaisquer outros inimigos imaginários, também está evidente quem é o verdadeiro responsável: o patético governador Wilson Witzel (na verdade, antes fosse apenas patético e não monstruoso como realmente o é).

A questão é ainda mais ampla, e diz respeito ao modo como este caso se conecta a uma realidade bem maior. Trata-se da política de coisificação dos pobres, de ódio aos trabalhadores, que tenta gerar uma indiferença da população em relação a casos como o da menina Ágatha e, não se engane, também em relação aos próprios policiais mortos nesta guerra insana. Faz parte de um ambiente de anestesiamento que sustenta os regimes autoritários caros a neofascistas como Witzel e Bolsonaro. É a busca por tornar banal o mal.

A lógica que manda a polícia atirar a esmo (desde que em bairros pobres) é a mesma que manda cortar direitos (desde que sejam os dos trabalhadores). Não adianta mostrar credenciais de busca por atividades socialmente aceitas, como “fazer balé e inglês” — no brado desesperado do avô de Ágatha. Assim como não adianta mostrar a carteira de trabalhador — essa que, a propósito, querem eliminar. Esse regime não se importa com você.

Ou tomamos consciência de que só temos a nós mesmos e que não somos poucos, que precisamos estar do lado de todos os que resistem e lutam contra estes governos dos banqueiros e das elites rentistas — para os quais sabujos como Witzel e Bolsonaro não se importam em servir de força auxiliar, seja por meio do uso oficial de militares ou seja por meio do uso extra-oficial de milicianos —, ou amargaremos ainda muitas décadas de submissão e as perdas de muitas Ágathas.

A história mostra que é nos momentos mais opressivos que nascem os mais importantes movimentos de virada. É uma tendência dialética, no entanto, que não é ocorre naturalmente. É construção social, e estamos a serviço dela.

 

ESPAÇO ABERTO

Quem era você em 2019?

Vitor Menezes*

Pertenço a uma geração que balizava integrantes da sua imediatamente anterior pelo seguinte parâmetro: quem era você na Ditadura Civil-militar de 1964? Era o que fazia de conta que o país estava normal porque “era cidadão de bem e não tinha nada a temer”? Era o empresário que ajudava o regime delatando trabalhadores subversivos? Era um artista que nem por um momento se importou com a censura aos colegas? Era um trabalhador que safou-se de forma subserviente e pusilânime por meio da adulação ao patrão amigo da ditadura? Era um militar que cumpria com gozo e sadismo as ordens de torturar e matar? Era o estudante que passava informações ao serviço secreto do Exército? Ou havia resistido à sua maneira, ainda que de forma modesta e privada, a todo aquele horror em que o Brasil fora mergulhado?

É verdade que as contingências humanas são complexas e pouco afeitas a reducionismos. O julgamento de indivíduos sem a devida contextualização e sem levar em conta a sua história, formação, influências, é antessala da injustiça. Somos essencialmente seres coletivos e temos, individualmente, bem menos autonomia do que imaginamos. Não fosse assim, seria impossível pensar em ressocialização, em perdão, em aposta na educação e na civilização.

Mas isso não elimina o fato de que somos cobrados individualmente por nossas escolhas, mesmo que elas estejam submetidas a fatores que não conhecemos com clareza ou sobre os quais não temos domínio. Há um nível de responsabilização individual do qual não podemos escapar. E parece nítido que, em futuro bem próximo, uma nova geração perguntará: quem era você no governo Bolsonaro?

Era o isentão que achava que aquele horror fazia parte da democracia? Era um bolsominion militante? Era o liberal que tolerou os pesares e a grosseria por causa da agenda promissora do Paulo Guedes? Era o trabalhador que achou que não perderia o emprego porque não era comunista? Ou foi alguém que não se dobrou à infâmia daqueles dias?

O que você vai responder aos seus netos?

* Jornalista do Departamento de Comunicação do Sindipetro-NF.

 

GERAL

Pela continuidade da negociação

A assessoria jurídica da FUP protocolou ontem junto ao TST o pedido de continuidade das negociações — mediada pelo tribunal ou diretamente com a Petrobrás —, a solicitação da íntegra da proposta feita pelo TST e ponderações acerca do processo negocial e de alguns dos pontos apresentados como proposta pelo ministro mediador, como, por exemplo, os que envolvem o pagamento de horas extras, o custeio da AMS, a promoção por antiguidade, o turno de terra de 12 horas e a vigência do acordo coletivo — que os sindicatos reivindicam que seja mantido em dois anos. A Federação explica a complexidade das negociações e lembra que, durante o processo de mediação, não houve a realização de uma mesa em que as duas partes estivessem presentes — sindicatos e Petrobrás foram ouvidos unilateralmente pelo tribunal.

Os pontos destacados no documento protocolado pela FUP buscam avanços em relação à proposta de Acordo Coletivo de Trabalho à formulada pelo tribunal, apresentada no último dia 19 pelo vice-presidente do órgão, Renado de Lacerda Paiva. Os sindicalistas aguardam, no entanto, que uma minuta da proposta do TST seja entregue aos representantes dos trabalhadores, para que só então o documento possa ser submetido a assembleias, como é tradição na categoria petroleira.

“Estamos solicitando do TST a minuta com a proposta de Acordo Coletivo feita pelo TST. O que o tribunal apresentou no último dia 19 foram apenas alguns pontos de proposta, mas nossa experiência mostra que é preciso se posicionar a partir de uma proposta completa. Do jeito que está, não temos como encaminhar para avaliação da categoria em assembleias”, explica o diretor do Sindipetro-NF, Rafael Crespo.
Outra preocupação dos sindicalistas é a de que o documento apresentado pelo tribunal como proposta de ACT não é válido para as subsidiárias da companhia. Esse é um aspecto que precisa ser corrigido para que as negociações possam avançar. A expectativa dos sindicalistas é o acordo tenha validade para todo o sistema Petrobrás, como tem ocorrido.

Após a apresentação da proposta de ACT feita pelo TST, a FUP reuniu o seu Conselho Deliberativo nesta semana, na terça, 24. No dia seguinte, FUP e FNP se reuniram para avaliar a proposta.

Ano no dia 3 de outubro

Para o próximo dia 3, aniversário da Petrobrás, está prevista a realização de grande ato nacional em Curitiba, contra o desmonte da companhia, reunindo militantes de sindicatos e movimentos sociais de todo o país.

 

Desemprego nos campos vendidos

Uma das promessas dos defensores da venda de unidades da Petrobrás para outras empresas petrolíferas é a de que serão gerados mais empregos com a “dinamização do mercado”. A realidade é outra: petroleiros que atuam na Bacia de Campos têm enviado relatos ao Sindipetro-NF sobre uma redução drástica no número de postos de trabalho nas plataformas que foram vendidas pela companhia recentemente.

Sete plataformas que integram os campos de Vermelho, Carapeba e Pargo contam atualmente com cerca de 700 trabalhadores (aproximadamente 170 empregados da Petrobrás e 530 empregados de empresas terceirizadas).

Informações não oficiais obtidas pelos trabalhadores dão conta de que a Perenco, empresa privada franco-britânica que comprou as plataformas dos três campos, pretende operar as unidades com 160 empregados (22,8% do contingente atual). Algumas plataformas ficariam até desabitadas.

Mesmo afirmando em seu site operar em 14 países, a Perenco diz ter “mais de 6000 funcionários que operam em terra e no mar”. Nas Américas, além de estar chegando no Brasil, a empresa atua na Colômbia, na Guatemala, no Peru, em Trinidad e Tobago e na Venezuela.
Somente na Bacia de Campos, a Petrobrás conta com cerca de 10 mil trabalhadores próprios (9.660 em dado do Dieese de 2018) e aproximadamente 18 mil terceirizados (17.678 também segundo Dieese em 2018).

Para o Sindipetro-NF, todo o histórico de atuação de empresas privadas ou estatais estrangeiras no setor petróleo no Brasil é de enxugamento no número de empregos, redução de salários e condições restritivas de contratação, gerando impacto negativo no mercado de trabalho e nas economias regionais.

Realocações improvisadas

O Sindipetro-NF apura denúncias de que os petroleiros das plataformas vendidas em Carapeba, Vermelho e Pargo não estão tendo acesso a processos de transferência transparentes e impessoais como prevê o Acordo Coletivo. A Petrobrás está realocando trabalhadores aleatoriamente, não garantindo condições semelhantes e sem considerar impactos profissionais e pessoais. A categoria pode enviar relatos sobre os seus processos de realocação de unidade para o e-mail [email protected].

 

P-50 tem problema na ancoragem

O Sindipetro-NF recebeu de trabalhadores a informação de que, desde a noite do domingo, 22, a plataforma P-50, na Bacia de Campos, estrou em processo de parada de produção em razão do rompimento de amarras de ancoragem. Das cinco amarras que ancoram o navio na proa à bombordo (na frente à esquerda da embarcação), três se romperam. Foi acionado o estado de alerta.

O navio vinha com deficiência na ancoragem há alguns dias, com duas amarras rompidas. No domingo, por volta das 23h20, a terceira amarra se rompeu. Em condições normais, a plataforma é mantida com cinco amarras proa bombordo, cinco amarras de proa boreste (na frente à direita), cinco amarras de popa bombordo (atrás à esquerda) e cinco amarras popa boreste (atrás à direita).

“Como já estávamos com a deficiência na ancoragem, no momento do rompimento da terceira amarra estávamos com um barco tracionando a proa da plataforma com 15 toneladas de tensão, agora esse mesmo barco está aplicando uma tensão de 100 toneladas, o que manteve nosso passeio (afastamento) em 40 metros, já foi acionado um segundo barco para maior força no tracionamento. Estamos em processo de parada de produção, com cuidados para não danificar os poços”, relataram os trabalhadores ao sindicato.

O sindicato cobrou informações da Petrobrás sobre a operação da plataforma e as medidas de proteção à segurança dos petroleiros. A entidade também apura ocorrência semelhante na plataforma P-25.

 

Petrobrás demite sindicalista

Das Imprensas do BA e do NF

Em mais uma atitude antissin-dical, a direção bolsonarista da Petrobrás demitiu por justa causa o diretor do Sindipetro Bahia, Luiz Henrique Galvão Lima. O sindicato anunciou que vai tomar todas as medidas judiciais cabíveis na busca do cancelamento desse processo de demissão, feito sem motivação e com o claro propósito de intimidar e perseguir os representantes sindicais.

“Não vamos tolerar que a direção da Petrobras continue agindo dessa forma, pressionando e assediando os trabalhadores e tentando interferir na liberdade, organização e autonomia sindical”, protestou a entidade.

Na semana passada, o Nascente noticiou que a Petrobrás, pela primeira vez em sua história, está processando cidadãos, individualmente, por terem exercido o direito de petição. Uma das vítimas do ataque jurídico desproporcional da empresa é o coordenador geral do Sindipetro-NF, Tezeu Bezerra, junto a outros sindicalistas ligados à Federação Única dos Petroleiros.

 

Plataforma fica 12 horas sem banheiro

Os trabalhadores de P-20 ficaram na segunda, 23, mais de 12 horas sem poder utilizar o banheiro da unidade. O sistema de descarga a vácuo, que atende a todos os sanitários da plataforma, parou de funcionar.

O Sindipetro-NF recebeu essa denúncia dos trabalhadores pela manhã do dia 23 e até às 22 h, quando foi feito o último contato com a unidade, o problema persistia. Segundo o diretor do Departamento de Saúde, Alexandre Vieira, a empresa só deu retorno sobre o caso no dia seguinte, informando que o sistema havia sido normalizado.

Alexandre explica que sem o sistema a vácuo funcionando a pessoa não consegue utilizar o vaso para nada, nem urinar é possível. Já que nada sai do sanitário sem o vácuo. Em dezembro de 2012, o sindicato denunciou fato parecido, sendo que daquela vez os trabalhadores ficaram 10 dias com o sistema comprometido e trabalhadores tiveram que desembarcar.

Essa situação fere o anexo 2 da NR-30 e a NR-24 que trata especificamente das Condições Sanitárias e de Conforto nos locais de Trabalho.
A diretoria do Sindipetro-NF irá encaminhar ofício à Petrobras cobrando um plano, para que seja criado um sistema de emergência para estas situações. “Isso é um caso afeta a saúde, higiene e o bem estar do trabalhador. Por consequência afeta a segurança devido a condições físicas e emocionais da pessoas. O que aumenta o risco de acidentes”, alerta Vieira.

 

CURTAS

Fórum sobre Spie

O NF promove na segunda, 30, Fórum de Inspeção para discutir a atuação da entidade na Concer nas auditorias do Spie. O Fórum será integrado por uma sessão às 9h30, no auditório do sindicato em Campos dos Goytacazes, e outra às 18h, no teatro do sindicato em Macaé. Todos os trabalhadores podem participar, especialmente os das áreas de operação e inspeção, mais atingidos pelos desdobramentos das auditorias e pela NR-13. Mais informações por [email protected].

Baker

Os trabalhadores da Baker/Ge realizaram na segunda, 23, assembleia na sede do Sindipetro-NF e aprovaram a proposta de Termo Aditivo do ACT 2018/2020 negociada com a empresa, que reajusta salários e cláusulas econômicas em 4,47% segundo o ICV do Dieese. Também houve reajuste com este mesmo índice nos tíquetes alimentação e refeição, na cesta de natal e no auxílio creche.

Sofrimento duplo

Livro lançado pela Fundacentro mostra casos de violência contra empregados no retorno ao trabalho após licença por adoecimento. Com o título “Violências durante o processo de adoecimento pelo trabalho”, a obra traz exemplos reais, sob pseudônimo, de pessoas que sofreram injustiça, humilhação, vergonha e assédio moral por terem adoecido e exercido o direito de licença. O livro pode ser baixado em pdf gratuitamente em bit.ly/2m1hReG.

Boa do sábado

Artistas e ativistas sociais promovem em Campos dos Goytacazes neste sábado, 28, uma versão local do Festival Lula Livre, a partir das 15h, na Santa Paciência Casa Criativa (Rua Barão de Miracema, 81- Centro). Haverá exibição de filme, apresentação teatral, debate e microfone aberto. A casa tem se destacado por uma intensa programação cultural. Mais informações na página do evento: bit.ly/2mG2KYm.

PLANTÃO SINDICAL Diretor Antônio Carlos Pereira, o Bahia, e a diretora Conceição de Maria durante Plantão Sindical no Edinc nesta semana. Os plantões acontecem nas segundas (Parque de Tubos), terças (Edinc), quartas (Praia Campista) e sextas (em uma das empresas privadas). Nesta sexta, excepcionalmente, não haverá plantão em razão de reunião da Diretoria Colegiada do NF.

 

NORMANDO

Ideologia da mentira

Ana Maria Rosinha*

Ideologia é sinônimo de ideário, conjunto de ideias e pensamentos, visões de mundo. No senso comum, entretanto, ideologia tem a conotação de instrumento de dominação que age por meio de manipulação, alienando a consciência. Ideologia não é apenas de esquerda. E ocultar isso serve à manipulação ideológica.

O “Mais Médicos” serviu-se de médicos cubanos com formação superior naquele país, conforme estabelecido pela Lei 12.871/2013, estando, assim, regularmente habilitados para o exercício profissional em território nacional, ao contrário do afirmado pelo Idiota-mor em seu pífio discurso na ONU. Esses médicos levaram assistência médica a locais distantes onde a população, muitas vezes, nunca tinha tido acesso a ela.

Já a disparada dos incêndios na Amazônia decorreu da notória precarização dos sistemas de fiscalização engendrada pelo atual Governo, somada à “autorização” tácita dada pelo Ministério do Meio Ambiente e pelo próprio “capitão moto-serra” que, em seus discursos, avalizaram o ataque às nossas matas, o que acelerou a diminuição da área preservada em nosso país, numa velocidade nunca vista.

O respeito aos povos indígenas afirmado no falacioso discurso na ONU é demonstrado de forma muito peculiar. Nos nove primeiros meses de 2019, 153 áreas indígenas foram invadidas em 19 estados da federação, segundo o Conselho Indigenista Missionário – Cimi/CNBB. Invasões impulsionadas pelo discurso das autoridades contra as demarcações de terras indígenas. Índio é ser humano sim, e merece o direito à sua própria cultura e sobrevivência.

Como se não bastasse, houve a estultice de afirmar a existência do Foro de São Paulo, cujo objetivo, segundo Idiota-mor, é “implantar o socialismo” na América Latina. Mais uma leviandade para agradar seu eleitorado, aquele mesmo que o denomina “mito”. E que tende a acreditar em “terroristas” no território nacional, destinados a atacar os bons valores da família cristã brasileira. Será que são esses os terroristas que atacam os centros de umbanda e candomblé? Ou que distribuem tiros nas comunidades do Rio de Janeiro, matando crianças inocentes?

É essa a ideologia da mentira que ataca a democracia brasileira, proibindo atos em universidades, retirando verbas da cultura e atacando de forma virulenta os direitos humanos, especialmente das minorias. Um desserviço à Nação Brasileira, que exibiu oficialmente, à comunidade internacional, os dentes de seu fascismo.

* Advogada no escritório Normando Rodrigues.
[email protected]