EDITORIAL
Luta não se delega
Depois de termos uma ministra da Mulher que é machista, um ministro do Meio Ambiente que é amigo do agronegócio e um ministro da Educação que odeia as universidades públicas, entre tantas excrescências vindas do Poder Executivo, essa semana tivemos uma contribuição do Judiciário para este cenário brasileiro nonsense: passamos a ter uma presidente do TST (Tribunal Superior do Trabalho), Maria Cristina Peduzzi, que considera ainda “tímidas” as mudanças feitas pela reforma trabalhista.
Em entrevista ao jornal Folha de São Paulo, a recém empossada defendeu, por exemplo, que não faz mais sentido diferenciar domingos de segundas-feiras, e que as regras trabalhistas precisam ser ainda mais “atualizadas”, em razão de uma “Quarta Revolução Industrial”.
Justiça seja feita: o pensamento conservador e patronal não é novo no aparato judicial de modo geral e nem mesmo no TST, de modo específico. A nova presidente não inaugura nada. Ao contrário: ela representa o pensamento majoritário das cortes, sobretudo as superiores — pois, também reconheça-se, em muitos tribunais regionais ainda há muitos juízes que entendem que seu papel é defender o lado mais fraco na relação de produção, que é o trabalhador.
É por essa e por outras que os advogados dos sindicatos, como é o caso de Normando Rodrigues, do Sindipetro-NF e da FUP, vivem a repetir que os instrumentos jurídicos são importantes, mas que só a mobilização conquista.
Tio Marx também havia ensinado: o Judiciário é parte de uma superestrutura montada para defender os interesses da classe hegemônica em um determinado contexto histórico.
Ou seja, precisamos lutar em todas as frentes, penetrar por todas as brechas, estarmos firmes nas batalhas jurídicas, mas jamais descuidar da verdadeira essência da luta dos trabalhadores, que está relacionada à sua consciência de classe, à sua capacidade de organização e ao seu protagonismo político.
Ninguém é mais capaz de nos defender do que nós mesmos. Luta não se delega.
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Boas festas a todos os petroleiros e petroleiras. Que neste fim de 2019 possamos renovar as forças para as muitas lutas que 2020 vai exigir. Juntos somos mais fortes.
ESPAÇO ABERTO
Método Paulo Freire
Vitor Menezes*
Bolsonaro morreu e encontrou Paulo Freire no Inferno. Ainda atordoado com a passagem abrupta — havia levado uma facada de um vizinho de condomínio —, o presidente viu em meio à fumaça a figura do velho grisalho, de barba longa e óculos grandes. Olhou com ar de “não te conheço da internet?”.
— Sim, sou eu mesmo, Paulo Freire — respondeu o pedagogo, antes de ser perguntado.
— Mas que porra é essa? Que merda de lugar é esse?
— É o Inferno, presidente. O senhor acaba de morrer e eu fui escolhido para recebê-lo aqui.
— Por que logo você, um comunista?
— Porque me deram a missão de alfabetizá-lo. Meus superiores disseram que só o meu método seria capaz de salvá-lo da sua ignorância, porque ele prevê que todo mundo sabe alguma coisa, e é a partir do seu universo, do seu cotidiano, que se começa o aprendizado.
— Palhaçada de universo, globalismo esquerdista. Está aí posando de salvador mas tá no Inferno como eu. Alguma coisa está devendo. E deve ser graduado, pois foi até escolhido pelo superior aí, que só pode ser o Satanás, para receber o presida aqui.
— Não passo a eternidade aqui, presidente. Venho com alguma frequência apenas para salvar almas, amenizar o sofrimento, como costumava fazer com os oprimidos na Terra. E meu superior é Deus, embora eu responda mais diretamente à ala social do Céu, gerenciada por Jesus.
— E como é que é esse método aí de partir do meu cotidiano?
— É simples. Está vendo aquele quadro branco ali?
— Sim.
— Sei que as letras você já reconhece, correto?
— Claro, pô? Tá tirando com a minha cara?
— Então, vamos começar, vá até a ele e escreva as letras “M”, “I”, “L”, “I”, “C”, “I”, “A”, “N”, “O”.
* Jornalista e Professor.
GERAL
Protegidos pegam vagas da P-43
A diretoria do Sindipetro-NF está em contato permanente com os petroleiros da plataforma P-43, na Bacia de Campos, para enfrentar um caso, ao que tudo indica, de discriminação praticada pela gestão da Petrobrás. Os relatos da categoria a bordo dão conta de que trabalhadores da unidade estão sendo desimplantados (transferidos para bases de Terra) para que ocupantes de cargos de chefias do Pólo de Pargo, que teve suas plataformas vendidas, assumam as vagas.
O sindicato já entrou com contato com as gerências geral e de gestão de pessoas da Petrobrás, buscando esclarecimentos sobre a situação. Os representantes da empresa se comprometeram a apurar e a suspender os desembarques se ficar caracterizada prática discriminatória.
Desculpas não colam
Os trabalhadores afirmam que ouviram dos chefes imediatos explicações pouco convincentes sobre as razões do desimplantes, como proximidade de aposentadoria ou baixo desempenho para justificar as escolhas. No entanto, alguns dos chefes do pólo de Pargo também estão próximos da aposentadoria, e não foi comprovado o baixo desempenho dos possíveis desembarcados. O NF cobra uma postura rigorosa da empresa contra a discriminação.
Ano novo será de velhas lutas
Em entrevista à Rádio NF nesta semana, o coordenador geral da FUP e diretor do Sindipetro-NF, José Maria Rangel, falou sobre a sua expectativa para 2020 no movimento sindical petroleiro. Para o sindicalista, no ano será de muitos embates contra a gestão bolsonarista da Petrobrás.
“O ano de 2020, sem dúvida nenhuma, vai ser marcado por grandes embates da categoria petroleira contra a atual administração [da Petrobrás], bem como do atual governo. Digo isso porque temos na pauta desse governo entreguista a venda de cinco refinarias, e que obviamente nós não vamos assistir a isso de braços cruzados”, afirmou.
Para Zé Maria, os petroleiros vão precisar “buscar aliados na sociedade, no Poder Judiciário, nos movimentos sociais, para demonstrar que essa falácia que hoje é colocada, de que a venda das refinarias vai baratear a venda dos combustíveis. Isso na realidade não se traduz nos números que a gente assiste hoje, visto que a Petrobrás, apesar de ser uma empresa controlada pelo governo federal, já opera como uma empresa privada, e a gente vê os preços abusivos dos derivados de petróleo, quer seja a gasolina, o óleo diesel, o botijão de gás”.
Petrobrás na contramão
O coordenador da FUP advertiu ainda que “eles querem transformar a Petrobrás única e exclusivamente numa empresa exportadora de óleo cru, indo na contramão do que o mundo todo está fazendo. Todas as empresas de petróleo estão se integrando, o que a gente chama uma empresa ir do poço ao posto, ela tanto explorar, tanto transportar, tanto refinar, quanto vender. E a Petrobrás efetivamente tem caminhado no sentido contrário”.
José Maria reforçou a necessidade de conscientizar a população e buscar apoio em outros setores. “É um ano que promete embates muito grandes entre a categoria petroleira, a direção da Petrobrás e o governo federal. Volto a dizer: para vencermos essa luta nós temos que ter aliados na sociedade brasileira. Porque assim como a Petrobrás foi criada com movimento de massa, com o movimento do Petróleo é Nosso, hoje, para ela se manter enquanto empresa, ela precisa desses mesmos aliados para reafirmar que o petróleo tem que ser nosso”, avaliou.
Alternativa só em 2020, diz Petros
A implementação da proposta alternativa de equacionamento dos déficits dos planos Petros do Sistema Petrobras – Repactuados e Não Repactuados (PPSP-R e PPSP-NR) – ficou para 2020. O anúncio foi feito no último dia 17, durante reunião do GT Petros com o presidente da Petros, Bruno Dias.
Foi discutida a possibilidade de celebração de um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) com a Superintendência Nacional de Previdência Complementar (Previc) para estender o prazo de aprovação do equacionamento do déficit registrado em 2018. O Sindipetro Litoral Paulista foi o único dos 17 sindicatos que não aprovou a proposta.
Categoria aprova tabelas
Petroleiros e petroleiras que atuam em turnos de 8 horas no Norte Fluminense concluíram, na última sexta, 13, as assembleias para deliberar sobre as mudanças nas tabelas de revezamento. As assembleias foram realizadas nos grupos de Cabiúnas, que concentram 95% dos trabalhadores em turno de 8 horas na região, com amplo diálogo sobre o histórico de negociações.
Por 64 votos a 10, com oito abstenções, foi aprovado o indicativo da FUP e de seus sindicatos de referendo à proposta apresentada à empresa, na mesa de negociação, que prevê a manutenção das atuais tabelas de turno, através de um termo aditivo ao Acordo Coletivo.
Foco na luta por empregos
Os últimos anos têm sido de perdas nos direitos trabalhistas e o cenário indica a necessidade de muita resistência, em 2020, para que os danos aos trabalhadores não sejam ainda mais intensificados.
Reunida na última sexta-feira, a Executiva Nacional da CUT (Central Única dos Trabalhadores), definiu um calendário de ações para os próximos meses, com prioridade para a geração de empregos e o desenvolvimento com justiça social, democracia e soberania.
“A Jornada Nacional de Lutas por Emprego e Desenvolvimento, Direitos, Democracia e Soberania terá atividades articuladas e unificadas nos locais de trabalho, moradia e comunidades, onde os sindicalistas detalharão o que as medidas que Bolsonaro vem propondo, como o Programa Verde e Amarelo, que prejudicam os trabalhadores e as trabalhadores, e apresentarão as propostas da CUT e demais centrais para gerar emprego e renda”, divulgou a CUT em seu site.
A resolução aprovada pela centra sindical registra a avaliação de que o Brasil vive um momento em que, “com apoio majoritário do empresariado, do sistema judiciário, das forças armadas, das forças policiais, das milícias, dos oligopólios da comunicação e da cúpula de igrejas conservadoras, uma coalizão ultraneoliberal governa o país, buscando desmontar o movimento sindical, reprimir os movimentos populares e institucionalizar um Estado de exceção – vide as declarações em favor de um novo AI-5 – para aplicar seu programa de ataques aos direitos sociais, à soberania nacional e às liberdades democráticas”.
Assinatura do ACT foi essencial
Mal compreendida, à princípio, por alguns segmentos da categoria, a decisão tomada nas assembleias da Campanha Reivindicatória de assinar o Acordo Coletivo de Trabalho 2019/2020 se mostra mais uma vez acertada.
A FUP e seus sindicatos assinaram o ACT em 4 de novembro, em cerimônia no Tribunal Superior do Trabalho (TST), que mediou o processo de negociação com a Petrobrás e subsidiárias. Na ocasião, a Federação registrou que a categoria encerrava “de cabeça erguida esta importante batalha contra o desmonte do ACT”, e recomeçava “uma luta muito mais árdua, que é barrar as privatizações em curso na empresa e defender os empregos”.
Este fim de ano, quando se desenham as perspectivas para 2020, mostra o quanto é importante que a categoria esteja resguardada na grande maioria dos seus direitos, quando todas as demais categoria estão sofrendo ataques virulentos e mesmo os aparatos trabalhistas do judiciário e do Poder executivo se decompõem.
Se o ACT não fosse assinado naquele momento, os petroleiros estariam ainda mais vulneráveis.
CURTAS
Impacto nos voos
O Sindipetro-NF continua a cobrar da Petrobrás a redução dos impactos da retirada dos voos do aeroporto Bartolomeu Lisandro, em Campos dos Goytacazes, como noticiado pela edição passada do Nascente. Ontem, em contato com o Apoio Aéreo, o sindicato abriu diálogo sobre a possibilidade de alteração, ao menos, das situações mais drásticas de impacto sobre a rotina do trabalhador. Os petroleiros e petroleiras podem relatar seus casos para [email protected].
Luto
O Sindipetro-NF comunicou ontem, em seu site, com profundo pesar, o falecimento da pensionista Suedmar Poubaix Morisson Barreto, 61 anos. Seu velório foi realizado no Cemitério do Caju, em Campos dos Goytacazes, e o sepultamento aconteceu também ontem. Suedmar era bem atuante e participava com muita frequência das atividades promovidas pelo sindicato. A entidade manifesta as condolências aos familiares e amigos.
Sedes do NF
O Sindipetro-NF não terá atendimento público em suas sedes nesta sexta-feira, 20, em razão da confraternização dos funcionários e diretores da entidade, que será realizada em Campos dos Goytacazes. Na segunda, 23, começa o período de recesso que dura até o dia 3 de janeiro. As sedes voltam a ter funcionamento regular no dia 6 de janeiro. Diretores e diretoras do sindicato permanecerão em plantão pelos celulares, à disposição da categoria em is.gd/celularesnf.
Nascente
Esta edição 1121 é a última do Nascente em 2019. O boletim volta a circular na segunda semana de 2020. Em razão do recesso dos funcionários do sindicato haverá redução no volume de notícias veiculadas no site e nas redes sociais da entidade, mas eventuais assuntos urgentes continuarão a ter cobertura da Imprensa do NF, com a manutenção dos jornalistas da entidade em regime de sobreaviso.
NORMANDO
O ano da matança
Normando Rodrigues*
Nunca antes tantos trabalhadores aplaudiram tantos carniceiros deles mesmos.
Não causa espanto que a “Casa Grande”, do alto dos característicos narizes de quem pisou no cocô, aprove o extermínio de pretos, pobres e putas. Sua bestialidade é quadricentenária. O que de fato assusta é perceber a enorme multidão de pretos, pobres e putas, na torcida fanática pelo genocídio de pretos, pobres e putas.
Em abril desse ano, logo após o Exército disparar mais de 80 tiros contra o carro de uma família, em Guadalupe, e ainda matar um catador de latas que tentou socorrer as vítimas, foi entreouvido num hotel de São Paulo o seguinte:
Bestiário
“O que você queria? Um bando de preto! Passar na frente do Exército! Em Guadalupe? Quá-quá-quá-quá-quá!”
O embrutecido tinha uns 30 anos, branco, alto, bem nutrido e vestido, e ria sarcasticamente da tragédia, no café da manhã, com sua bela acompanhante. Ainda que não fosse da Casa Grande, no mínimo era um lacaio próximo, convencido pelas mesmas crenças do patrão, cristão temente a Deus e amoroso frequentador de ritos dominicais. Um quadrúpede, por certo, mas de falas tão condenáveis quanto previsíveis.
O “outro” é que comove. Na fila de um supermercado popular em São Gonçalo, a freguesa reclama do preço da carne só para ouvir o cliente logo atrás gritar escandalizado…
“O nosso presidente Lula…”
“… disse que um adolescente de 14,15 anos, que rouba um celular, não pode ser morto pela Polícia! Esse que é o bom, né?”
O muar tinha também seus 30 anos, vestia camisa preta de Bolsonaro (uma das milhões que o TSE proibiu todos os outros candidatos de fazer, mas permitiu ao fascista), rota bermuda camuflada e chinelos. Ostentava um olhar psicótico e era branco, ou “quase branco”.
A genialidade do fascismo sempre residiu em convencer os trabalhadores a agir contra seus próprios interesses. Mussolini, Salazar e Franco serviram-se do rádio para isso. Hitler chegou a mandar produzir, e distribuir a preço de custo, o “rádio do povo” (volksempfänger). Para Bolsonaro, bastou o WhatsApp.
Novos recordes
… de matança se acumulam, enquanto isso. Só no Estado do Rio de Janeiro, a polícia matou 1.686 pessoas, entre Janeiro e Novembro deste ano.
Em poucos dias os genocidas estarão à mesa para celebrar um Messias que priorizava tratar como iguais “pretos, pobres e putas”.
E brindarão à boa média da polícia fluminense, que mata 5 pessoas por dia. Em sua enorme maioria pretos, pobres e putas.
* Assessor jurídico do Sindipetro-NF e da FUP.
[email protected]