Nascente 1141

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EDITORIAL

Novilinguismo e cinismo

Virou até um clichê citar ficções distópicas como 1984, de George Orwell, toda vez que se fala em regimes autoritários. Debatedores de diferentes matizes ideológicos vez por outra utilizam esse artifício. Este editorial não foge a esse costume para lembrar um dos aspectos dessa obra: a novilíngua. No livro, ela é uma maneira utilizada pelo sistema para criar palavras e dar novos significados a situações incômodas, de modo a impedir que as pessoas tenham acesso a um entendimento mais abrangente sobre o que de fato está acontecendo. Uma forma de alienação por meio da linguagem.

A gestão bolsonarista da Petrobrás sequer chega ao refinamento de criar novas palavras, o que ao menos nos legaria alguma riqueza vocabular. Um boneco do “mercado” como o presidente da empresa, Roberto Castello Branco, limita-se a negar os fatos apenas pela dissimulação mesmo.

É assim quando ele afirma que a companhia não está sendo privatizada, apenas vendida. Não é curioso?
Se existisse uma cláusula de venda que permitisse que apenas outras empresas estatais comprassem as dezenas de ativos que a Petrobrás vendeu nos últimos anos (e continua a vender), por meios tortos esse raciocínio faria algum sentido. Cínico, mas faria. Pedaços da Petrobrás deixariam de ser estatais brasileiras para se tornarem estatais de outros países. O efeito danoso para o Brasil é o mesmo, mas o contorcionismo encontraria algum amparo (algo como Bolsonaro dizer que não se referia à Polícia Federal quanto falou em interferência naquela famosa reunião ministerial).

Mas nem isso se sustenta. Como mostrou a FUP nessa semana, “ao vender campos de exploração e produção de petróleo e gás natural; transportadoras de gás natural, como a Transportadora Associada de Gás (TAG); a BR Distribuidora, a maior distribuidora de combustíveis do país; e insistir na venda da Gaspetro – que está sendo questionada na Justiça – e de oito de suas 15 refinarias, a diretoria da Petrobrás está, sim, privatizando a companhia. E mantendo o ritmo programado, a atual diretoria da empresa vai esvaziá-la de tal forma que pouco restará à Petrobrás, impossibilitando sua recuperação diante da atual crise global provocada pela pandemia de covid-19”.

Essa sim é a verdade crua do desmonte. Sem novilinguismo e sem cinismo.

 

ESPAÇO ABERTO

Bancários precisam resistir*

Clóvis Victória Jr.**

Ainda não se tem dados exatos sobre o padecimento dos(as) bancários(as) desde que seu trabalho foi definido em decretos como serviço essencial a depender de Estado ou Município. Há relatos que dão conta de adoecidos, isolados na família, internados em UTIs e seis mortos em todo o país até o dia 20 de maio. É fato que uma categoria que tem uma Convenção Coletiva Nacional (CCT), uma única data-base em todo o país e uma estrutura sindical forte consegue avançar em mesas de negociação.

Se uma frente de batalha da Confederação Nacional dos Trabalhadores do Ramo Financeiro (Contraf-CUT), das federações pelos estados e dos Sindicatos de todo o país é proteger a saúde dos trabalhadores expostos ao coronavírus nas aglomerações das filas em agências, a outra é lidar com o discurso de crise.

A ideologia da lei do mais forte impõe metas. A recuperação econômica e os efeitos da pressão por liberação geral de comércio e indústria são entendidas como metas abusivas pelos bancários. Nos bancos, vigora a ideologia da lei do mais forte. É preciso vender mais, trabalhar mais e compensar as supostas perdas da crise. Entra em cena, a cobrança de metas, a pressão e o assédio moral. Elas foram tão abusivas que chegaram a gerar demissões.

A Caixa, por exemplo, resolveu estender o Projeto Remoto, aquele do trabalho em home office até dia 30 de maio depois de muita pressão. Mesmo que os dados dos casos de Covid-19 já estejam perto dos 300 mil e quase atingem 18 mil mortes neste final de maio no Brasil. São a prova de que o dinheiro vem antes das vidas para os banqueiros.

Como diz a secretária da Cultura e representante Contraf-CUT, Fabiana Uehara Proschold, nas negociações com a Caixa, o segredo é manter-se de olho nos bancos. “Qualquer coisa diferente do que negociamos, ainda mais precedida de pressão e afins, deve ser denunciada ao sindicato”, afirmou. A vigilância é eterna.

* Trecho de artigo publicado no Portal da CUT, em is.gd/eanascente1141, sob o título “Expostos ao coronavírus, bancários precisam resistir à pressão dos banqueiros por lucro”. ** Jornalista do SindiBancários de Porto Alegre.

GERAL

Automatismo de gestão sem gente

Sabe quando você está com um problema muito grave e específico com uma empresa, procura um SAC (Serviço de Atendimento ao Consumidor), ou uma Ouvidoria, e recebe aquela resposta padrão copiada e colada? Pois foi algo semelhante a isso o que denunciou o Sindipetro-NF nesta semana, mostrando que uma das faces da negligência da gestão bolsonarista da Petrobrás para com os trabalhadores é o desrespeito com o qual trata a sua representação sindical.

Na última sexta, 22, um mês depois de o Sindipetro-NF ter enviado à companhia um ofício, em 23 de abril, com cobranças específicas sobre prevenção ao novo coronavírus entre os petroleiros e petroleiras, a entidade recebeu documento da gerência de Negociação Sindical com respostas evasivas.

A empresa não respondeu a nenhum dos pontos levantados pelo sindicato, o que reflete que a gestão da companhia está tão perdida no combate à pandemia quanto o governo que representa. Enquanto isso, continua querendo “passar a boiada” em forma de medidas contra os trabalhadores.

No ofício, o sindicato cobra a emissão de CATs (Comunicação de Acidente de Trabalho) para casos de covid-19, a utilização das fichas do SUS para notificação das ocorrências e pede que sejam encaminhadas, aos médicos do PCMSO da empresa (Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional), várias recomendações de prevenção à contaminação pelo novo coronavírus feitas pelo médico do trabalho que assessora o Sindipetro-NF, Ricardo Duarte.

A resposta da Petrobrás, assinada por Marta Regina Dal Cere Garcia, gerente setorial de Negociação Sindical, veio em forma de generalidades como “a Petrobras vem implementando diversos procedimentos e orientações que visam a proteção da saúde de seus colaboradores, a prevenção da transmissão da Covid-19 no ambiente de trabalho, a vigilância e identificação de colaboradores que apresentem sinais e sintomas da doença e o monitoramento estreito da saúde daqueles que apresentem suspeita ou confirmação da Covid-19”.
Para obter respostas assim, o Sindipetro-NF suspeita que teria sido mais rápido ligar para um call center.

 

Desembarques não param na Bacia

Quatro dias depois de os petroleiros de P-40 terem informado o desembarque de oito trabalhadores com suspeita de covid-19, chegou ao Sindipetro-NF, ontem, a denúncia de que 14 pessoas com suspeita da doença desembarcaram de P-07. Os desembarques aconteceram no domingo, segunda e terça em voos intercalados e, segundo denúncia, eles estão em um hotel em isolamento social em Itaboraí.

Os trabalhadores com suspeita são empregados da Petrobrás, CSE, ELFE e LC. Todos fizeram os testes de Covid-19 e aguardam o resultado.

O Sindipetro-NF segue acompanhando os casos de covid-19 entre os trabalhadores da Bacia de Campos e reforça a importância da emissão das CATs (Comunicação de Acidente de Trabalho) para garantia de direitos. É importante ainda que os trabalhadores e trabalhadoras continuem a enviar para a entidade relatos para o e-mail [email protected].

NF orienta sobre termo no desembarque

O Sindipetro-NF recebeu de trabalhadores a informação de que a Petrobrás começou a exigir dos petroleiros e petroleiras, ao desembarcarem das plataformas, a assinatura em um termo aonde declaram se têm eventuais sintomas da covid-19.

A entidade orienta os petroleiros e petroleiras a indicarem nesse documento os sintomas que eventualmente tiverem percebido ou, se não houver sintoma algum, adicionar a ressalva de que a contaminação pelo novo coronavírus pode se dar de forma assintomática.

O sindicato também recebeu relatos de que a companhia está impedindo o desembarque de trabalhadores que não apresentem elevação na temperatura corporal, mesmo que tenham outros sintomas — como tosse ou coriza. O NF condena esse comportamento e denuncia que dessa forma, mais uma vez, a gestão da empresa negligencia a prevenção à propagação da covid-19 e coloca em risco a vida dos seus empregados próprios e terceirizados.

O NF solicita aos trabalhadores que continuem a enviar relatos sobre a exposição aos riscos de contaminação ou outras informações sobre as condições de trabalho para [email protected].

 

FUP quer parada nas hibernações

Da Imprensa da FUP

Mais uma vez, na reunião virtual com a Petrobrás, realizada no último dia 22, a Federação Única dos Petroleiros solicitou à gerência que pare o processo de hibernação da companhia durante o estado de calamidade em que o Brasil se encontra devido à pandemia da covid-19.

Além do descumprimento do Acordo Coletivo de Trabalho, sobre a comunicação prévia com as entidades sindicais prevista na cláusula 41, que trata sobre o Excedente de Pessoal, onde prevê em seu Parágrafo 1º que “a Companhia comunicará as Entidades Sindicais, com antecedência, as ações de mobilização de empregados de sua base para outras regiões”, a empresa também descumpre a Nota Técnica 06/20 do Ministério Público do Trabalho onde diz que a empresa deve “promover medidas para a não realização de transferências de empregados para outras localidades enquanto não houver sinalização das autoridades sanitárias de que estão sendo reduzidos os riscos e efeitos da pandemia da doença infecciosa COVID-19”.

 

Monopólios privados no setor refino

O jornal Valor Econômico publicou na terça, 26, e o Ineep (Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis) reproduziu em seu blog (is.gd/refinarias), matéria que mostra o que a FUP e o movimento sindical denunciam há tempos: a venda de refinarias da Petrobrás tende a criar monopólios privados regionais no setor de refino, algo muito distante do chamado “ambiente de competição” defendido pelos privatistas.

“O processo de abertura do mercado de refino, por meio da venda de oito refinarias da Petrobras, que respondem por cerca de 50% da capacidade de processamento de petróleo do país, pode criar uma nova distorção no mercado. Estudo feito pela PUC-Rio indicou alta possibilidade de formação de monopólios privados regionais nas áreas de influência da maioria das refinarias à venda, sem garantia de aumento de competitividade que possa se refletir em redução de custo aos consumidores finais”, relata a matéria.

O jornal mostra que o estudo da PUC-Rio “analisou seis das oito refinarias à venda pela Petrobras: Refap (RS); Repar (PR); Regap (MG); RLAM (BA); RNEST (PE); e Reman (AM). Não foram incluídas no estudo a SIX, por não produzir óleo diesel e gasolina, e a Lubnor, por produzir apenas 0,1% de toda a oferta nacional de diesel”.

O resultado é o que todo o movimento sindical petroleiro e o próprio Ineep já sabiam: “a primeira etapa do levantamento, concluída neste mês, indicou que, das seis refinarias analisadas, quatro delas têm potencial elevado para a formação de monopólios regionais: Reman, Refap, Regap e RLAM. Nesses casos, a falta de infraestrutura de modais de alta capacidade que interligue os mercados restringe a possibilidade de competição”.

Exceções seriam Repar e Rnest

“Com exceção da Repar e da RNEST, nas outras refinarias estudadas, a gente entende que, por qualquer dos modais que a gente observa, a possibilidade de estabelecimento de monopólios regionais é elevada”, explicou ao Valor o professor Márcio Thomé, um dos autores da pesquisa.

 

RMNR: Documentos até 31 de julho

O Sindipetro-NF prorrogou nesta semana o prazo para recebimento da documentação da RMNR-Petrobrás, que passa a terminar agora em 31 de julho próximo. Os documentos serão utilizados para preparar cálculos que serão apresentados ao STF, na tentativa de demonstrar o real impacto do complemento da RMNR nos contracheques dos petroleiros.

O Departamento Jurídico da entidade esclarece, portanto, que por hora estes documentos não serão utilizados para dar entrada em processo.

Os documentos devem ser enviados em um único e-mail para o endereço [email protected], no formato pdf, preferencialmente em pasta compactada. Dúvidas exclusivas sobre a RMNR também podem ser encaminhadas para este e-mail.

 

CURTAS

Fiocruz 120 anos

Orgulho do Brasil e protagonista do combate à covid-19, a Fiocruz completou 120 anos nesta semana. O Sindipetro-NF manifestou em seu site a homenagem da entidade a este patrimônio nacional. “Homenageamos essa importantíssima instituição que faz parte da história do nosso país ao desempenhar uma função estratégica na linha de frente do enfrentamento de pandemias e doenças, reconhecida internacionalmente”, disse o coordenador do NF, Tezeu Bezerra.

Live hoje 10h

Live hoje, às 10h, no canal da FUP no youtube, vai discutir os impactos da recessão da economia nos mercados financeiros e seus reflexos para os Fundos de Pensão. Foram convidados Henrique Jaguer, economista e ex-presidente da Petros; Claudia Ricaldoni, diretora da Anapar e membro do CNPC (Conselho Nacional de Previdência Complementar); e Luís Felipe, assessor previdenciário da FUP e da ANAPAR.

Calote

Matéria publicada no portal da CUT nesta semana mostra que “alguns empresários estão usando a pandemia do novo coronavírus para demitir trabalhadores e trabalhadoras sem pagar corretamente todas as verbas rescisórias obrigatórias nos casos de demissão sem justa causa. O prejuízo pode chegar a 50%”. O alerta é do monitoramento do Termômetro Covid-19 da Justiça na Trabalho, feito pela Datalawyer com o site Consultor Jurídico e a FintedLab.

Greve de 1995

Todo o movimento sindical petroleiro lembra hoje a passagem dos 25 anos da Greve de 1995. Um dos mais importantes movimentos da categoria petroleira, a paralisação durou 32 dias e foi essencial para barrar a privatização da Petrobrás, pretendida pelo governo FHC. A greve também foi vital para manter forte a própria organização dos trabalhadores, em um cenário de extremo ataque neoliberal aos sindicatos.

SOLIDARIEDADE – O Sindipetro-NF continuou, nesta semana, o trabalho de entrega de cestas básicas a comunidades em vulnerabilidade social em Campos dos Goytacazes e Macaé (foto). A entidade soma mais de 20 toneladas em doações de alimentos e se prepara para, em breve, iniciar a distribuição de kits de higiene em parceria com o Instituto Federal Fluminense.

NORMANDO

Estupro e morte

Normando Rodrigues*

1942. Soldados nazistas assaltam um vilarejo eslavo, fuzilam adolescentes e crianças, e estupram as mulheres, antes de matar.

Três generais passam de carro pela estrada próxima, param, assistem a parte do massacre com risinhos cúmplices, e seguem viagem.

Guarde esta cena. Voltaremos a ela.

É Fascismo!

A exibição da reunião do governo Bolsonaro, de 22 de abril, mostrou ao país a barbárie que nos dirige. Negar que seja fascismo, depois disso, é mergulhar de cabeça no irresponsável caldeirão onde se misturam cinismo, covardia, e omissão.

Pouco se falou da pandemia, mas Bolsonaro e os generais sabem da análise da Universidade de Washington: em 6 de agosto o Brasil terá, um mínimo de 68.311 mortos, caso adotemos um rígido isolamento social, e até um máximo de 221.078 mortes, com o que o governo defende.

“Viva lá muerte!”

Por que, então, Bolsonaro e os generais combatem o isolamento social? Primeiro porque, para eles, a morte de 150 mil brasileiros a mais é um “efeito colateral” tolerável, desde que o total não comprometa a “economia de guerra”.
Depois, porque para a própria “economia de guerra” de Paulo Guedes as mortes mais ajudam do que comprometem, como já expôs sua subordinada no ministério, Solange Vieira:

“É bom que as mortes se concentrem entre os idosos. Melhorará nosso desempenho econômico, reduzirá nosso déficit previdenciário.”

“Eu sou a Constituição!”

A saúde pública é definida pela Constituição como responsabilidade comum, tanto de municípios e estados quanto da União. E o STF reafirmou exatamente isto, em 15 de abril.

Mas Bolsonaro “é a Constituição!”. As autoridades públicas que defendem o isolamento social são “traidores”, e suas medidas são “inconstitucionais”!

O que sobra para você, se as decisões jurídicas e legislativas deixam de ser dos tribunais e do parlamento, e passam para as mãos de Bolsonaro?

Massacre

Sem os freios do Judiciário e do Legislativo, nada impede que Bolsonaro defina você como “vagabundo”, se isto for conveniente para ele.

Uma vez “vagabundo”, lei alguma impedirá sua prisão, tortura e assassinato. Ou o estupro de sua mulher e filhas, com posterior “eliminação”, termo também empregado na reunião de 22 de abril.

Risos

Os generais impediriam a barbárie?

Assista novamente ao vídeo da reunião do gabinete e repare no risinho dos generais, ante as mais obscenas e atrozes falas.

É o mesmo risinho dos generais que assistiram ao massacre de um vilarejo eslavo, em 1942.

* Assessor jurídico do Sindipetro-NF e da FUP.
[email protected]