Nascente 1386

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A SEMANA

Editorial

Neoliberalismo ontem e hoje, sempre ele

Quando começaram a surgir as primeiras informações sobre a explosão na plataforma Cherne-1, na manhã do último dia 21, gerações de petroleiros e petroleiras que viveram o momento da tragédia da P-36, em 2001, fizeram uma imediata associação entre os casos. Com as palavras “plataforma” e “explosão” em uma mesma frase não poderia ser diferente.

Mas há uma outra palavra que não apareceu, e continua sumida na imprensa, que também une os dois casos: “neoliberalismo”. Ainda que em cenários políticos muito distintos, a Bacia de Campos de 2001 e a de 2025 guardam a semelhança da agonia de um legado neoliberal de sucateamento das instalações, de privatizações, de cortes nos investimentos com segurança, de maximização dos lucros e de depreciação da vida.

Em 2001, o Brasil vivia o final dos anos FHC, que deixou, entre outras marcas, a tentativa de mudar o nome de Petrobras (lembremo-nos de que o movimento sindical petroleiro tem por princípio chamá-la Petrobrás, com acento) para Petrobrax, o que só não aconteceu devido à grande grita dos sindicatos, dos movimentos sociais e até mesmo de conservadores, naquela época ainda verdadeiramente nacionalistas, que acharam demais até para eles.

Em 2025, o Brasil vive em meio ao terceiro governo, não consecutivo (sempre bom lembrar), do presidente Lula. E também agora arrasta-se uma herança de mentalidade neoliberal, extremamente mais agressiva e predadora em Bolsonaro do que fora em FHC (porque avançou até sobre programas sociais e cuidados básicos de saúde, como se viu no criminoso trato da pandemia de Covid-19), muito presente na própria Petrobrás.

A principal marca do neoliberalismo é o descaso com a vida, com seus impactos conhecidos sobre a saúde e a segurança dos trabalhadores, assim como sobre o meio ambiente, os direitos sociais e trabalhistas, a cultura, a educação as artes, tudo o que não gera lucro imediato. É uma política de morte que, por muito pouco, não levou mais companheiros no caso PCH-1.

FUP pressiona por compensação na PLR

Em reunião recente com a Petrobrás de acompanhamento de ACT, a FUP cobrou uma compensação para redução da PLR. A categoria considera uma afronta que a empresa tenha anunciado o pagamento de mais R$ 9,1 bilhões de dividendos adicionais para os acionistas, enquanto reduz em 31% a PLR dos que construíram os resultados da companhia. A FUP questionou a boa-fé negocial dos representantes da Petrobrás e considera inaceitável a desigualdade de tratamento em relação aos acionistas, a quem a empresa destinou 207% do lucro que é fruto dos resultados construídos coletivamente pelos trabalhadores e trabalhadoras.

 

VOCÊ TEM QUE SABER

Explosão em Cherne escancara desmonte

Pouco mais de uma semana após a explosão na plataforma PCH-1, no último dia 21, o Sindipetro-NF vai marcar este Primeiro de Maio, nesta quinta-feira, com Ato Público no Heliporto do Farol de São Thomé, no início da manhã, para denunciar a insegurança crônica das áreas operacionais da Petrobrás. O acidente atingiu de modo mais imediato e explícito 32 trabalhadores (14 que sofreram queimaduras e os demais que inalaram fumaça), mas potencialmente gerou consequências psicológicas em dezenas de outros.

Até o horário de fechamento desta edição, cinco vítimas de PCH-1 permaneciam internadas no Hospital da Unimed, em Macaé, entre elas o caso mais grave, petroleiro da Engeman que se atirou ao mar fugindo das chamas e teve um resgate dramático e carregado de evidências de descumprimento de protocolos.

O sindicato também vai chamar assembleias para que os petroleiros e petroleiras elaborem documentos que listem as condições de insegurança dos seus locais de trabalho. Além disso, tem atuado para denunciar as condições inseguras, em geral, e as falhas específicas verificadas em PCH-1, tanto por cobranças internas à Petrobrás quando por meio de comunicações aos órgãos fiscalizadores. Uma dessas ações de denúncia foi a realização de entrevista coletiva para a imprensa, na sede do NF em Campos, na última segunda, 28, dia em defesa da segurança no trabalho.

O NF também vai dedicar a edição desta semana do programa NF ao vivo (nesta quarta, 30, às 19h30), no Youtube da entidade, para debater a insegurança crônica e o caso PCH-1, com participações dos diretores e diretoras sindicais que estiveram diretamente envolvidos no acompanhamento das vítimas desde as primeiras horas.

Em outro fórum, o da Comissão Corporativa de Saúde, Meio Ambiente e Segurança (SMS), a FUP e os sindicatos reforçaram, em reunião no último dia 25, a urgência de respostas concretas às demandas históricas negligenciadas. A fala mais comovente da reunião foi a de Sérgio Borges, diretor da FUP e coordenador geral do Sindipetro-NF, sobre PCH-1.

Cobranças da FUP e do NF sobre PCH-1

Durante reunião, no último dia 25, com o gerente executivo de SMS da Petrobrás, o movimento sindical voltou a denunciar o cenário crítico de segurança nas plataformas da Bacia de Campos. A FUP e o Sindipetro-NF manifestaram tristeza e indignação, diante do grave acidente ocorrido no dia 21 passado, e mostraram sua disposição para a luta pela garantia da saúde e segurança de todo trabalhador embarcado. As entidades alertaram que o episódio não é um caso isolado, mas reflexo de um processo contínuo de sucateamento e decisões equivocadas que, ao longo dos anos, vêm abrindo caminho para uma tragédia anunciada.

Representantes sindicais relataram, com base em depoimentos das vítimas, a gravidade da ocorrência que envolveu fogo, fumaça tóxica, rotas de fuga interditadas, dificuldades no resgate e um trabalhador que precisou pular no mar. “Por muito pouco não abrimos a reunião com um minuto de silêncio”, afirmou um dos dirigentes, destacando o potencial vítimas fatais, de destruição e as falhas graves no protocolo de segurança. Participaram da reunião, pela FUP, o diretor Sérgio Borges e as diretoras Bárbara Bezerra e Cibele Vieira; pelo NF, participou o diretor Alexandre Vieira.

Durante o encontro, o movimento sindical apresentou um conjunto de exigências à Petrobras, com destaque para o desembarque imediato de todos os trabalhadores que estavam a bordo no dia do acidente; a redução do efetivo ao mínimo necessário, garantindo saúde e habitabilidade da plataforma, atendimento médico e psicológico obrigatório para todos os trabalhadores – feridos ou não – antes do retorno ao trabalho; emissão de Comunicação de Acidente de Trabalho (CAT) para todos os embarcados; garantia de atestados médicos compatíveis com as necessidades de tratamento; compromisso de que nenhum trabalhador sofra perda salarial ou de benefícios em decorrência do acidente e a revisão da política de SMS, com participação ativa dos trabalhadores na construção de medidas mais eficazes de segurança.

Tratamento insatisfatório

Segundo os representantes sindicais, a Petrobras mantém uma abordagem insatisfatória no campo da saúde e segurança do trabalho. Um exemplo foi a não realização de exames laboratoriais (sangue e urina) para avaliar contaminação por fumaça tóxica – que é mistura química potencialmente perigosa. Como resposta, a Petrobrás encaminhou apenas uma avaliação clínica superficial. Outro ponto grave para o NF e a FUP foi a falha de comunicação da empresa com o sindicato e o fato de ter embarcado seus representantes na unidade, incluindo o gerente executivo, sem avisar ou convidar o sindicato para acompanhar a vistoria em PCH-1.

Divergências com a Petrobrás

Apesar das divergências, a Petrobrás afirmou que está se esforçando para fazer a troca de turma imediata de todos os trabalhadores que estavam a bordo na data do acidente. Disse estar trabalhando com o POB reduzido, com o mínimo para garantir a segurança e a viabilidade da plataforma. A Petrobrás também garantiu que está com a equipe de tratamento psicológico à disposição dos trabalhadores, ou seja, quem quiser pode procurar, que vai ter atendimento. Vale lembrar que o pleito do Sindipetro-NF é que obrigatoriamente, todos os trabalhadores passem por atendimento médico e psicológico, antes de embarcar novamente. A empresa também garantiu que os trabalhadores não terão custos com despesas médicas decorrentes do acidente.

No entanto, não houve entendimento em relação à emissão de CAT. A empresa se recusou a emitir CATs para todos os embarcados, limitando-se a 17 registros – apenas para ferimentos físicos visíveis. Para os casos de trauma psicológico, a Petrobras alega necessidade de protocolo e período de observação, o que foi contestado pelo sindicato.

5 pontos gravíssimos sobre o caso PCH-1

1 – Dificuldade de evacuação devido a rotas de fuga interditadas.
2 – Falhas graves no resgate do trabalhador que caiu ao mar e no atendimento médico em terra firme.
3 – Falta de comunicação eficaz com as famílias dos petroleiros, tanto das vítimas diretas quanto dos demais trabalhadores.
4 – Demora para atendimento de determinação da ANP e cobrança do NF de retirada de todo o pessoal a bordo durante o acidente (com troca de turma apenas para serviços essenciais).
5 – Desconhecimento sobre a origem e localização do vazamento de gás que causou a explosão e possibilidade de novos vazamentos.

 

SAIDEIRA

Teletrabalho e deslocamentos no NF entre pautas de comissão

Da Imprensa da FUP

Em nova reunião da Comissão de Frequência, Regime de Turno e Teletrabalho entre os representantes da Federação Única dos Petroleiros (FUP) e do Sistema Petrobrás, no último dia 24, a FUP cobrou de forma veemente respostas sobre diversos pontos que geram problemas para os trabalhadores e trabalhadoras.

Um dos temas centrais da reunião foi Hora Extra e Troca de Turno (HETT). A FUP entende que o último acordo coletivo avançou na questão da segurança da troca de turno voltando à tabela das médias. Porém, verifica-se na prática que essas médias precisam ser atualizadas, em razão de diversas mudanças ocorridas nas unidades e no Sistema ao longo dos últimos anos. A federação considera que a troca de turno é uma variável sumamente determinante para a segurança das unidades e reafirma seu compromisso de lutar para aprimorar esse processo rumo ao próximo Acordo Coletivo de Trabalho (ACT).

Banco de Horas

No que diz a respeito do Banco de Horas, apesar de estar no ACT, na prática ainda existem gerências que pressionam os trabalhadores a folgarem para diminuir as horas no banco, principalmente no final do ano, quando roda a quitação das horas. Para a FUP, é necessário o acompanhamento permanente na comissão da situação de horas nos bancos para identificar as causas concretas que levam a acúmulos de HE e procurar tratar as causas.

Jornadas exaustivas

Os representantes sindicais levantaram na reunião a necessidade de uma solução para os deslocamentos no Norte Fluminense, no caso dos trabalhadores que se embarcam no offshore. Muitos saem antes das três da manhã de Macaé e trabalham até as 22 quando chegam na plataforma, e no total são mais de seis horas de viagem entre ida e volta.

Durante a reunião, também foi cobrado o fim do saldo AF, que segue sendo um problema principalmente nas plataformas, obrigando trabalhadores a voltar fora de sua escala e ficar em terra, mesmo sem necessidade operacional para isso. De forma localizada, ainda existem gerências que proíbem localmente o uso do código negociado em ACT para neutralizar o impacto do retorno das férias.

Teletrabalho

O teletrabalho é um dos temas que tem gerado maior polêmica nos últimos tempos e é um assunto caro à categoria. Durante o encontro, a FUP voltou a reforçar firmemente a necessidade de que a Petrobrás apresente uma proposta concreta, que permita avançar na negociação de uma regra coletiva. A empresa se comprometeu a enviar um convite para uma mesa negocial sobre a regra do teletrabalho, ainda na primeira semana de maio.
Outros pontos cobrados pela FUP na reunião foram o aumento do efetivo, o abono dos dias da greve, o interstício no Sobre aviso e as horas extras nos cursos.

 

NORMANDO

A pior tragédia é a que se repete

Normando Rodrigues*

Em 15 de março de 2001 explodia uma área confinada de P-36 onde não deveria existir nem óleo, nem gás, mas havia.
Onze empregados da Petrobrás (a brigada de incêndio) morreram na 2ª explosão e vale muito recordar uma pergunta. Uma despretensiosa indagação de um sobrevivente, trabalhador de empresa privada, dirigida aos deputados federais que o ouviram em comissão parlamentar:

“- Se, em lugar dos mortos da Petrobrás, fossem 11 trabalhadores de empresas privadas, os senhores estariam aqui em Macaé, investigando?”

Passados vinte e quatro anos, a questão não apenas ainda ecoa, como soa mais pertinente hoje do que quando do naufrágio de P-36. Mas consideremos algumas consequências daquele desastre.

Poucos dias após a tragédia, conseguimos uma liminar em ação civil pública fundamentada na convenção 174 da OIT. Com esse comando, foi garantida a presença um dirigente sindical isento na comissão de apuração do acidente, impedindo assim o tradicional acobertamento de responsabilidades.

A Petrobrás fez e faz de tudo para sabotar a presença sindical nas investigações e até hoje manobra e comete deslealdades para impedir que os representantes dos trabalhadores atuem. Não raro, a empresa tenta condicionar o acesso à integra dos documentos, depoimentos e demais dados, a uma prévia “aprovação” da linha de apuração que lhe seja mais conveniente.

A despeito do espernear patronal, aquela liminar de março de 2001 se tornou cláusula do acordo coletivo de trabalho dos empregados da Petrobrás. E, como qualquer norma, sua aplicação à realidade é objeto de disputa.

Uma outra norma resultou tardiamente de P-36, e mais proximamente das interdições de plataformas (começando pelas vetustas P-33 e P-37) dez anos depois. Trata-se do Sistema de Gerenciamento de Segurança Operacional da ANP, item importante na luta por trabalho decente, são e seguro.

Contudo, poucos anos após a adoção do SGSO pela ANP, a Petrobrás decidiu minimizar drasticamente seu já minguado efetivo operacional, com os incentivos ao afastamento do 2014 e de 2016 (este último em pleno processo do golpe contra a presidenta Dilma Roussef), os quais, em conjunto, reduziram em cerca de 20 mil o número de empregados da estatal.

Não custa lembrar que P-36 e os graves acidentes ambientais envolvendo a estatal em 2000, foram resultantes dos PIDVs promovidos entre 1995 e 200, que rebaixaram o contingente da Petrobrás de 50 para 33 mil trabalhadores.

Hoje, particularmente as plataformas de petróleo vivem o resultado das políticas de Graça Foster e sucessores. A explosão de Cherne-1 não é o primeiro e parece estar longe de ser o último dos efeitos tardios dessa dizimação.

* Assessor jurídico do Sindipetro-NF e da FUP.  [email protected]

 

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