Rosely Rocha / Especial para Portal CUT – O Portal CUT foi ouvir uma filósofa, uma historiadora e uma economista para saber o que explica o fenômeno Luiz Inácio Lula da Silva, que, mesmo mantido como preso político há dois meses na sede da Superintendência da Polícia Federal, em Curitiba (PR), mantém a liderança isolada em todas as pesquisas de intenção de voto para Presidência da República.
Marcia Tiburi, Maria Aparecida de Aquino e Leda Paulini foram unânimes ao afirmar que o povo brasileiro não esquece o período de desenvolvimento econômico e bem-estar social, com políticas de combate a miséria e a fome e a geração de emprego e renda, promovidos pelo governo Lula. Para muitos, o melhor presidente que o Brasil já teve.
Para a filósofa Marcia Tiburi, Lula continua à frente das pesquisas porque a população sabe diferenciar o momento que está vivendo e o que vivia durante os governos Lula e Dilma.
“Esses dois governos foram bons para todas as classes sociais porque se preocuparam com a ideia de desenvolvimento e com uma política econômica voltada para diminuir a desigualdade social”, diz a filósofa.
Essa mesma tese é defendida pela professora de história da USP e pós-doutora, Maria Aparecida de Aquino.
“Mesmo que não tenham [Lula e Dilma] conseguido realizar a inclusão social de todos os brasileiros, houve um início acelerado desse processo que beneficiou milhões de pessoas, que viviam na pobreza e na miséria”, diz a historiadora.
A população percebe esse período positivo e, mesmo com Lula preso, se identifica com ele e lembra seus atos em prol de um Brasil melhor
Para a professora do Departamento de Economia e da pós-graduação em Economia da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da FEA/USP, e ex- secretária municipal de planejamento, orçamento e gestão da Prefeitura de São Paulo, na gestão de Fernando Haddad (PT), Leda Paulini, os números traduzem a diferença entre os últimos governos liberais e o de Lula.
Ela lembra que o governo Lula foi ortodoxo do ponto de vista da política econômica tanto como os governos anteriores. A diferença, ressalta, foram as políticas sociais de alto impacto.
“O Bolsa Família, que recebia outro nome do governo FHC, atingia uma pequena parte da população com valores irrisórios. Já com Lula esse valor foi triplicado e passou a atingir cerca de 14 milhões de pessoas”.
Outra política de sucesso foi a valorização do salário mínimo, que descontada a inflação teve nos governos Lula e Dilma, um aumento de 85%.
“São mais de 21 milhões de pessoas que vivem com um salário mínimo, pessoas que recebem, por exemplo, a aposentadoria rural, que agora querem acabar”, ressalta a economista.
Segundo ela, o alto impacto desses programas, especialmente nos estados do nordeste, dobrou praticamente a renda da população que vivia numa situação miserável. Com isso, a região como um todo se desenvolveu.
“Se multiplicarmos por 3,6 pessoas – o tamanho médio da família brasileira, que depende de um salário mínimo – temos cerca de 70 milhões de pessoas beneficiadas direta ou indiretamente com a valorização do salário mínimo”, avalia.
“Não é à toa que Lula é adorado no nordeste; não porque ele seja pernambucano, mas porque impactou na melhora de vida da população local”, afirma Paulani.
A população percebe esse período positivo e, mesmo com Lula preso, se identifica com ele e lembra seus atos em prol de um Brasil melhor.
Sentimento este que a Marcia Tiburi reforça. Segundo ela, as pessoas perceberam que caíram numa armadilha criada pela mídia, que afirmava que a corrupção só acontecia no PT.
“Isto não quer dizer que o Partido não tenha cometido alguns erros, na minha avaliação, mas esses possíveis erros foram potencializados pela mídia e, quando eu converso com taxistas, camelôs, com pessoas nas ruas em geral, há uma percepção de que elas sabem que foram manipuladas, que os meios de comunicação mentem”, diz a filósofa.
Márcia e a historiadora Maria de Aquino concordam num ponto – o senso de justiça do brasileiro tem vindo à tona após o povo começar a perceber os jogos de poder cada mais escancarados.
“Os discursos anticorrupção e a “espetacularização” do judiciário tem sido percebidos como uma injustiça ao ex-presidente Lula”, diz Tiburi.
O carisma de Lula
Tanto para ela como para Aquino, independentemente do que acontecer com Lula, ele sempre será lembrado pelos seus atos, principalmente por seu carisma.
“Lula tinha de algo de heróico e agora está ficando mítico. Se para uns Bolsonaro é mito, para outros Lula é santo. O povo mais pobre olha para Lula e o vê como um santo”, declara Marcia Tiburi.
“Mesmo em um auditório lotado e negativo a Lula, ele é capaz de reverter o posicionamento de quem o ouve. Lula tem uma condição de liderança inata, desde o início da construção de sua vida política como líder sindical”, destaca a historiadora Maria de Aquino.
O golpe do capital
Mas setores do capital nacional e internacional, por interesses econômicos escusos não perdoaram o Partido dos Trabalhadores (PT) e Lula por mostrarem ao povo que é possível fazer políticas públicas voltadas aos mais pobres e deram o golpe de 2016, depondo a presidenta Dilma Rousseff, democraticamente eleita com 54 milhões de votos.
Ricos não perdoaram melhora de vida do povo
Nos governos Lula e Dilma, foram inúmeros programas sociais: Minha Casa, Minha Vida, Bolsa Família, Luz para Todos, Fies, e a utilização dos bancos estatais como Caixa Econômica Federal, Banco do Brasil e BNDES para financiar obras e empréstimos com taxas menores do que as cobradas por instituições financeiras particulares, além de uma política de fortalecimento da Petrobras e da Eletrobras.
“O grande capital nunca confiou no governo Lula por ele ser de esquerda. Lula foi tolerado, nunca aceito por ser nordestino e todo tipo de preconceito, além dele ser do PT, um partido que nasceu do movimento sindical”, diz a economista Leda Paulini.
Lula e o Congresso Nacional
Um dos problemas que Lula pode enfrentar, após uma possível vitória nas urnas é a relação com um novo Congresso Nacional, que prevêem os analistas, que pode ser ainda mais conservador.
Mas esta possibilidade é rechaçada pela historiadora. Maria de Aquino lembra a habilidade política do ex-presidente.
“Se há um candidato progressista com possibilidade de reverter essa situação é o presidente Lula”
A professora da USP diz ainda que o povo brasileiro há de se lembrar do espetáculo grotesco que foi o impeachment da presidenta Dilma e as consequências do golpe como a reforma trabalhista, o desemprego e a crise econômica.
“Não sou pessimista com o novo Congresso a ser eleito – é importante conservar o espectro da eleição e acredito que a população tenha em mente o aspecto mais degradante que foi o impeachment da Dilma. Creio que há uma oportunidade de renovar o Congresso e as pessoas serão mais cuidadosas na hora de escolher os candidatos”.
Lula pode reverter retrocessos
Maria de Aquino diz ainda que “nem o regime militar ousou mexer na CLT e só Lula é capaz de reverter essa malfada reforma trabalhista. O povo também não esquecerá a tentativa de mexer na previdência e na aposentadoria”.
Outro ponto destacado pela historiadora é a tentativa do golpista e ilegítimo Michel Temer (MDB-SP) de realizar privatizações em setores importantes da nossa economia como Petrobras, Eletrobras e bancos.
“Se voltarmos ao governo Fernando Henrique Cardoso (FHC), vamos lembrar que foi um governo, que apesar de aspectos positivos, foi um governo de grandes privatizações”.
Segundo ela, Lula soube reverter essa sangria e dilapidação do bem público.
“Lula poderá reverter toda essa sangria; acabar com a farsa da reforma trabalhista, jamais fará uma reforma previdenciária dilapidadora”.
“Hoje, a mídia massacra a ideia de um Estado mínimo. A crise dos caminhoneiros expôs isso. O governo foi pra TV dizer que não haveria uma intervenção no preço do petróleo. Qual o problema?”, questiona, e acrescenta “a Petrobras é estatal, a intervenção do estado em setores fundamentais não é negativa, é extremamente positiva”, declara.
Para a historiadora e professora da USP, com Lula o Brasil terá um estímulo de crescimento, uma política de desenvolvimento , ao contrário de um estado neoliberal e sim, um Estado desenvolvimentista, de bem estar social.