Os Impactos da Privatização da Bacia de Campos

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O Aumento do Lucro Privado as custas do Desenvolvimento Regional.

Iderley Colombini*

As mudanças recentes na política brasileira, mas conhecidas como o ‘golpe constitucional’ de 2016, possui principalmente duas diretrizes: i) a venda de empresas e ativos brasileiros ligados diretamente aos recursos naturais, principalmente o petróleo e a Petrobrás (mas também a terra) e ii) a intensificação da exploração do trabalho através da precarização das leis e da instauração de novos regimes da relação capital trabalho. Na região do norte fluminense esse processo de precarização do trabalho e privatização do patrimônio público é ainda mais intenso. Sendo umas das principais regiões produtoras de Petróleo no país, o norte fluminense tem passado por um intenso processo de retirada de investimentos e implantação de uma nova relação de capital trabalho, com abdicação para o desenvolvimento da região e da terceirização da produção de petróleo que passa a ser realizada pelas empresas privadas internacionais. O anúncio recente da Petrobrás da venda de Campos Maduros em todo Brasil (principalmente na Bacia de Campos) e a possibilidade da redução de royalties para incentivar o investimento privado representam a nova fase de abandono do desenvolvimento local.

Em 28 de julho de 2017 a Petrobrás anunciou a venda da totalidade de seus direitos de exploração, desenvolvimento e produção em sete conjuntos de campos em águas rasas (totalizando 30 concessões), localizados nos estados do Ceará, Rio Grande do Norte, Sergipe, Rio de Janeiro e São Paulo. Do total das 30 concessões a produção média de petróleo e gás natural, no primeiro semestre de 2017, foi de 73 mil barris de óleo equivalente por dia, sendo que desse total 52 mil barris são produzidos somente na Bacia de Campos, o que equivale a 71,2% da produção anunciada para venda.

O anúncio mais recente da venda das concessões pela Petrobrás foi feito através de Polos produtivos, os quais enquadram mais de um campo produtor. No caso específico da Bacia de Campos, foram listados a venda das operações em 14 campos: Marimba, Enchova, Bonito, Enchova, Enchova Oeste, Bicudo, Piraúna, Badejo, Pampo, Linguado, Trilha, Carapeba, Vermelho e Pargo. A produção desses 14 campos conta com a operação de 14 plataformas, tendo uma produção médiade Petróleo em maio de 2017 de 53.147 bbl/dia (mil barris por dia) e de 671 Mm3/dia (mil metros cúbicos por dia de gás natural), o que representa 5,10% da produção total da Bacia, segundo dados da Agência Nacional de Petróleo (ANP). A se considerar o atual preço do barril (50 dólares), significa que a Petrobras está disposta a abrir mão de uma receita diária de 2,650 milhões de dólares somente com essa venda anunciada da operação na Bacia de Campos.

Há ainda a venda das plataformas que estão presente nestes campos, causando imenso impacto para a região e seus funcionários, que deverão ser deslocados para outras áreas produtoras da Petrobrás. Segundo dados levantados pelo SindipetroNF, há cerca de 1.030 funcionários da Petrobrás trabalhando nessas plataformas, o que representa quase 18% dos funcionários na Empresa locados na Bacia de Campos. Além do transtorno da realocação para esses funcionários, há um enorme custo econômico para a região do norte fluminense, que já passa por grave crise econômica.Apesar de parte dessestrabalhadores serem recompostos no futuro pelas novas empresas concessionárias, a recomposição será parcial e realizada com um maior grau de precarização do trabalho, basta comparar a operação de uma plataforma da Petrobrás com qualquer outra de empresa privada. Não bastasse isso, a precarização está garantida pela aplicação da nova lei trabalhista, permitindo uma séria de mudanças prejudicais para o trabalhador.

Plataformas sobre Plano de Privatização de 28/07/2017

Plataforma

Petróleo bbl/dia

 Mm3/dia

Número de Empregados

PETROBRAS 08 – Marimbá

16.642

154

131

PLATAFORMA DE PAMPO-1

12.275

230

134

PLATAFORMA DE ENCHOVA

8.048

191

120

PLATAFORMA DE CARAPEBA-I

5.124

14

48

PLATAFORMA DE VERMELHO-I

2.969

16

23

PETROBRAS 09

2.404

48

151

PLATAFORMA DE PARGO-1A

2.279

10

122

PLATAFORMA DE CARAPEBA-II

1.651

4

25

PLATAFORMA DE VERMELHO-II

1.142

4

23

PLATAFORMA DE VERMELHO-III

613

3

25

PETROBRAS 15

0

0

161

PETROBRAS 07

0

0

PETROBRAS 65

0

0

70

PETROBRAS 12

0

0

 

Total

53.147,3

671,1

1033

Média

5.905,3

74,6

86

Participação dentro do Total da BC-RJ

5,10%

3,82%

17,81%

Fonte: elaboração DIEESE com dados da ANP e do SindipetroNF.

A própria manutenção da produção por essas plataformas se encontra em risco com a saída da Petrobrás da operação. A produção de campos maduros, diferentemente do que tem sido divulgado em alguns meios de comunicação, são campos extremamente produtivos, como os dados apresentados acima sob a rentabilidade diária dessas plataformas. Tecnicamente falando, os campos que não são mais produtivos comercialmente são caracterizados como campos marginais. Os campos maduros são regiões que já se encontram em sua fase decrescente de produção, mas ainda possuem alta produtividade e lucratividade. Contudo, a manutenção dessa produção em campos maduros demanda investimentos específicos em ‘recuperação secundária’ desses poços. Para uma empresa do porte e ‘expertise’ como a Petrobrás, esses investimentos representam um pequeno esforço, ao contrário do impacto para empresas menores com menores recursos materiais e financeiros para a realização dessas operações.

Ao invés de uma defesa inconteste da importância da manutenção da Petrobrás nos campos maduros como empresa nacional e com grande importância para o desenvolvimentodo país, foi promulgada em 8 de junho uma Resolução pelo Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) que estabelece vários parâmetros para intensificar a entrada de novas empresasna exploração dos campos maduros. Entre as várias diretrizes se destaca a possibilidade de diminuição em até metade dos valores dos Royalties pago pelas empresas concessionárias.

O argumento que a diminuição dos royalties promoverá aumento dos investimentos com geração de emprego é mais um dos mitos criados por trás dos interesses de: privatização da Petrobrás, venda dos recursos naturais brasileiros e precarização do trabalho com a entrada das empresas internacionais no novo regime trabalhista. Não é simplesmente abaixando os valores de pagamentos de participações governamentais que atrairá investimentos no setor, pelo contrário, o interesse está na quantidade de petróleo e gás disponíveis para exploração. Assim, a diminuição dos royalties não irá gerar mais investimento e emprego no Brasil, muitos menos nas regiões produtoras de petróleo.

Segundo dados da ANP, do total de R$ 11,8 bilhões em royalties concedidos em 2016 pela exploração de petróleo, 28,9% foram destinados para os Estados e 34,35% para os municípios da União. O Rio de Janeiro obteve 58% desses royalties. As três cidades com maior arrecadação de royalties do Brasil em 2016 foram: Campos dos Goytacazes (R$ 300 milhões), Macaé (R$ 293,5 milhões) e Maricá (R$ 179 milhões), justamente cidades com campos maduros em que a nova resolução sobre os royalties afetaria diretamente.

            Além dos Estados e Municípios, os royalties oriundos da produção do petróleo também são destinados para áreas como o Fundo Social e ‘Educação e Saúde’, tendo sido destinados no ano de 2016: R$ 1,5 bilhões para o Fundo Social e cerca de R$ 42 milhões para Educação e Saúde. O valor recebido em royalties pelos municípios produtores representa uma grande parte das suas receitas, o que é extremamente importante dado os enormes impactos que são gerados pela produção petroquímica.

            A diminuição dos royalties a serem pagos pelas empresas serão mensurados sobre a produção incremental, sendo esta calculada considerando o declínio histórico do campo. Através de uma estimativa do DIEESE/SindipetroNF sobre o declínio na Bacia de Campos e levando-se em conta os novos patamares dos valores de referência do petróleo e gás, a nova resolução promoverá, somente com o volume produzido pelas 14 plataformas à venda,uma diminuição anual de Royalties no valor de R$54 milhões, montante superior à todo o valor destinado para ‘Educação e Saúde’ no ano de 2016.

Além disso, vale chamar atenção para o fato de que estes campos de petróleo foram adquiridos pela Petrobrás na “Rodada Zero”, momento em que a Petrobrás perdia o Monopólio de exploração no Brasil e “escolhe” quais campos tem interesse em continuar produzindo ou devolveria a ANP (recém-criada). As plataformas produtoras destes campos maduros, anunciadas para venda pela Petrobrás, foram todas adquiridas nesta ‘Rodada Zero’, e, naquele momento, não havia cláusula de obrigação de investimento em conteúdo local. Quem comprar o direito de exploração destes campos e suas plataformas de operação, estarão desobrigados de investimentos mínimos em conteúdo local.

Diferentemente dos investimentos realizados por uma empresa nacional, pública e com intenções de promover o desenvolvimento do país, os investimentos realizados por empresas internacionais, sem obrigação com conteúdo local, serão realizados em sua grande maioria no exterior. De forma semelhante ao já que tem sido feito pelas empresas privadas no setor de petróleo, como o caso da norueguesa Statoil que comprou da holandesa Heerema as plataformas para instalação no campo de Peregrino, os novos investimentos nos campos maduros com menores taxas de royalties gerarão empregos e desenvolverão a economia dos países ditos desenvolvidos que disputam com o Brasil o mercado de E&P.

A abdicação dessa fonte de recursos e não garantias de investimentos em conteúdo local, com o objetivo de favorecer os já extraordinários lucros dos investimentos das empresas privadas no setor de petróleo, terá um forte impacto para na renda e no emprego da região do norte fluminense. Abrir mão da presença da Petrobrás operando estes campos, reduzir as receitas dos municípios (em royalties) e não garantindo investimentos em compra de máquinas e equipamentos na região, poderá dificultar ainda mais a recuperação dos municípios do Norte Fluminense, pois impossibilitará a promoção de políticas públicas para o desenvolvimento local, ficando ainda mais dependente dos investimentos privados do petróleo. O esforço político deveria estar centrado no fortalecimento da Petrobrás como empresa pública e agente fundamental para o desenvolvimento nacional. A empresa pública, principalmente de um recurso tão valioso quanto o petróleo, possui uma função essencial no desenvolvimento de uma sociedade mais justa e igualitária. Abdicar das empresas públicas é abdicar do desenvolvimento econômico e social de uma região e seu país.

Fonte: Elaboração DIEESE com base em dados da ANP e do site ‘Compara Brasil’.


* Graduado em Economia pela FEA-USP, mestre e doutorando em Economia Política pelo IE-UFRJ. Pesquisador visitante no departamento de Sociologia Universidade BUAP no México, trabalhou como pesquisador no Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (IBASE). Atualmente é economista pelo DIEESE na subseção do SINDIPETRO-NF.