Efeitos são devastadores sobre empregos e arrecadação de impostos no Norte Fluminense
A forte redução do investimento da Petrobras na Bacia de Campos, de 62% entre 2013 e 2018, segundo estimativa do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), tem levado ao esvaziamento econômico das cidades do Norte Fluminense.
Milhares de empregos foram ceifados, a arrecadação de impostos caiu bruscamente e atividades que dependem da renda gerada pelo trabalho direto ou indireto da empresa, como o comércio e os serviços, lutam para se manter.
Os dados de investimento na Bacia de Campos não são divulgados publicamente pela Petrobras. Contudo, o Dieese estima a partir de dados e planos de negócio da empresa, que os investimentos passaram de US$ 9 bilhões em 2013 para US$ 3,4 bilhões em 2018. De 2010 a 2020, 38 plataformas deixaram de ser operadas, seja por paralisação, venda ao setor privado ou hibernação.
Sob o efeito da nova política de saída da empresa da Bacia de Campos, em Campos dos Goytacazes e em Macaé, 56 mil postos de trabalho foram fechados de 2014 a 2018, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Isso corresponde a 20,7% do total de empregos nos dois municípios. Neste período, o contingente de trabalhadores passou de 270.377 para 214.435.
Somente a Petrobras cortou 25% dos empregos de 2014 a junho de 2020 na Bacia de Campos. Foram 4.282 postos de trabalho extintos, a maioria por meio de Plano de Demissão Voluntária. Para cada quatro postos de trabalho da companhia na bacia, um foi fechado.
Corte de 55% no setor privado
No setor privado de petróleo, que inclui os postos de trabalho terceirizados da Petrobras e de empresas privadas, o Dieese estima redução de 55% em junho de 2020 em comparação ao contingente que existia em 2014. Isso significa que 21.736 postos de trabalho evaporaram neste período.
Em 2014, o setor privado petroleiro do Norte Fluminense empregava 39.556 pessoas. Em 2016, o total de trabalhadores caiu para 24.670. Dois anos depois, já eram 19.322. Em junho de 2020, o total de trabalhadores desse segmento era de apenas 17.822 – menos da metade do que havia em 2014.
A partir de 2014, quando a Operação Lava-Jato começou e o preço do barril do petróleo registrou forte queda, a Petrobras vem reduzindo sistematicamente seus investimentos na Bacia de Campos, mesmo com a recuperação do petróleo no mercado internacional. A empresa está transferindo recursos da Bacia de Campos para as áreas do pré-sal da Bacia de Santos e tem vendido campos e blocos de exploração e produção. As empresas privadas que comprarem essas áreas, contudo, não aportarão o mesmo montante de recursos que a Petrobras investia devido aos riscos associados à atividade.
Queda de renda e consumo
Com a forte queda do emprego direto e indireto da Petrobras, a renda e o consumo nos municípios da região despencaram. Os setores do comércio e dos serviços sentiram os efeitos da política empreendida pela companhia desde a gestão Michel Temer e, mais profundamente, com a atual gestão de Roberto Castello Branco, sob o governo Jair Bolsonaro.
De 2015 para 2019, somente as cidades de Campos dos Goytacazes e Macaé perderam 21.143 postos de trabalho apenas nesses dois setores da economia, segundo dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), do Ministério da Economia.
No comércio, foram cortados 5.156 empregos. Nos serviços, 15.987 vagas evaporaram. É importante ressaltar que os dados abrangem apenas os empregos com carteira assinada. Estima-se uma redução ainda maior, se considerado o trabalho informal.
O quadro em 2020 só piorou. Com o aprofundamento da crise econômica brasileira e a chegada da pandemia da Covid-19, em março, o comércio e os serviços enfrentam grandes dificuldades para faturar. Dessa forma, esses setores continuam a demitir pessoas, reduzindo ainda mais a capacidade de a economia reagir.
Vendas menores em comércio e serviços
Se olharmos para todo o país, o comércio varejista, por exemplo, apresentou redução de 5% no volume de vendas de janeiro até agosto, em comparação com igual período do ano passado, de acordo com dados do IBGE. No estado do Rio de Janeiro, a retração nas vendas foi ainda maior, de 5,9%.
Já o setor de serviços amarga situação mais dramática e apresentou queda de 9% no ano no volume de vendas, no acumulado dos oito primeiros meses de 2020 em relação a igual período de 2019. Na economia fluminense, o setor registrou volume de vendas 6,9% menor no mesmo comparativo.
Os municípios sofrem com caixa menor para investir em serviços públicos, como saúde, educação e assistência social. Com menos produção de petróleo, cai a arrecadação de royalties. E com menos emprego e renda, a arrecadação de ISS (Imposto Sobre Serviços) despencou.
A situação é mais dramática em Campos dos Goytacazes, onde royalties e participações especiais (compensação cobrada de campos com grande produção de petróleo e gás) respondem por 25% a 30% da arrecadação total do município.
Em 2019, Campos recebeu em royalties e participações especiais valor inferior ao referente a 2003. Em valores correntes, a cidade teve R$ 475 milhões em 2003 e R$ 454 milhões no ano passado. De 2008 a 2014, Campos arrecadou valores próximos a R$ 1 bilhão ao ano, com recorde em 2012, de R$ 1,35 bilhão.
Menor repasse de royalties em 18 anos
Em junho deste ano, o município registrou o menor repasse mensal de royalties dos últimos 18 anos: R$ 9,8 milhões, cifra só comparável a abril de 2002, de R$ 9,6 milhões. O efeito da pandemia de Covid-19 sobre a produção de petróleo na região não é suficiente para explicar cifra tão baixa.
A redução tem relação direta com a produção decrescente da Bacia de Campos. Se em 2015 a produção da bacia era de 1,8 milhão de barris ao dia; em agosto de 2020, era de 990 mil barris ao dia, de acordo com a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP).
Em um efeito secundário, estendido às muitas empresas que prestam serviços à empresa, houve queda forte do Imposto Sobre Serviços (ISS), que incide sobre o comércio e os serviços. A renda mingou nas cidades do Norte Fluminense e a economia travou, com muitos estabelecimentos fechando suas portas.
Em Campos, a arrecadação de ISS passou de R$ 110 milhões em 2014 para R$ 87 milhões em 2019. Em Macaé, caiu de R$ 612 milhões para R$ 491 milhões no período. (Foto: Tânia Rêgo / Agência Brasil)