Jaqueline Deister / Do Jornal Brasil de Fato – Demissões, redução de salários, aumento de jornada, falta de transparência com relação ao número de trabalhadores contaminados pela covid-19 e fechamento de plataformas são alguns dos problemas vivenciados diariamente pelos trabalhadores da Petrobras durante a pandemia.
De janeiro a junho deste ano, 56.473 trabalhadores terceirizados da Petrobras nas atividades de “Apoio à Operação Direta e Indireta” e “Parada de Manutenção” foram demitidos. O levantamento foi compilado pelo economista e técnico do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), Cloviomar Cararine, com base em dados de sindicatos representantes de profissionais terceirizados da companhia em todo o país.
O Sudeste concentra o maior número de funcionários deste setor, somando, ao todo, 37.245 trabalhadores e 5.146 demissões no período. Na região, o estado do Rio de Janeiro foi um dos mais impactados: além de encerrar contratos de terceirizados, perdeu arrecadação com a diminuição da produção.
“O principal efeito para o Rio foi a redução de arrecadação, o segundo efeito é o emprego. A gente começa a perceber que os trabalhadores do setor também sofrem. Por conta da pandemia, vários trabalhadores tiveram que ir para as suas casas. O caso do Comperj [Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro], por exemplo, que as obras estavam andando e teve que parar. E as empresas terceirizadas demitiram alguns trabalhadores porque a Petrobras reduziu a demanda”, detalha o economista.
Durante a crise causada pela pandemia, a empresa adotou o chamado “Plano de Resiliência da Petrobras”, que entrou em vigor em 1º de abril. Dentre as medidas, o programa estabelece a redução temporária da jornada de trabalho dos empregados do regime administrativo, de oito para seis horas diárias, com a redução proporcional da remuneração em 25%, nos meses de abril, maio e junho de 2020.
No Rio, no entanto, a decisão foi barrada no mês de maio pelo presidente do Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região (TJ-RJ) em resposta a uma ação civil pública protocolada por cinco sindicatos da categoria. A medida afetaria aproximadamente 16 mil funcionários do setor administrativo da companhia que estão alocados no estado. Ao todo, a Petrobras tem 21 mil funcionários no setor.
Covid-19
Já parte dos trabalhadores da área operacional, cerca de 49% das plataformas e 37% das refinarias, que se enquadram no grupo de risco, foram deslocados para home office, também com redução de salário. Entre os que continuaram atuando nas plataformas e refinarias, há a preocupação diária do risco de contágio pela covid-19.
O Brasil de Fato conversou com um profissional que atua embarcado na Bacia de Campos dos Goytacazes, no Norte Fluminense, que preferiu não se identificar, sobre os protocolos de segurança adotados pela Petrobras para proteger os trabalhadores que atuam em plataformas. Segundo o trabalhador, que contraiu a covid-19 na plataforma, as medidas da empresa não foram colocadas em prática desde o início por algumas gerências de plataforma e isso gerou uma explosão de casos da doença entre os meses de maio e junho.
“Houve negligência no início. A empresa adotou um bom protocolo. No meu caso, a minha gerência optou por não seguir aquele protocolo inicial e houve esse impacto. Diante do que aconteceu, inicialmente a estrutura era bem mais precária, cheguei no hotel em Itaboraí [RJ] e não tinha uma ambulância disponível. O hospital era público, não era de rede conveniada. Depois que nos transferiram para um hotel com mais condições de estrutura médica”, conta.
De acordo com o médico Ricardo Duarte, que atua no Sindicato dos Petroleiros do Norte Fluminense (Sindipetro-NF), a Petrobras não tem sido transparente com a divulgação de dados de contaminados por covid-19 na empresa e isso dificulta o acompanhamento do real panorama da doença. A contagem é feita de forma parcial e por semana desconsiderando o número total.
“Hoje dizem que testam e tem testado, mas fazem testagem rápida e não molecular, mas a interpretação que dão para as testagem tem colocado em risco os trabalhadores, porque dizem que num teste rápido independente, que pode não dar um resultado verdadeiro, se ele der os anticorpos, principalmente, o IgG, eles dizem que a pessoa não precisa testar nunca mais, é uma pessoa considerada com anticorpo para a doença. E isso não é verdade”, detalha o médico.
Outra questão é a segurança para atender o funcionário contagiado e evitar o contato com aquele que não está. “O primeiro problema é transporte, chegar e sair para o embarque e pegar helicóptero que não tem garantia do distanciamento mínimo necessário. Tem muito problema com a comida nas refinarias e terminais, a pessoa tem que sair e ir para um restaurante central porque as copas foram fechadas”, complementa.
Responsabilidade
Em meio ao cenário de incertezas, na última quinta-feira (24), a Federação Única dos Petroleiros (FUP) entregou à Petrobras a pauta de reivindicações da categoria petroleira no processo de aprovação do Acordo Coletivo de Trabalho (ACT) de 2020.
O documento exige que a empresa tenha previsibilidade nas ações da companhia em relação a seus trabalhadores, o que inclui negociar com os representantes sindicais medidas como o retorno às atividades presenciais durante a pandemia de covid-19 e as regras para implementação do teletrabalho.
Deyvid Bacelar, coordenador geral da FUP, explica que a pauta de reivindicação tem como base a defesa dos direitos dos trabalhadores, da soberania nacional e da energia renovável.
“Várias empresas privadas estão renovando os acordos. Ninguém quer confusão. A gestão Castello Branco [presidente da Petrobras] quer impor uma série de mudanças neste momento. A Petrobras é uma empresa integrada que vai desde a exploração e produção de petróleo e gás até à termelétricas, biocombustíveis, energias renováveis. Essa gestão quer se desfazer de tudo isso. Cobramos o início de uma negociação sobre o pós-pandemia, a retomada das atividades das pessoas que estão em teletrabalho, uma posição contrária as privatizações e a pauta da negociação coletiva do acordo coletivo de trabalho”, ressalta Bacelar.