Petroleiros em Greve

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Editorial

Organização que atordoa a Petrobrás

O nível de organização dos petroleiros é algo difícil de ser atingido pela grande maioria das categorias de trabalhadores brasileiras. E isso não se diz por elogio gratuito em um veículo oficial de uma entidade representativa destes profissionais. Diz-se, antes, pelo reconhecimento de uma construção contínua, de longo prazo, que requer zelo constante. E também para que se tenha noção da responsabilidade que a solidariedade de classe impõe à relação entre os petroleiros e as demais categorias.
A sofisticação de um indicativo que prevê algo complexo como uma greve com parada de produção “a qualquer momento a partir do dia 17” não é algo que pode passar despercebido pela categoria. É como dizer para a empresa: a partir de zero hora desta quinta tudo pode acontecer, inclusive nada. E esse tudo ou esse nada pode durar uma, duas, três, quatro horas ou um tempo indeterminado. Pense com a cabeça do empregador: como enfrentar um contingente assim?
Foram décadas de aprendizado, especialmente após os anos 90, quando a categoria enfrentou a onda neoliberal que “flexibilizou” o monopólio estatal do petróleo e quase acabou com a Petrobrás.
Foi necessário levar em consideração fatores como o crescimento da terceirização, a elevação da automação das áreas operacionais e as estratégias da empresa para atrair pelegos para as suas fileiras — incluindo a criação de vários níveis de chefias, para dar a ilusão de que os trabalhadores agraciados com os cargos são diferentes dos demais.
Some-se a isso a característica de construir greves e outros movimentos com trabalhadores espalhados em 46 plataformas marítimas, além das bases de terra, com trocas nos turnos e necessidades especiais de comunicação (muitas vezes boicotadas pela empresa).
Os seminários de greve realizados pelo Sindipetro-NF foram essenciais para consolidar este saber e esta experiência. Nos últimos anos, incluindo este 2013, representantes da categoria se reúnem para discutir, fora do calor das mobilizações mais intensas, friamente portanto, os pontos onde são possíveis avanços na organização dos trabalhadores.
É fruto de momentos de debates internos como estes a criação de estratégias para dar um “cansaço” nos pelegos, que antes só ficavam com a melhor parte das mobilizações: polpudas horas extras e todos os benefícios que os trabalhadores conquistaram na luta. Em razão disso, cresceu na categoria a convicção de que novos formatos de greves deveriam ser criados, assim como diminuiu a paciência com quem trai a categoria.
Cada vez mais o trabalhador sabe com quem contar, com quem falar e a quem ouvir. Isso é que tem tornado possível essa agilidade que atordoa a Petrobrás. E estes dias serão, mais uma vez, feitos de momentos onde esta sintonia será exercida.

Espaço aberto

A multidão: está nascendo um novo líder

André Martins*

Uma multidão e muitas questões cabem em um manifesto. Todo manifesto, seja artístico, cultural ou político mobilizou a voz, a vida e o corpo ativo dos brasileiros em gritos por liberdade. Assim foi na luta por uma república, pela abolição da escravatura, pela derrubada da ditadura civil-militar, por eleições e por democracia. Sindicatos, partidos, escolas de samba e associações surgiram a partir dessas manifestações. 
A própria criação da imprensa em nosso solo se deve muito mais à luta popular, que queria ver escrita em papel os protestos por fazer ou suas lutas que o poder queriam ver esquecidas, do que à rotina do cotidiano da vida em um mero diário. É uma narrativa que incorpora a luta do passado ao presente das lutas que travamos na rua e no local de trabalho, e antecipa e transforma nossos sonhos em futuras conquistas. É a memória que irá mobilizar mentes e corações. 
Essa narrativa não pode e não tem o dom de iludir, pois os atores e os autores dela mesmo, a narrativa, vivem a tragédia da redução dos efetivos no local de trabalho, dos direitos (de protestar e de reivindicar) e dos salários. 
Queremos escrever a luta que fazemos. Fazer com que nossa voz chegue ao povo na rua. Se antes nossa voz clamava por ser ouvida nos tribunais, no planalto ou no congresso, hoje não nos interessa, queremos uma multidão para amplificar a nossa voz e lutar. Que os trabalhadores (o que restou deles) montem banca na praça, levantem suas bandeiras e divulguem os manifestos populares em defesa de um modo de vida que não seja este. Este modo de vida atual que não pode ser analisado e reinventado por uma multidão de pessoas não está valendo à pena ser vivido. Para que os direitos sociais sejam garantidos de novo e que as esperanças sejam renovadas, lutemos nas praças, lutemos nas ruas! Que uma multidão se levante que a hora está chegando! É preciso acordar a multidão e trabalhar por um novo modo de vida!

* Petroleiro da P-52.

PETROLEIROS EM GREVE

Primeiro dia de paralisação marcado por trancaços na UO-Rio e em Cabiúnas, protesto na Justiça e denúncia na Polícia Federal contra cárcere privado nas plataformas

 Petroleiros de todo o país iniciaram à 0h de ontem uma greve por tempo indeterminado que começa a reunir elementos que a tornarão histórica. Na Bacia de Campos, 43 plataformas, das 46 em operação, e todas as bases de terra aprovaram o movimento. Nas duas primeiras horas da paralisação foi possível contabilizar as entregas de 39 unidades às equipes de contingência da Petrobrás, os chamados pelegos. Destas, 15 foram entregues com a produção parada.
 O movimento também foi forte nas bases de terra, com a realização de um trancaço surpresa no prédio administrativo da UO-Rio, em Macaé, protesto em frente à Justiça do Trabalho e corte de rendição nos turnos do terminal de Cabiúnas (veja nas demais matérias desta edição).
 A Petrobrás tentou desmobilizar a categoria com a utilização do recurso autoritário do interdito proibitório, uma decisão liminar da Justiça que busca impedir a realização da mobilização sob a alegação de que a produção não pode parar. Gerentes de algumas unidades chegaram a coagir trabalhadores a assinarem cartas de convocação ao trabalho. O sindicato denunciou estas manobras e tranquilizou a categoria sobre a impossibilidade de haver consequências jurídicas individuais em relação à greve. Quando a paralisação é deflagrada, todas as relações se tornam institucionais e coletivas, tornando-se suspensa a hierarquia direta de chefes sobre empregados. Qualquer assunto passa a ter que ser tratado diretamente entre a empresa e o sindicato.
 Em comunicado à sociedade, publicado nos jornais regionais de ontem e em seu site, o Sindipetro-NF explicou que a greve foi motivada por uma proposta rebaixada de Acordo Coletivo e de pagamento de Participação nos Lucros e Resultados Futura, apresentadas pela Petrobrás no último dia 7. Além de uma nova proposta de Acordo Coletivo, os petroleiros exigem a suspensão imediata do leilão de Libra, que está previsto para acontecer no próximo dia 21, e a retirada do Projeto de Lei 4330, que trata da regulamentação da terceirização e aguarda votação na Câmara dos Deputados.  
 O sindicato também informou que as entidades representativas dos trabalhadores tentaram por vários anos um acordo com a Petrobrás para regulamentar a greve, mas a empresa não aceita negociar produção mínima de óleo e gás. A diretoria do sindicato reafirmou que tem todo interesse em atender as necessidades inadiáveis da população e que está aberta a essa negociação com a empresa.

Cabiúnas: Assédios não impedem movimento forte no Tecab

 No Terminal de Cabiúnas, o movimento de Greve começou junto com as plataformas, à 0h. Desde a mudança de turno das 23h da quarta, 16, não houve rendição. A própria Transpetro não enviou transporte para pegar os trabalhadores do turno da zero hora em casa. A diretoria do NF esteve presente na frente do terminal com os trabalhadores na virada para o início da greve. Pela manhã, foi realizada uma assembleia com trabalhadores administrativos, que aprovaram o movimento. Durante o dia, os dois portões do terminal com acesso para a BR foram mantidos fechados.

Assédio até por SMS

O Sindicato  recebeu denúncia de que alguns coordenadores e supervisores do Tecab estão assediando os trabalhadores, por meio de ligações e torpedos, pressionando para que desistam da greve.
 Mesmo com o assédio, o movimento seguiu firme no Terminal, com adesões do turno e do administrativo, sendo a grande maioria da manutenção.

PCE-1: Produção mantida com vazamento

 Nas primeiras duas horas do movimento de greve, iniciado 0h de ontem, foi possível consolidar um quadro de entrega das plataformas para operação das equipes de contingência da Petrobrás, os chamados pelegos. Em muitos casos, a unidade foi assumida sem que a empresa pudesse manter a produção com segurança. 
 Um dos casos foi o de PCE-1, que, de acordo com denúncia dos trabalhadores, pelegos operaram a unidade mantendo um vazamento de petróleo no oleoduto. Os petroleiros a bordo chegaram a verificar a subida de cinco bolhas por segundo no mar. O sindicato denunciou o caso aos órgãos ambientais competentes.
P-19
 Na P-19, a equipe de contingência da Petrobrás não conseguiu colocar a unidade para produzir. Até o final da tarde de ontem, no horário de fechamento desta edição, ainda enfrentavam problemas com os turbo compressores.

Cárcere privado : Protesto, audiência e denúncia na PF

Polícia federal abre inquérito. Na Justiça, manifestação e audiência sem conciliação

 O Sindipetro-NF concentrou parte dos seus esforços de mobilização ontem, no primeiro dia de greve, para denunciar o cárcere privado de petroleiros a bordo de plataformas da Bacia de Campos. Algumas gerências estão mantendo embarcados petroleiros grevistas que querem e têm o direito de desembarcar. Os casos foram levados à Polícia Federal, que abriu inquérito para apurar. A situação também foi discutida em audiência na Vara do Trabalho em Macaé, que não levou a uma conciliação. A expectativa é a de que a Justiça se posicione hoje sobre a questão.
 O sindicato busca de todas as formas garantir o desembarque dos trabalhadores o mais rápido possível. A entidade orientou a categoria a se manter firme na luta e, no momento do desembarque, priorizar o pessoal das equipes de emergência e brigada, que estão sofrendo o maior assédio por conta da empresa.
Protesto
 A audiência na Justiça foi marcada após protesto realizado pelos petroleiros em frente ao prédio da Justiça do Trabalho. A diretoria do NF e cerca de 100 trabalhadores se concentraram no local para pressionar por uma decisão sobre o pedido de desembarque dos trabalhadores. O sindicato recebeu denúncia que trabalhadores foram mantidos em cárcere privado pela Petrobrás, a bordo das plataformas. As primeiras denúncias sobre esta situação foram encaminhadas por 15 plataformas ao NF. 
 Outras formas de assédio também foram identificadas ao longo do primeiro dia da greve. Na P-37, a gerência da unidade chegou a ameaçar de demissão os trabalhadores que integram as equipes de brigada e baleeira que estão em greve. Na P-48, antes mesmo da deflagração da paralisação, ameaça semelhante também havia sido feita, só que de modo generalizado, para todos os trabalhadores que aderissem à greve. Nos dois casos os petroleiros se mantiveram firmes no movimento.

Comunicação

Rádio NF terá balanço diário da greve

 Enquanto durar a greve nacional dos petroleiros, a Rádio NF manterá um programa ao vivo, às 21h30, com uma hora de duração, para fazer o resumo do dia na mobilização, todos os dias da semana. O Balanço da Greve também terá reprises ao longo da madrugada.
 Além do programa das 21h30, a Rádio NF também terá informações sobre a greve no seu informativo diário 15 Minutos, às 20h, e na programação ao vivo com os locutores no estúdio entre as 8h e 18h, de segunda a sexta-feira.
 Os conteúdos dos programas 15 Minutos e Balanço da Greve poderão ainda ser baixados para ouvir a qualquer momento, em www.radionf.org.br.

Bases administrativas

Trancaço surpresa começa por base da UO-Rio em Macaé

 A diretoria do Sindipetro-NF, membros da categoria petroleira e do MST se concentraram a partir das 6h de ontem na entrada do Prédio Cajueiros, que abriga a UO-Rio em Macaé, e realizaram um trancaço na base. Foi uma das atividades surpresa da greve. Outros trancaços e protestos estão previstos.
 O sindicato escolheu o prédio da UO-Rio para realizar a mobilização em represália ao autoritarismo com que a gerência vem tratando a categoria. De acordo a entidade, há casos de perseguições a trabalhadores nos horários das refeições, impedimento de retorno de dirigentes sindicais à base, assédio moral aos seguranças que participam dos movimentos, entre outros fatos considerados graves pelos dirigentes sindicais.
 A orientação do NF para as bases administrativas é a de que os trabalhadores não devem entrar nas instalações da empresa, seguindo para sede do sindicato em Macaé para receber orientações sobre como participar das atividades da greve.
Reuniões nas sedes 
 Para hoje está prevista reunião com todos os grevistas às 17h, no sindicato em Campos e em Macaé. Ontem, as reuniões foram lotadas nas duas sedes, com mais de 180 pessoas em Macaé e cerca de 70 em Campos.

Normando

Brasil precisa de outra Petrobrás

Trato de uma cultura de gestão de pessoal onde a agressão moral, a ameaça e a mentira, se tornaram ferramentas de trabalho. É escandaloso o número de trabalhadores assediados, afastados por distúrbios psíquicos, feridos em sua dignidade humana. E isso é ainda mais evidente às vésperas de uma greve.
As ameaças iniciam pelas mais subjetivas e cotidianas. Um “tratamento” ao qual está submetida parcela significativa da Bacia de Campos: negar possibilidades de desenvolvimento profissional, discriminar na distribuição de tarefas, subestimar na avaliação de desempenho, excluir de níveis por merecimento.
Outro tipo de ameaças visa à remuneração. Excluir das horas extras, ou do pagamento delas, e retirar do regime de trabalho. Por fim, existem as ameaças de punições e de despedida do empregado, com ou sem justa causa. Tudo calcado na principal ferramenta de gestão da Petrobrás, a mentira.
Muitos trabalhadores cedem, acreditando que concordar com o agressor não tem maiores consequências. Erram por não perceberem a real tradução das ameaças. O que os agressores querem realmente dizer é: quem manda na sua vida sou eu, sua mulher perderá a AMS, e seus filhos estudarão em colégio público, na hora que eu bem entender!
É esse o real significado das ameaças que constroem o “sagrado” direito de furar a greve. É a isso que cada um de vocês estará cedendo. Não reclamem, depois, ao perceberem que algo muito mais valioso do que dinheiro lhes foi roubado.
A Presidenta da Petrobrás, e todos os demais diretores e gerentes executivos, pelo menos, sem exceção de tudo isso sabem, e nada jamais fizeram. Logo, devem julgar esse “método”, eficaz.

Curtas

Manifesto P-18
Petroleiros da P-18 se somaram à crescente onda na categoria pela punição dos “pelegos”. Manifesto dos trabalhadores com esta reivindicação está disponível na íntegra no site do Sindipetro-NF, e tem acesso direto pelo link http://bit.ly/17ugdyI .

Imagem 39
Começou a circular nesta semana nas bases e nas sedes do NF a edição 39 da revista Imagem. A publicação destaca a luta da sociedade brasileira contra os leilões dos campos de petróleo. O conteúdo também está disponível emwww.sindipetronf.org.br.

Curtinhas
** O Sindipetro-NF publicou ontem nos jornais de Macaé (O Debate e O Diário Costa do Sol) e Campos dos Goytacazes (O Diário e Folha da Manhã) nota oficial sobre o movimento de greve, expondo as razões da paralisação e tranquilizando a população sobre o abastecimento.
** Os petroleiros da Bacia de Campos que estão desembarcando participam, nas sedes do NF, de atividades da greve e de reuniões com os dirigentes sindicais.
** Até o fechamento desta edição, a greve dos petroleiros seguia forte em todo o país. Confira o quadro nacional emhttp://bit.ly/1i05W2b.