Quantos petroleiros devem morrer para a Petrobrás assumir compromisso com a vida?

Imprensa CUT – Técnico de operação há 12 anos da RPBC (Refinaria Presidente Bernardes), em Cubatão, Antonio Carcavalli, 58, também conhecido como ‘xerife’, por sua capacidade de organizar os companheiros quando a tensão crescia, não poderá mais desfrutar da aposentadoria prevista para sair em agosto.

Após 21 dias de luta no hospital contra o coronavírus, o petroleiro faleceu no último dia 31 como um símbolo do desprezo pela vida que a direção da Petrobrás apresenta diante da pandemia de Covid-19. Seguindo simetricamente a postura negacionista da pandemia adotada pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido).

A dor de companheiros e familiares é ainda maior quando se imagina que talvez a morte pudesse ter sido evitada se o comando da companhia não tivesse negligenciado suas responsabilidades, conforme tem denunciado o SindiPetro LP (Sindicato dos Petroleiros do Litoral Paulista).

Carcavalli é um dos 15 petroleiros do chamado grupo cinco que apresentaram sintomas de Covid-19 logo após a Petrobrás interromper o período de isolamento de um trabalhador que aguardava o resultado do teste.

No final de abril, a empresa convocou o petroleiro de volta afirmando que seu teste dera negativo, mas, ao ter acesso ao exame, verificou-se que o resultado era, na verdade, positivo. Porém, ele já se encontrava no CCI (Centro de Controle Integrado) setor sem ventilação e que concentra 30 trabalhadores

Uma semana depois, 15 técnicos de operação do grupo cinco apresentaram sintomas como dor de cabeça, tosse e febre alta a três dias apenas de desfrutarem da folga junto aos familiares após o período de serviço.

Irresponsabilidade total

Mas mesmo com indícios da gravidade da situação que se aproximava na RPBC e com a intensificação das cobranças vindas da CIPA (Comissão Interna de Prevenção de Acidentes), da qual Carcavalli fazia parte, a empresa seguiu ignorando o sindicato e manteve álcool gel em quantidade insuficiente.

A alegação da companhia é que já fornece detergente aos trabalhadores, mas ignora, inclusive, que não há lavatório na sala de controle, onde muitos equipamentos são compartilhados.

Além disso, os petroleiros retornaram do período de isolamento sem qualquer procedimento como análise clínica e testes rápidos.

Ao minimizar a doença, a Petrobrás gerou um cenário caótico na RPBC. Já são 53 petroleiros próprios com a contaminação confirmada e três óbitos.

Além de Carcavalli, perderam a vida por conta do coronavírus o operador de máquinas terceirizado José Roberto Cláudio de Jesus e o mecânico de máquinas também terceirizado José Carlos Nunes Rosa.

Para piorar, como o sindicato não tem acesso aos terceiros, é muito provável que a quantidade de casos seja subnotificada.

Coordenador do Departamento de Saúde e Segurança do sindicato, Marcelo Juvenal Vasco, destaca que os dirigentes denunciavam desde fevereiro a falta de um protocolo adequado para a prevenção com o fornecimento de máscaras e álcool gel na entrada do laboratório, da oficina, de todas as unidades de processo, na sala de controle geral e também no refeitório. Mas todas as solicitações foram ignoradas.

“Cobramos em fevereiro, voltamos a cobrar em março a distribuição de álcool gel e máscaras, mas só entregaram as máscaras aos petroleiros e, ainda assim, no final de abril, 30 dias após o governo de São Paulo ter decretado a pandemia”, criticou.

De acordo com dados da ANP (Agência Nacional do Petróleo), há 403 casos de contaminação em plataforma, mas a FUP (Federação Única dos Petroleiros) denunciou a subnotificação nas informações oficiais.

Caminhos para a vida

Como já é comum na gestão Bolsonaro, a direção da Petrobrás segue resistindo à contribuição do sindicato, que busca alternativas para impedir mais mortes.

“O SindiPetro está tomando todas as medidas para comunicação à vigilância sanitária e ao MPT (Ministério Público do Trabalho). Foi a irresponsabilidade da Petrobrás que custou a vida de nosso companheiro que, inclusive, acabou por transmitir o coronavírus à esposa e ao filho. Felizmente, eles resistiram”, comentou Juvenal.

De acordo com o dirigente, os petroleiros também irão lutar para que o caso de Carcavalli seja reconhecido como acidente e trabalho.

“A contaminação aconteceu dentro da CCI, durante exercício de suas atividades. Vamos lutar para a abertura da CAT (Comunicação de Acidente de Trabalho) e que o óbito aconteceu em ambiente laboral.”