Por Normando Rodrigues
Não surpreende que a narrativa destrutiva do Partido da Imprensa Golpista (d’après Paulo Henrique Amorim) aparte o momento que vivemos da História. Esse é seu papel e, por mais que nos indignemos com escandalizações de canoas de lata, não podemos cair na tentação de culpabilizar a Direita por ser Direita, ou à Elite por pensar somente de acordo com seus mesquinhos e fúteis interesses. Ceder impensadamente a esse impulso é cair na teia imobilista dos grupelhos.
Ignorar a História é vital para a manutenção da dominação ideológica da concentração de renda e da injustiça social. Hoje, por exemplo, o papel dos colunistas da mídia é fazer o trabalhador acreditar que o PT e Lula “destruíram o Brasil”. Para isso comparam o momento atual com… o auge do Governo Lula! Nenhuma análise que qualifique a política econômica do PT como “fracassada” escapa da tautologia de comparar o PT no governo com o PT no governo.
Os argumentos da “quebra” e do “fracasso” se desmancham com o mínimo de História Econômica. Por isso surpreende que a Esquerda a ela não recorra, e prefira chamar o PSDB de feio e bobo. Qual número ou dado estatístico do Brasil, de antes do PT, era melhor do que o do Brasil com o PT no governo? PIB? IDH? Gini? Desemprego? Combate à corrupção? Nenhum! A Petrobrás? Qual número dessa empresa (valor de mercado, empregados, produção, lucros) era melhor em 2002 do que em 2016? Nenhum! O debate não é esse. Simples assim.
A VERDADEIRA DISPUTA
A questão é saber quem fica com que parte do que o país produz, a Casa Grande ou a Senzala. Esse é o verdadeiro debate. E é nesse debate que se pode verificar tanto o verdadeiro conflito de classes quanto os severos equívocos do governo Dilma. Recorro à dominação ideológica, novamente, para o exemplificar. Há algumas semanas um iracundo editorial do “Estadão” esbravejava contra o PT, responsabilizando a “gastança” (vocábulo deles, acreditem…) pela crise econômica atual. Algo como se o “Bolsa Família” tivesse quebrado o Estado.
Não vale invocar o impacto positivo dos programas sociais na qualidade de vida de milhões de seres humanos porque essa não é uma preocupação legítima do eleitorado do “Estadão”. Mesmo o impulso econômico, resultante da inserção de um enorme contingente no mercado, é ignorado. O verdadeiro e imperdoável pecado é usar dinheiro público, sempre antes destinado aos cheirosinhos, em favor dos que não cheiram tão bem. Isso a Elite jamais perdoará, pois há séculos paga proporcionalmente menos impostos, para receber mais do Estado.
A “gastança” social quebrou o Estado? Não. Desde o início do Séc. XX a concentração de renda aumentou em momentos de crise. Foi assim nos dois piores triênios do Brasil, em 1981/83 e em 1990/92. Mas isso não ocorreu em 2009, quando a crise do sub-prime dos EUA, no ano anterior, encolheu nosso PIB (-2%). Porque o Gov. Lula, de forma inédita na História do Brasil, não jogou nos trabalhadores os ônus da crise. As políticas anticíclicas, E a distribuição de renda, aqueceram a economia, e resultaram no PIB de 2010: 7,6%.
CONDIÇÕES × DETERMINAÇÕES
Dentro e fora do Gov. Dilma, entretanto, há uma corrente de pensamento que sustenta não existirem alternativas para o governo, a não ser as do receituário neoliberal. Versões edulcoradas do que prega o FMI e do que Macri faz na Argentina. Não é mais do que o velho truque ideológico de apresentar condições econômicas como se fossem inescapáveis determinações estruturais. Cortar gastos sociais, em detrimento dos trabalhadores, é uma opção política de classes, e não uma necessidade estrutural. Sempre existem opções.
Vejamos o orçamento realizado, ou seja, como foi gasto, em 2014. O maior dispêndio da União, 45,11%, foi para com juros e serviços da dívida pública. Ganha um pudim de leite da vovó quem achar um editorial do P.I.G. que chame essa transferência de dinheiro público para banqueiros de “gastança”. Apenas em 2° lugar vem a sempre vilanizada Previdência, com 21,76%. Com a elevação da taxa básica para os atuais 14,5%, esse montante tende a aumentar. As proporções entre as rubricas, contudo, dificilmente se modificarão.
Uma redução da taxa básica para a casa dos 7% disponibilizaria à União o equivalente, grosso modo, ao orçamento anual da Previdênvia Social. Afastaria investimentos? Matéria de 6 de fevereiro, em “The Economist”, destaca o crescimento do número de países que adota essa política, com destaque para os casos abaixo de 1%: Japão, toda a Eurolândia, Dinamarca e Suíça, seguidos pela Suécia marginalmente acima de 1%. A justificativa desses governos é simples: os bancos foram protegidos da crise pelas políticas públicas. Agora é a hora do troco.