RBA – Aparente avanço institucional, raro no atual momento, o direito de negociação coletiva dos servidores públicos não resistiu à passagem pelo Palácio do Planalto. Michel Temer vetou integralmente o Projeto de Lei 3.831/2015 (e 397/15 no Senado), que “estabelece normas gerais para a negociação coletiva na administração pública direta, nas autarquias e nas fundações públicas dos poderes da União dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios”. O governo alegou inconstitucionalidade, argumento “esdrúxulo”, segundo o Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap). A decisão irritou inclusive a base aliada.
“A aprovação do projeto de lei foi o único avanço para os servidores, desde o impeachment de Dilma: sentar-se à mesa para negociar as demandas, antes de qualquer iniciativa de greve ou paralisação, constitui-se sem dúvida numa demonstração de maturidade das partes envolvidas no processo negocial. Mas o atual governo preferiu a saída mais fácil e cômoda”, afirma o Diap. O projeto havia chegado para sanção presidencial em 27 de novembro. Representantes dos servidores esperavam veto em alguns itens, mas não na íntegra.
No veto, publicado na edição de hoje (18) no Diário Oficial da União, Temer alegou que a medida representava invasão de competência legislativa de estados, municípios e do Distrito Federal, “não cabendo à União editar pretensa normal geral sobre negociação coletiva”. O Diap rebate o argumento, lembrando que em 2010 o Brasil ratificou a Convenção 151, da Organização Internacional do Trabalho (OIT), sobre direito de sindicalização e relações do trabalho na administração pública.
Agora, o esforço precisa ser direcionado para a derrubada do veto no Congresso. O Diap lembra que, para isso, é preciso obter maioria absoluta nas duas Casas (41 votos no Senado e 257 na Câmara).
A regulamentação da negociação coletiva e do direito de greve no serviço público são demandas do funcionalismo que vêm desde a Constituição de 1988. O projeto prevê que a negociação coletiva seja regra permanente, legal, de solução de conflitos.
Há também uma questão em aberto sobre o direito de greve. Há pouco mais de um ano, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu aplicar a Lei 7.789 (Lei de Greve para o setor privado) na área pública, determinando que a administração pode descontar dias parados por greve. Segundo aquela decisão, o desconto não poderá ser aplicado se ficar demonstrado que a greve ocorreu por “conduta ilícita” do poder público.
Em setembro, ao falar à RBA, o secretário-adjunto de Relações do Trabalho da CUT e funcionário público federal Pedro Armengol já previa dificuldades em relação ao projeto de negociação coletiva. “Com a realidade que estamos vivendo no país, acho muito difícil sancionar esse projeto”, afirmou na ocasião. “Tenho dúvidas se prefeitos e governadores vão assistir passivamente a essa questão.” Ele lembrava que “99,9%” das greves no funcionalismo são, basicamente, para abrir negociação.
Em rede social, o senador Antonio Anastasia (PSDB-MG), autor do projeto, criticou “mais um equívoco” do governo que, segundo ele, “se enfraquece a cada dia e que demonstra, nesse caso, seu descaso e descompromisso com o servidor público”. Ele lamentou que o mesmo Executivo supostamente defensor da negociação coletiva no setor privado, via “reforma” trabalhista, agora se negue a dialogar com o funcionalismo.
O tucano pediu apoio de senadores e deputados para trabalhar, “de forma firme e vigorosa”, pela derrubada do veto.