[BRASIL DE FATO] Localizada em Betim, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, a Refinaria Gabriel Passos (Regap) é considerada a maior unidade da Petrobrás em Minas Gerais. Com 53 anos de atuação, a planta abastece todo o estado, exceto um pedaço do Triângulo Mineiro, e o Distrito Federal com diversos produtos, como gasolina, diesel, gás de cozinha, óleo combustível, coque verde de petróleo, aguarrás e querosene de aviação.
A refinaria, que tem capacidade autorizada de refino de 166 mil barris de petróleo por dia, foi colocada à venda em 2019 pelo governo federal.
As consequências da privatização da Regap ainda são incalculáveis, mas, segundo estimativas do Sindicato dos Petroleiros de Minas Gerais (Sindipetro-MG), pode atingir o emprego de 2,5 mil pessoas, número que dobra em época de manutenção do parque industrial.
Outro aspecto que pode ser alterado é a arrecadação de tributos, como o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), já que é comum empresas privadas contarem com benefícios fiscais e isenções.
“É como se houvesse apenas uma padaria numa cidade, que vendesse todo o pão que é produzido, e que fosse privatizada”, diz Anselmo Braga, diretor do Sindipetro-MG.
O pagamento dos tributos é uma forma de contribuição da refinaria para a economia mineira. Informações da Agência Petrobrás apontam que a Regap é responsável por uma movimentação de receita anual que supera R$ 8,6 bilhões em tributos para Minas Gerais, o que equivalente a 4% de toda a arrecadação do Estado.
População mineira vai pagar a conta
Os trabalhadores da Petrobrás têm denunciado que a privatização da Regap, que faz parte da venda de um pacote de 8 refinarias no país, como um atentado à soberania nacional. Os preços dos produtos, como a gasolina e o diesel, podem ficar ainda mais caros, como explica Anselmo Braga, diretor do Sindipetro-MG e da Federação Única dos Petroleiros (FUP).
“A empresa que comprar a Regap vai continuar tendo o mercado mineiro à sua disposição. A gente diz que, na verdade, as empresas não estão comprando as refinarias, mas o mercado. Isso não tem lógica. É como se houvesse apenas uma padaria numa cidade, que vendesse todo o pão que é produzido, e que fosse privatizada. Faz sentido argumentar que o preço do pão vai diminuir se há a garantia de vender tudo que é produzido?”, questiona.
“As empresas não construíram refinarias e agora querem comprar as da Petrobrás a preço de banana”, reforça Anselmo Braga, diretor do Sindipetro-MG.
Braga se refere ao principal argumento do governo federal utilizado para justificar a venda das refinarias, que seria uma forma de aumentar a concorrência, o que estimularia a diminuição do valor dos produtos finais. No entanto, ele ressalta que “não existe concorrência nesse mercado, apesar de haver a autorização desde os anos 1990 para empresas privadas atuarem tanto no refino quando na extração do petróleo”.
“Ou seja, qualquer empresa que quiser construir uma refinaria no Brasil pode. E ninguém quis construir porque refinaria é um investimento que se paga a muito longo prazo e que industriais brasileiros não têm coragem de fazer. Na exploração, a Shell e a Texaco, por exemplo, já atuam no país há anos. As empresas não construíram refinarias e agora querem comprar as da Petrobrás a preço de banana”, ressalta o sindicalista.
Refinaria de Manaus foi vendida por 30% do seu valor
Justamente por esse motivo, a economista Juliane Furno considera que, na prática, o que vai acontecer com a venda das refinarias é a substituição de um “monopólio público” por um “monopólio privado”.
“Você não vai trocar de estado da federação para abastecer seu carro porque o preço do posto que recebe gasolina da refinaria privada está mais caro. Ou seja, estamos na iminência de formar monopólios regionais”, argumenta Furno, em artigo publicado no Brasil de Fato.
Isso, segundo Anselmo, pode acontecer em Manaus, onde, em agosto deste ano, a Refinaria Isaac Sabbá (Reman), foi vendida por 30% do seu valor para Atem Distribuidora de Petróleo, conforme cálculos realizados pelo Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (Ineep). De acordo com o estudo, a refinaria é avaliada com um valor mínimo, pelo câmbio mais elevado deste ano, de US$ 279 milhões, quando o valor negociado pela estatal com o potencial comprador foi de US$ 189 milhões.
Política de preços atrelada a valores internacionais
Uma das estratégias usadas pelo governo federal para atrair possíveis compradores foi a implantação do preço de paridade de importação (PPI), uma política de preços que atrela os valores da Petrobrás às oscilações cambiais. Essa mudança aconteceu em 2016, quando a estatal estava sob comando de Pedro Parente, indicado por Michel Temer (MDB).
Esse novo modelo de cálculo, que define os preços dos combustíveis vendidos nas refinarias, é responsável pelos diversos reajustes que levaram o botijão de gás a mais de R$ 100 e a gasolina a mais de R$ 7 o litro em muitos estados. Anselmo destaca que, se não fosse o PPI, os valores atuais dos combustíveis estariam aproximadamente 60% mais baratos.
Como funciona uma refinaria
O refino é a transformação do petróleo bruto em produtos essenciais para o dia a dia da população. A produção de derivados a partir do petróleo envolve, basicamente, três processos principais: destilação, conversão e tratamentos.
A destilação é o processo de separação dos derivados, em que o petróleo é aquecido em altas temperaturas até evaporar. Esse vapor volta ao estado líquido conforme resfria em diferentes níveis dentro da torre de destilação. Em cada nível, há um recipiente que coleta um determinado subproduto do petróleo.
A conversão é o processo que transforma as partes mais pesadas e de menor valor do petróleo em moléculas menores, dando origem a derivados mais nobres, o que aumenta o aproveitamento do petróleo. E, por último, os tratamentos são processos voltados para adequar os derivados à qualidade exigida pelo mercado. Em um desses processos, por exemplo, é feita a remoção do enxofre, o que garante a qualidade do diesel.