Parente, o estripador prepara entrega dos ativos estratégicos da Petrobras

Roberto Moraes*

Não há quem não se recorde do filme Jack, o Estripador. Uma história “americana de suspense” em que um serial killer que dividia e liquidava suas vítimas em partes. Quanta coincidência!

O novo presidente da Petrobras, do governo interino e temerário, Pedro Parente, chega dos EUA, adentra à empresa e anuncia à toque de caixa, a ampliação do fatiamento da Petrobras para a venda, ou para a entrega de suas subsidiárias, num processo que o mercado a quem representa prefere denominar como “desinvestimentos através das vendas dos ativos”.

A escolha do momento é a Transpetro e a Petrobras Logística de Gás S.A.

São empresa rentabilíssimas, a despeito dos atuais baixos preços do petróleo. Em 2015, a Transpetro repassou à holding Petrobras um lucro de R$ 1,2 bilhão. Ela possui e opera a área de dutos e terminais que foi responsável por 78% da receita operacional da subsidiária no valor de R$ 6,5 bilhões.

A Petrobras Logística de Gás S.A. possui hoje cerca de 14 mil km de dutos, sendo a parte de maior valor e movimento de óleo e gás (oleodutos e gasodutos) a Malha Sudeste, onde se dá a maior parte da exploração e consumo de derivados no Brasil.

Terminal de Petróleo da Transpetro em Barueri, SP

Estes pipelines (oleodutos e gasodutos) interligam refinarias e terminais aos principais centros consumidores, além de 49 terminais de armazenamento, entre os terrestres e os aquaviários, que operam a movimentação de carga e descarga de petróleo, gás e derivados. A Transpetro atua ainda na área de serviços marítimos, a companhia administra frota de 55 navios.

Na fase atual dos ciclos do petróleo, é fundamental para as estratégias das empresas petrolíferas atuarem de forma integrada, como faz até aqui a Petrobras, com atuação do poço ao posto. No meio deste processo entre exploração/produção – circulação – consumo, a atividade de logística (circulação) é efetivamente a mais estratégica para a empresa.

De forma similar ao corpo humano, a atividade de circulação desta cadeia produtiva funciona como o sistema circulatório que leva o sangue do coração (poço) a todo o corpo. Isto ajuda a demonstra o papel e valor estratégicos, além do potencial de lucros da atividade. Com ela, se pode controlar, tarifas, a movimentação e o fluxo desta mercadoria especial que é o petróleo.

Junto com esta atividade estratégica, as partes dividas da Petrobras para serem entregues, envolvem ainda outro “ativo” importante que é o ligado ao gás natural. Ele ganhou importância seja pelo seu menor poder poluente, mas também pela tecnologia relativamente recente – mesmo que ainda bastante cara – usadas em plantas industriais para a sua liquefação (transformação em líquido).

Assim, sob a forma de LNG (ou GNL, Gás Natural Liquefeito) o seu transporte passou a ser viabilizado por navios e não apenas por gasodutos, como ocorria até então. Desta forma, ao chegar próximo ao consumo, o GNL é regaseificado, muitas vezes, em plantas existentes no próprio navio responsável pelo transporte, para ser usado em geração de energia ou outros usos após distribuição.

Como se pode ver a escolha estratégica dos dois setores para serem vendidos mostra uma coerência e uma articulação de complementação de negócios que interessa ao mercado e desintegra mortalmente, a Petrobras.

O gás natural possui um enorme potencial de produção no Brasil, a ponto do Brasil já poder dispensar o gás vindo da Bolívia, cujo contrato está prestes a se encerrar. A produção de gás natural no Pré-sal, já em curso é colossal, além do que ainda entrará em produção quando o campo de Libra estiver produzindo.

Além disso e bem melhor, o gás natural não pressiona a questão ambiental pelo seu menor poder poluente. É oportuno dizer que este foi um dos principais motivos que fez a Shell comprar a petroleira britânica BG, no ano passado por US$ 53 bilhões.

A aquisição se deu basicamente, por conta dos ativos que a BG possui nos campos no pré-sal brasileiro, além de já ser desde o ano passado a petroleira estrangeira com maior produção de petróleo equivalente no Brasil. A Shell tem como estratégia global ampliar sua atuação com gás natural.

Não por coincidência a Shell está se estruturando em Macaé, onde se diz que poderá vir a ocupar um prédio que até há poucos dias atendia à Petrobras no município.

É possível que nestes “desinvestimentos”, novo nome para a privatização e venda de empresas públicas, ou de economia mista, como a Petrobras, possa ser incluído o TUP de Imbetiba, em Macaé.

O Terminal de Uso Privado de Imbetiba atua como base portuária de apoio às explorações offshore de petróleo, em boa parte do litoral brasileiro e é parte do patrimônio da estatal e se junta a outros terminais terrestres e aquaviários que armazenam e movimentam óleo cru, gás natural e derivados de petróleo, onde estão todas reservas brasileiras.

Não é preciso ser especialista para ver a lógica que há por trás destas intenções já anunciadas no primeiro dia do Parente na Petrobras.

Não por coincidência, a americana Chevron se articula para ter uma nova base de operações portuárias na região, apensar de hoje, só operar os campos do Frade, ao lado do campo de Roncador, ao lado do campo de Roncador, na frente do porto do Açu e o campo de Papa-Terra, também na bacia de Campos, na direção de Cabo Frio.

A entrega dos ativos estratégicos ligados à etapa de circulação e logística e gás natural hoje de posse da Petrobras, sob o argumento de redução das dívidas da estatal é um crime de lesa-pátria ainda mais grave do que aquele que foi feito com a entrega pelo governo FHC com a Vale do Rio do Doce.

As dívidas da estatal, embora grandes porque cresceram com a correção cambial e os grandes projetos que vinham sendo tocados até que a fase de colapso do “ciclo petro-econômico” se iniciasse no segundo semestre de 2014, estão razoavelmente administradas até 2017.

Há bom volume de dinheiro em caixa. Por isso não há nenhum motivo para esta sanha entreguista e irresponsável de partes da maior empresa da América Latina.

Não creio que a nossa Nação assistirá este processo sem reagir. A ultraliberalização do governo interino e temerário, ultrapassou todos os limites, já não aceitáveis dos governos liberais da era FHC-1 e FHC-2.

A venda de partes da empresa na fase de baixa do ciclo do petróleo é um absurdo. Um novo ciclo petróleo, mesmo que leve ainda mais três ou quatro anos, para atingir uma nova fase de expansão, tem que ser considerada por quem, minimamente, pensa a Nação.

[Publicado originalmente no blog do autor]

* Professor e engenheiro do IFF em Campos dos Goytacazes (RJ).