Saúde debilitada no Norte Fluminense

Saúde de debilitada no Norte Fluminense

Nos últimos anos, a Petrobras vem deixando de lado seu papel social de equilibrar a busca por resultados financeiros e os interesses da sociedade – afinal, é uma empresa pública – para apenas priorizar o lucro dos acionistas. Ao reduzir seu tamanho vendendo ativos, a empresa vem, indiretamente, comprometendo os investimentos públicos dos municípios do Norte Fluminense em áreas essenciais, como a saúde, por exemplo. Se em tempos comuns o setor da saúde merece toda a atenção, no meio de uma pandemia como a de Covid-19 deveria ser mais abastecido. Mas, infelizmente, os números não mostram isso.

É fato que, entre 2010 e 2020, Campos dos Goytacazes e Macaé registraram, quase sempre, um aumento anual na aplicação de recursos na saúde. A elevação, porém, foi nominal. Ou seja, o crescimento dos gastos com saúde ficou aquém do que deveria considerando, por exemplo, a inflação.

Comparando os investimentos em Macaé nos anos de 2015 (R$ 540 milhões) e 2020 (R$ 572 milhões), o aumento foi de 32 milhões em cinco anos. Em Campos, a diferença, comparando o mesmo período, foi de R$ 138 milhões – R$ 662 milhões em 2015 e R$ 800 milhões em 2020. Utilizando o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) para calcular a inflação do período e chegar ao reajuste correto, Macaé deveria ter investido no último ano R$ 783 milhões, no mínimo, pois a crise sanitária já estava instalada. Já em Campos, o gasto deveria chegar pelo menos a R$ 906 milhões, para não haver uma perda real.

Para Ranulfo Vidigal, economista e mestre em políticas públicas, além do desinvestimento da Petrobras no Norte Fluminense e na Bacia de Campos, o quadro reflete erros que começaram no passado. “Campos tem cerca 550 mil habitantes, e passa por um processo de declínio econômico, embora tenha amealhado mais de R$ 25 bilhões de royalties nos últimos 20 anos. Hoje, são 182 mil pessoas desempregadas ou na informalidade. A cidade não soube usar o dinheiro em seu máximo potencial”, lamenta.

Segundo Vidigal, os R$ 800 milhões que Campos dos Goytacazes destinou à saúde no último ano é um “volume extraordinário”, por ser quase metade do orçamento do município. “Quando vemos a resolutividade, investiu-se em excelentes profissionais, bons hospitais, há pontos positivos. Mas há também os negativos: o aproveitamento inadequado dos recursos, gerando uma forte dependência do petróleo, que é um recurso finito. A cidade poderia ter hoje um fundo lastreado em petróleo para este momento de queda, como fez Maricá. Mas a visão de curto prazo predominou. Para piorar, veio uma crise internacional e a crise pandêmica, desestruturando tudo. Resultado: colapso nos hospitais e até uma importante unidade com o teto caindo e fechado para reformas (Hospital Geral de Guarus).”

No que diz respeito à venda de ativos da Petrobras, o economista ainda chama a atenção para a “inocência” dos prefeitos do Norte Fluminense, por acreditarem que as petroleiras que compraram esses ativos vão repor os investimentos, criar infraestrutura e abrir postos de trabalho, como a Petrobras fez no passado.

“Estamos em uma cidade universitária (Campos), mas aqui acreditam no mito do Eldorado. Em toda a região, há uma ingenuidade de se achar que as empresas estrangeiras vão melhorar a situação. Basta ver o que elas fizeram em campos de extração e produção de outros países para entender que isso não vai acontecer”, alerta.

CPI dos royalties

Em 2020, a Bacia de Campos registrou o menor volume de produção deste século. Ainda que parte dessa redução tenha de ser creditada à crise econômica gerada pela pandemia, o principal motivo para esse feito negativo é justamente a redução dos investimentos da Petrobras na região, e também a venda de ativos pela empresa. E menos produção significa menos royalties e menos recursos entrando nos cofres dos municípios do Norte Fluminense e do estado do Rio de Janeiro.

Mas, de acordo com levantamento do governo estadual, não é apenas a produção menor que afeta royalties e Participações Especiais (PE). Houve manobras das petroleiras, sobretudo da Petrobras, para reduzir o valor dessas contribuições.

No dia 19 de abril, o secretário estadual de Fazenda do Rio de Janeiro, Guilherme Mercês, anunciou que, segundo estimativas da pasta, o estado pode ter perdido nos últimos dez anos R$ 9,8 bilhões em receitas de royalties e PE. Segundo Mercês, falta clareza das petrolíferas, inclusive da Petrobras, na divulgação dos valores.

O anúncio foi feito na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj), instaurada para investigar irregularidades nos descontos das PEs.