Nascente 1162

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EDITORIAL

Responsabilidade local

A Petrobrás é o resultado de um sonho nacional. Fruto de uma conjuntura política, nos anos 40 e 50, que privilegiou, ainda que de modo conservador, uma lógica de desenvolvimento e de autonomia para o Brasil. Nos anos 70, ela já era uma potência econômica vital para o país, e qualquer cidade, qualquer região, queria ter instalações da empresa. Ela também se tornou, assim, uma questão local. Aonde estivesse, provocava impactos gigantescos, econômicos, ambientais, sociais — nem sempre positivos mas, em geral, geradores de milhares de empregos diretos e indiretos, com consequente incremento das receitas municipais.

As elites políticas e econômicas do Norte Fluminense mantiveram relações dúbias com a empresa: ora estendendo tapete vermelho, ora temendo a perda de protagonismo de outros setores econômicos. É clássica a versão de que os usineiros de Campos dos Goytacazes opuseram-se à instalação da Petrobrás no município, pressionando o governo federal da época — com o qual mantinham relações estreitas e do qual arrancaram diversas benesses — pela opção que acabaria sendo feita por Macaé.

Nos anos 90, com o crescimento das receitas em royalties e sua centralidade nos caixas municipais, superando a receita própria em quase todos os recebedores, ficou mais difícil negar a importância da companhia. Mas o vínculo de setores da elite local com o pensamento neoliberal fez com que até o pragmatismo econômico se perdesse (algo semelhante ao que setores bolsonaristas fazem hoje com a China, quando o preconceito ideológico gera prejuízos até para segmentos que elegeram o presidente, como o agronegócio).

O caso de Macaé é crítico: mesmo tendo centrado toda a sua economia e se desenvolvido em torno das instalações da Petrobrás no município, governantes recentes não se intimidaram em dar apoio e fazer palanque para as teses privatistas da companhia, servindo sabe-se lá a quais interesses — certamente não os dos trabalhadores e das trabalhadoras do município. O resultado todos sabemos: a privatização avançou, continua a avançar, e os empregos, a produção e as receitas só fazem cair.

As urnas e a história hão de cobrar a responsabilidade das vozes locais que não se aliaram à defesa da Petrobrás enquanto empresa pública, integrada e promotora de desenvolvimento com justiça social.

 

ESPAÇO ABERTO

A fome é um projeto político*

Clarissa Nunes**

A fome é um projeto político. Essa é a conclusão de Josué de Castro, em 1946, ao escrever sua obra Geografia da Fome. Prova disso é que, durante o período dos governos de Lula da Silva e Dilma Rousseff, o Brasil deixou de figurar no Mapa Mundial da Fome. Isso se deu não por felizes coincidências, mas em razão das escolhas políticos do Estado brasileiro que, à época, colocou a questão da fome como algo central em suas ações.

No Brasil, em 2010, foi aprovada a Emenda Constitucional nº 64 que incluiu a alimentação como direito social o qual deve ser garantido pelo Estado. Essa inclusão constitucional aconteceu indo no mesmo sentido que os pactos e declarações internacionais, os quais passaram a proteger, no período pós-segunda guerra mundial, a alimentação como direito fundamental.

O retorno do Brasil ao Mapa Mundial da Fome, conforme noticiou o IBGE nas últimas semanas, não é um mero resultado da incompetência e ingerência do governo Bolsonaro. Ao contrário, apoiando-se nas premissas neoliberais e neoconservadoras, o governo atual mantém uma agenda de restrição de direitos e garantias trabalhistas, de redução de trabalhos formais e de omissão/cumplicidade com a invasão de terras indígenas e quilombolas. Essas medidas impedem o acesso à alimentação, mas também bloqueiam e criminalizam a própria agricultura familiar, responsável por plantar alimentos orgânicos e saudáveis que chegam na mesa de milhões de brasileiros.

A defesa do direito à alimentação passa pela defesa de uma reforma agrária popular, em que se distribua a terra e se garanta seu uso de forma sustentável. Passa, também, pela defesa da Constituição Federal e dos direitos individuais e sociais ali protegidos. O governo Bolsonaro desenha uma trajetória de morte para o povo brasileiro. De morte por violência policial, por violência doméstica e familiar, por genocídio da população indígena e quilombola do Brasil. Deixar o povo brasileiro com fome é, também, deixá-lo mais fraco com o fim de fazê-lo aceitar o cenário de miséria e de pobreza.

*Trecho de artigo publicado originalmente no jornal Brasil de Fato em is.gd/eanascente1162. ** Advogada integrante da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia.

 

GERAL

Petrobrás encolhe na região

Levantamento feito pela subseção Dieese FUP-NF, a pedido da Imprensa do NF, mostra que a Petrobrás está acelerando o processo de esvaziamento da Bacia de Campos. A redução de investimentos da companhia, uma política nacional, tem mostrado efeitos particularmente graves para a região. Estão em queda o número de plataformas em operação para a empresa e, nas que restaram, a produção tem sido progressivamente reduzida.

De acordo com dados de julho de 2020, há, na Bacia de Campos (na parte pertencente ao litoral do Rio de Janeiro), 21 plataformas operando para Petrobrás. Juntas, elas produzem uma média diária de 659,4 mil boe. Em 2010, estas mesmas plataformas produziam 1,2 milhões de boe/dia, o que representa uma queda de 45%.

“A Bacia de Campos (Rio de Janeiro e Espirito Santo) vem perdendo participação na produção nacional de petróleo e gás natural. Em 2010 produzia 1,9 milhões de boe/dia, representando 79% da produção nacional e em 2020 (janeiro a julho) produz 1 milhão de boe/dia, representando 33% da nacional”, afirma o Dieese.

Virada rumo ao encolhimento

A Petrobrás, que já teve o predomínio absoluto das plataformas da região, hoje é minoria em operação. De 2010 a maio de 2020, a companhia deixou de utilizar 38 plataformas que operavam na Bacia de Campos. Estas foram paralisadas, vendidas ou hibernadas pela empresa — e atualmente nada produzem, embora tenham produzido cerca de 440 mil boe/dia em 2010.

“A redução dos investimentos da Petrobrás e a venda de campos de petróleo para outras petroleiras está impactando na parada de produção de várias plataformas e, ainda traz uma série de efeitos negativos para a região onde operam. A Bacia de Campos perde importantes unidades produtoras e locais de trabalho de vários trabalhadores”, conclui o Dieese.

O departamento de pesquisa também adverte que “as causas da crise que assola a região do Norte Fluminense, com queda da produção e de empregos de toda a cadeia de óleo e gás, não devem ser vistas de forma simplista, como resultado “natural” dos campos maduros e da queda dos preços do petróleo. Como pôde ser constatado através dos dados aqui reunidos, esse processo sofreu grande influência de uma mudança política no setor, mudança essa cristalizada na decisão de se abdicar da exploração da Bacia de Campos e de um projeto do setor petróleo em conjunto com o desenvolvimento nacional e regional.”

56 mil empregos a menos

A FUP levantou, recentemente, o impacto desta redução drástica da atuação da Petrobrás na região sobre os empregos: “A política de redução de investimentos da Petrobras na Bacia de Campos já ceifou 56 mil postos de trabalho em todos os setores da economia das cidades de Campos e de Macaé, segundo o IBGE. De 2014 a 2018, foram perdidos, entre empregos formais e informais, 55.942 postos de trabalho em Macaé e em Campos. Isso corresponde a 20,7% do total de empregos nos dois municípios em apenas quatro anos. De 2014 para 2018, o contingente de trabalhadores passou de 270.377 para 214.435”.

“Na Bacia de Campos, somente a Petrobrás cortou 25% dos empregos de 2014 a junho de 2020. A empresa cortou 4.282 postos de trabalho, a maioria através de Plano de Demissão Voluntária. Para cada quatro postos de trabalho da companhia na Bacia de Campos, um foi fechado”, complementou a Federação.

 

Prefeitáveis começam a assinar compromisso

O Sindipetro-NF intensificou nesta semana a campanha #PetrobrasFica, com o lançamento de um abaixo-assinado (is.gd/assinapetrobrasfica) para a população e do reforço ao convite aos candidatos e candidatas às prefeituras de Campos dos Goytacazes e de Macaé assinem a carta-compromisso lançada pela entidade em defesa da Petrobrás.

Até às 15h de ontem, haviam assinado a carta-compromisso o candidato Beethoven (PSDB) e as candidatas Odisseia (PT) e Professora Natália (PSOL), concorrentes à Prefeitura de Campos dos Goytacazes; e os candidatos Igor (PT) e Maxwell Vaz (Solidariedade), concorrentes à Prefeitura de Macaé. Todos os candidatos e candidatas estão sendo convidados a assinar a carta até o próximo dia 30.

Live hoje com reitor do IFF

A campanha também tem promovido inserções nas redes sociais do sindicato e realizado transmissões ao vivo com lideranças dos municípios — às segundas, quartas e sextas, sempre às 18h. Hoje, a live é com o reitor do Instituto Federal Fluminense (IFF), Jefferson Manhães, sobre o papel da Petrobrás na geração de empregos para os egressos dos ensinos médio e superior.

O objetivo é mostrar os impactos da redução da Petrobrás — rumo à privatização — em diferentes setores da sociedade. Além da economia local, a diminuição da importância da Petrobrás na região impacta áreas como saúde, educação e cultura, na medida que reduz as receitas municipais originadas na produção do petróleo para fazer frentes a necessidades da população.

Como tem destacado o sindicato, a Petrobrás tem sido vital no desenvolvimento de Campos e de Macaé desde os anos 70, e o sindicato avalia que é papel das Prefeituras da região, assim como de toda a sociedade local, a defesa da companhia enquanto empresa forte, integrada, pública e com claro papel social.

Candidatos e candidatas de todos os partidos estão sendo convidados a assinarem a carta-compromisso, que conclama os concorrentes a “atuar junto aos municípios produtores e limítrofes, assim como na relação com a Câmara Municipal, a Assembleia Legislativa e as Casas do Congresso Nacional, no sentido de pressionar pela recondução da Petrobrás à condição de empresa pública com forte compromisso local, tanto na presença determinante nas regiões aonde atua quanto no papel indutor da economia do país”.

 

Ônibus flagrado sem higienização

O Sindipetro-NF realizou, na manhã de ontem, uma fiscalização surpresa em ônibus que transportam petroleiros e petroleiras entre hotéis em Campos dos Goytacazes e o Heliporto do Farol de São Thomé. Logo nas primeiras horas do dia, diretores estiveram em um dos hotéis do município para verificar o ônibus que seria utilizado pelos trabalhadores.

De acordo com o coordenador do Departamento de Saúde do Sindipetro-NF, Alexandre Vieira, a situação do primeiro ônibus verificado comprovou denúncias que vinham sendo feitas pela categoria: foi constatado que não houve higienização do veículo. A entidade também questiona a lotação, que não tem permitido o distanciamento entre os ocupantes — embora a Petrobrás afirme que esta lotação é permitida em nota técnica interna.

Depois da constatação de ausência de higienização, o sindicato acionou a empresa de ônibus, Autoviação 1001, e a própria Petrobrás. A 1001 enviou outro ônibus para os trabalhadores, desta vez com modelo mais novo e higienizado. A gerência da companhia afirmou que o contrato prevê a higienização e prometeu fiscalizar as condições do transporte.

O sindicato também relatou ao Ministério Público do Trabalho e à Anvisa a exposição dos petroleiros e petroleiras ao risco de contaminação pelo novo coronavírus no transporte oferecido pela Petrobrás.

Problemas também nos hotéis

Como registrou em seu site nesta semana, a entidade tem denunciado uma série de dificuldades relacionadas ao cuidado com sua saúde por parte das empresas onde trabalham. Diversos problemas estão acontecendo ao mesmo tempo: em alguns hotéis onde os trabalhadores ficam hospedados há aglomeração para o check in, sem distanciamento ou outro tipo de orientação.

“A aglomeração poderia ser sanada com o encaminhamento de parte do pessoal para o almoço, mas os hotéis não fazem isso. As pessoas acabam sendo obrigadas a ficar aglomeradas no hall e com fome. Já houve casos de pessoas ficarem do horário de check-in até às 16h sem se alimentar”, denunciou o NF.

Esse despreparo da rede hoteleira para cumprimento dos protocolos de Covid também podem ser notados na manipulação das refeições aos hóspedes. O sindicato recebeu fotos dos alimentos sendo transportados pelas calçadas, alguns caindo no chão e sendo recolocados no carrinho e trabalhadores dos hotéis sem máscara. Todas essas situações colocam a saúde e a própria vida de todos em risco.

Trabalhadores de Macaé também relataram problemas em relação à qualidade a alimentação que é servida. Contam que há mais de 30 dias o pessoal está passando mal com a comida que é servida e que a Petrobrás já tem ciência dos fatos, entretanto até o momento não tomou atitudes junto ao hotel.

 

CURTAS

Truculência

O Sindipetro-NF publicou vídeo nas redes sociais, nesta semana, que mostra a truculência da Petrobrás nas suas relações sindicais. Diretores da entidade foram impedidos, na quarta, 21, para participar de inspeção da Cipa em Imboassica. “Trabalhadores denunciaram uma série de irregularidades no protocolo de controle da Covid-19 e o sindicato está sendo impedido de fiscalizar. Para a diretoria do NF isso só demonstra, ainda mais, que a Petrobrás tem algo a esconder”, protestou a entidade. Veja em is.gd/nfbarrado.

Documentário

Disponível o epísódio 3 da série documental Lava Jato entre Quatro Paredes, produzida pelo Canal Normose em parceria com o NF. “Depois de entender o esquema das delações, vamos entender as entranhas dos casos Rodrigo Tacla Duran, Januário Paludo e Dário Messer e o que tudo isso tem a ver com os vazamentos da Vaza Jato e do Intercept Brasil”, convidam os produtores. Veja em is.gd/lavajato_quatroparedes_ep03.

Vaga no Dieese-NF

A subseção do Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos) no Sindipetro-NF abriu vaga para contratação de economista técnico nível II. Para concorrer à vaga é necessário residir ou ter disponibilidade para residir em cidade da Região Norte Fluminense, possuir formação há pelo menos dois anos na área, entre outros requisitos descritos no edital disponível em is.gd/editaldieesenf.

Bravo, Iderley

A vaga no Dieese-NF foi aberta com a saída do economista Iderley Colombini, gente da melhor qualidade que, para orgulho dos seus colegas diretores e funcionários da entidade, foi aprovado em concursos para professor da UERJ e da UFRJ — fazendo opção pela segunda, onde tomou posse como professor de Economia Política e Economia Brasileira no Instituto de Economia. O NF deseja sucesso ao companheiro na nova carreira.

 

NORMANDO

Fascismo mata

Normando Rodrigues*

Alexandre Santiago, operário, foi morto pela Polícia Rodoviária Federal a 19 de outubro, na rodovia BR 116, região metropolitana de Fortaleza.

A mesma região dos 230 PMs afastados por motim armado contra o governo do estado. A mesma Fortaleza onde o ex-PM e deputado federal “Capitão Wagner” lidera as pesquisas para prefeito, apoiado pelo presidente fascista.

Em que o fascismo se relaciona com a morte de Alexandre? O que você tem a ver com mais uma morte?

A bestialidade

A brutalidade policial é tão antiga quanto a própria polícia. Mas existem dois agravantes maiores. O primeiro é a banalização da violência, vinculada às nossas megalópoles ingovernáveis, injustas e desiguais.

E, nos últimos anos, à violência banalizada se somou a dominação de uma determinada ideologia, que prega abertamente a violência, inclusive contra adversários políticos, negros, mulheres, homossexuais, favelados, e outras minorias. Trata-se do fascismo.

O fascismo tem na ação direta, e não na reflexão, e na violência, e não no diálogo, o seu modo de agir. Violência e fascismo são inseparáveis.

A besta

O fascismo não se resume a Bolsonaro, que foi eleito porque 38% da população aderiu previamente ao fascismo, ainda que sem o saber. Bolsonaro, porém, encarna exemplarmente o fascismo.

Se a violência estatal era antes condenada pelos governantes, ainda que muitas vezes apenas em discursos, ela é agora estimulada pelo presidente e por seu séquito de beócios. Que o digam os familiares do músico Evaldo Rosa, e do catador Luciano Macedo, para os quais o “1° Magistrado” do país declarou que “o Exército não matou ninguém”. Só metralhou.

A PRF apenas seguiu o exemplo no caso de Alexandre, refém de assaltantes dentro do carro metralhado. No mesmo dia de sua morte os jornais noticiavam o “efeito Bolsonaro”: as polícias brasileiras nunca mataram tanto quanto no 1° semestre de 2020.

Morrerão inocentes? Paciência

Poderia ser você? Seu filho? Seu pai? Quem escolhe quem vive e quem morre?

Quem escolhe é qualquer um dos militares aos quais Bolsonaro entregou a agência de proteção de dados, coisa que só acontece nas “democráticas” Rússia e China. Quem escolhe é o general Heleno, que coloca espiões na ONU atrás de “maus brasileiros”.

Os aliados da família Bolsonaro também escolhem quem vive e quem morre. Sobretudo nos 58,6% do território do Rio que são “administrados” pela milícia.

Estamos todos dentro do carro metralhado. Reféns como Alexandre.

* Assessor jurídico do Sindipetro-NF e da FUP.
[email protected]