Químicos e petroleiros contaminados pela Covid-19 relatam seus dias de agonia

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Imprensa CUT – Resultados preliminares de um estudo de caso promovido pela Universidade de Brasília (UnB) com 10 trabalhadores químicos e petroleiros contaminados pela Covid-19 revelam quais os principais sintomas, fontes de contaminação e o sofrimento físico e psicológico ao qual passaram. São vidas que atuam na produção essencial de matérias primas de diversas atividades de apoio e combate ao novo coronavírus e que não puderam parar de trabalhar nem fazer home office durante a quarentena.

Dos 10 entrevistados com idades entre 36 e 55 anos,  6 deles relataram contágio laboral; 2 têm dúvidas entre contágio laboral e contágio no comércio local residencial; 1 relatou contágio por familiar e outro contágio no supermercado.

Três deles relataram que houve demora das empresas em afastá-los dos locais de trabalho, o que provocou novos contágios. Assim que houve o afastamento dos contaminados, os demais colegas que trabalhavam juntos também foram preventivamente afastados.

Os sintomas variaram de contaminado para contaminado,  8 relataram perda do olfato; 7 casos  dor no corpo generalizada; 5 dor nas costas e pulmões; 5 dor de cabeça constante e ou forte, 4 tiveram febre,  metade deles teve pulmões comprometidos entre 25 a 50%, 3 pessoas relataram cansaço extremo,  3 tiveram falta de ar e 3 sentiram calafrios. No total de 10 casos foram relatados 21 sintomas.

Na sequência de problemas psicológicos registrados, 4 relataram ansiedade, angústia e sentimento de culpa por contaminar família, colegas e vizinhos. Um petroleiro que teve de ser entubado contou: “minha maior preocupação psíquica era deixar a família exposta.”. Duas pessoas relataram forte tristeza, além de outros sintomas psíquicos.

Um químico relata que teve pré-pânico ao ligar pra família antes de ser entubado e sedado.  Outro trabalhador químico internado comentou: “Foi a primeira vez da minha vida que passei por alguns momentos que eu achei que não ia voltar mais, esta doença é coisa séria, não é uma gripezinha”.

Um dos químicos, que esteve internado em UTI, assim resumiu o sofrimento da doença: “você está sendo massacrado, pelo corpo e pela doença do corpo”. “E a cabeça, está sendo massacrada pelo lado e pelo aspecto social, pelo aspecto psicológico”.

A doença para os internados e entubados impôs um isolamento social e familiar cruel e desumano, segundo o relato do mesmo trabalhador: “Não poder dar um abraço, um beijo nos filhos, na esposa e pais, é muito difícil!”  Um dos petroleiros que também esteve na UTI, relatou que o maior sofrimento físico foi a falta de ar e a sensação de que ia morrer.

Solidariedade da família e dos colegas de trabalho durante a quarentena

Segundo os entrevistados, houve o apoio dominante dado pelas famílias, registro maior entre os casados. Alguns filhos também tiveram os sintomas da doença durante a quarentena. Quatro pessoas relatam também a solidariedade dos colegas de trabalho durante a contaminação: “ Eles ligavam todo dia para saber ‘como você tá’…. sempre  davam bastante atenção’”.

Felizmente todos esses entrevistados estão em recuperação afastados ou retornaram para suas atividades depois que seus exames laboratoriais apresentaram resultados negativos. Três trabalhadores ainda apresentam sequelas. Um dos que está passando por avaliação cardiopulmonar relata: “ no pós-Covid19 ainda tenho falta de ar, dor nas pernas e dor nas costas.”

Principais causas da contaminação: ambiente de trabalho

A pesquisa detectou ainda que o contágio predominante foi comunitário laboral, ou seja, teve origem nos locais de trabalho. Principal motivo:  falta de medidas iniciais, como o não uso de máscaras faciais, aglomeração em locais de circulação  (refeitório, vestiário, banheiro, salas de controle, oficinas e áreas de serviço). Um dos contaminados relatou que “várias pessoas na empresa pegaram de uma vez, o que revela que houve contágio no ambiente laboral”.

A maioria relatou que medidas protetivas e preventivas aumentaram no ambiente de trabalho após os registros de contaminação pela Covid-19, incluindo distanciamento social e medidas de proteção individual, como o permanente uso da máscara cirúrgica ou de pano, máscaras acrílicas faciais, precaução quanto aglomerações em espaços comuns.

Falta de testes em massa

Em uma análise preliminar, quanto às medidas protetivas e preventivas, a maioria dos entrevistados relatou a necessidade de realização de exames massivos para a Covid-19 de forma permanente. Houve retorno de quarentena sem que trabalhadores de turno fossem testados, o que contribuiu para o agravamento do contágio, além das saídas e entradas das folgas grandes de 14 dias que viraram “quarentenas”.

A falta de pessoal foi alertada por um dos petroleiros em turno de 12 horas: “De que adianta eu trabalhar  12 horas, pra circular menos gente, e ficar mais tempo por  lá, se no meio da sala não tem como me virar sozinho , ah , porque está faltando gente!”

O estudo qualitativo da UnB está sendo realizado pelo pesquisador e assessor de Saúde da Fetquim, Remígio Todeschini,  sob a supervisão do professor Wanderley Codo,  em parceria com os sindicatos filiados à Fetquim/CUT, CNQ-CUT, e o apoio da FUP e do Sindicato dos Petroleiros do Litoral Paulista.

Para Airton Cano, coordenador político da Fetquim-CUT, o estudo reforça “que a importância de estarmos atentos em nossa mobilização no local de trabalho e a negociação permanente em defesa da saúde dos trabalhadores”.

Andrés Alves, secretário de Saúde da Fetquim, lembra da importância de lutar pela realização de testes em massa para a Covid-19, a fim de evitar contágios constantes das equipes e colegas de trabalho.

As entidades representativas de trabalhadores deverão exigir a CAT, para a maioria dos casos de contaminados de contágio laboral aqui abordados, em virtude da garantia dos direitos trabalhistas, previdenciários e dos contratos coletivos em vigor.

O detalhamento e análises de conteúdo deste estudo terão continuidade nos próximos 90 dias.